A minha vida profissional pode ser definida em antes e depois do Jornal CORREIO. Acho que fui o jornalista que mais escreveu nas páginas deste periódico depois de seu fundador, Mascarenhas Carvalho da Luz. Atuei na Redação por cerca de 22 anos, entre idas e vindas (e ainda posso voltar um dia, a julgar pelas experiências anteriores).
Quando adolescente, eu gostava de ler revistas de notícias e fazia notícias jocosas para ler em eventos sociais e em retiros espirituais da Igreja. Quando cresci, ingressei no curso de Letras da UFPA e, durante uma greve de professores na universidade, consegui um estágio sem remuneração para ajudar em “qualquer” coisa na Redação do Jornal. Tive, para isso, a ajuda do redator chefe da época, Waldir Silva, que era meu colega de faculdade.
Minha primeira experiência foi escrever uma nota sobre uma formação para contabilistas que estava sendo promovida pelo Conselho Regional de Contabilidade. Ela tinha menos de 2.000 caracteres e gastei uma eternidade de tempo para deixá-la “redonda”. Acho que foi uma manhã inteira entre rabiscos em uma folha de pauta (sim, porque em 1996 a Redação ainda não tinha computador para todos os redatores) amarela.
Leia mais:Depois, outros assuntos foram aparecendo e ainda acompanhei – embasbacado e sem saber qual seria meu papel naquilo tudo – ao massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido em 17 de abril daquele ano. Me deram a missão de degravar entrevistas com diversos atores naquele episódio. Foi o primeiro impacto diante de um episódio impactante.
As aulas voltaram na faculdade, eu deixei de ir à Redação, mas Mascarenhas Carvalho fez questão de pagar um salário mínimo pelo mês que passei lá e, depois de uns dias, mandou um recado que me parecia imperativo: “Diga a ele que volte, porque tem vocação pra escrever e estou precisando de gente aqui”.
Organizei a agenda e passei a trabalhar no Jornal apenas durante a noite, incluindo as madrugadas de fechamento. Naquele início, não sabia que faria tantas reportagens de fôlego, que ganharia dinheiro extra com matérias impactantes que se tornariam manchetes do Jornal e nem que duraria tanto tempo nessa profissão.
Mas o texto de hoje não é para falar dos textos, mas das pessoas com as quais convivi na Redação, do clima de afetos que sempre houve entre todos, mesmo antes de eu trabalhar lá. A Redação não era tão grande no antigo prédio, na Folha 32, e todos conheciam a todos e ninguém trabalhava no silêncio total (a não ser o chefe da diagramação, Marco Antônio Nunes Leite).
Havia amizade, compartilhamento de pautas, tempo para ir à lanchonete da rodoviária tomar um lanche e agendar um futebol uma partida de futebol com colegas de outras áreas. Sim, a gente tinha um time com jogadores de talento.
Há figuras inesquecíveis. Algumas tinham papeis protagonistas e outras atuavam nos bastidores, mas compunham o mapa afetivo da Redação. Serei injusto, mas citarei alguns nomes que vêm à memória agora. Magno Nunes era o diagramador que todos queriam ter. Além de montar as páginas no computador, ajudava – e muito – na revisão dos textos, sempre encontrando um errinho que cismava em continuar, mesmo depois de a matéria ter passado pelas mãos do revisor e do próprio Mascarenhas.
Lucineide Farias, a revisora que mais parecia membro da família Carvalho, tinha uma voz aguda inconfundível e quando um repórter novato errava a grafia do nome de uma autoridade da cidade, ela avisava e escrevia corretamente. De tanto pelejar na Redação, sabia o nome completo de uma legião de pessoas.
Vez por outra, Mascarenhas trazia jornalistas de outras regiões para trabalhar no CORREIO, mas sempre fez questão de apostar na prata da casa, naqueles que tinham talento para escrever e possuíam raízes na cidade. Em 36 anos de existência deste Jornal, contabilizo, contando de cabeça e também folheando os arquivos, mais de 100 pessoas que já trabalharam na Redação.
Desde que comecei a pisar lá e até hoje, posso garantir que as notícias sempre saíram de um lugar onde as pessoas viviam e ainda vivem um clima de amizade. O próprio Mascarenhas, ex-diretor-presidente, tratava de infundir essa confraria entre nós. Ao final de cada edição, mesmo depois de meia noite, costumava levar quem ainda restava para uma lanchonete. Pagava lanche e estimulava as brincadeiras e formava uma irmandade.
Aos 36, a gente deseja que a Redação continue um celeiro de notícias e amizades e que o jornal e seus leitores mantenham essa conexão sem-fim todas as terças, quintas e sábados.
PS: Um abraço fraterno a Evangelista Rocha. O repórter-fotográfico com mais de 25 anos de trabalho ininterrupto e que é sempre paciente com os novatos. (Ulisses Pompeu)
* O autor é ex-redator do Correio e colaborador ocasional para este Jornal