Correio de Carajás

Café, almoço e janta

Depois que terminaram o ensino médio em Marabá, minha irmã mais velha despediu as duas filhas rumo a São Paulo, onde sua irmã caçula morava. Foram fazer faculdade e a mais velha escolheu a enfermagem e a mais nova estudou odontologia.

Nenhuma voltou para residir em Marabá. A mais velha, Roberta, focou no trabalho, construiu uma casa e fez algumas quitinetes para alugar num bairro mais afastado. A mais nova, Cleide, também entrou no mercado de trabalho, mas arranjou um namorado (também dentista como ela), com quem tiveram uma filha há três anos.

Os dois passaram a viver juntos, herdaram uma casa dos pais dele em um bairro de classe média na zona norte, e lá transformaram um espaço privilegiado em consultório dentário.

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Clauber, o marido, é da terceira geração de japoneses no Brasil, mas não sabe quase nada da língua de seus bisavós. Eu o conheci durante uma viagem a São Paulo, onde fui visitar minha irmã no final de ano, quando o verão de lá tem um sol mais causticante do que o daqui.

Cláuber mostrou-se uma pessoa dócil, que ama churrasco, hambúrguer e o aconchego do lar. Foram algumas horas conversando e já percebi que o rapaz era boa praça, tranquilo e parecia uma boa companhia para minha sobrinha, Cleide.

O rapaz descobriu Marabá em 2018 durante uma viagem de férias com a esposa – ainda não tinham a filha – e encantou-se com três coisas: o volume de água do Rio Tocantins, o preço (barato?) da carne e o trânsito movimentado de uma cidade no interior da Amazônia, com uma frota de veículos superior a muitas cidades de São Paulo.

Sempre que vem a Marabá – isso acontece duas vezes ao ano – ele fica hospedado na casa dos sogros. Minha irmã é casada com um homem muito conhecido no ramo automobilístico de Marabá.

Precisei de dois anos de convivência para descobrir um fato incomum, para não dizer estranho de Cláuber. Ele nunca ficou aqui menos de 20 dias e em todas as ocasiões, nunca almoçou na casa de minha irmã. E isso inclui todas as refeições: café e jantar.

Desenvolveu o hábito de comer em restaurante, tomar café em lanchonetes e jantar espetinho dos mais variados sabores. Minha irmã me fez essa revelação num tom natural, e disse que ela não se incomodava com isso, porque o genro não fazia isso só aqui.

Em sua própria casa, em São Paulo, ele trabalhava, saía meio-dia para almoçar em um restaurante, e depois retornava para ficar com a família. Em alguns, a esposa e filha saem para comer com ele, mas, via de regra, ele é um solitário nos restaurantes.

Neste dezembro, quando Cláuber esteve em Marabá por 25 dias, criei coragem e conversei com ele sobre o assunto, apenas para entender a dinâmica de suas refeições fora de casa e quando essa mania (ou gosto) começou.

Ele me contou que ainda morava com os pais quando passou a fazer suas refeições fora de casa. Os pratos de seus genitores tinham muito da culinária japonesa e ele não gostava nenhum pouco dos temperos e muito menos da comida crua.

Sushi nunca fez parte de seu cardápio a partir dos 13 anos, assim como a tempura, sashimi, missoshiru, yakitori e nem mesmo o creme de ovos com nome requintado: chawanmushi.

Como os pais ganhavam relativamente bem (ele era gerente de banco e a mãe funcionária da Receita Federal do Brasil), Cláuber se permitiu fazer refeições fora de casa todos os dias, de lá para cá.

Quando se casou com minha sobrinha, ainda tentou comer o tempero da moça, mas desistiu quando percebeu que a mais gostosa era a comida que ele não tinha em casa.

A única chance de o rapaz beliscar alguma coisa em casa, é quando ele mesmo prepara o churrasco, mas para isso precisa passar por um rigoroso processo de preparação e maturação da picanha ou seja lá qual outra parte do boi ele precisar levar ao carvão.

O hábito de Cláuber lhe rende uma fatura pesada no final do mês. Gasta cerca de R$ 130 por dia com café, almoço e janta e no final do mês a conta beira os R$ 4.000,00.

O dinheiro não é problema para eles, mas o resultado desse costume deixa todo mundo que o conhece intrigado.

 

Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.