Alívio e alegria. Foram os sentimentos mais destacados no dia 25 de março no final feliz de uma história que estava mobilizando todo o sudeste do Pará. No dia 22, Parauapebas tomou conhecimento do pesadelo que vivia Rita de Cássia Mendes: seu marido, João Paulo da Silva, e seus dois filhos, um menino de 10 anos e uma menina de 13 anos, haviam desaparecido na mata fechada, nas imediações do bairro Palmares. Após quatro dias de buscas, incertezas e esperança, os desaparecidos foram encontrados, debilitados e levemente feridos, mas felizmente salvos.
O homem de 34 anos, padrasto das crianças, entrou na selva para colher castanhas por volta do meio dia de domingo (22), prática comum entre os moradores do bairro. Porém, João Paulo nunca havia passado por aquela localidade, e por volta das 15h se deu conta que havia se perdido.
“Eu subi na trilha, passei pela cachoeira e olhei dois pés sem castanha, daí por volta do meio dia decidi voltar. Passei por dois córregos e nessa hora acho que me confundi; subi mais um morro, fui subindo… quando percebi que estava perdido era umas duas ou três horas [da tarde]”. Assim começava a saga que perduraria quatro dias.
Leia mais:João Paulo disse que na primeira noite estava com muito medo e apenas cochilou, pois nunca tinha ficado tanto tempo em mata fechada e não sabia muito bem o que fazer. Ele conta que, para dormir, foram ao ponto mais alto do morro e tentaram dormir numa estrutura feita com galhos com cerca de três metros de altura (João conta que já tinha visto caçadores fazerem esse tipo de estrutura na selva). Na madrugada, João e as crianças não conseguiam dormir, e então desceram estenderam palha no chão e deitaram sobre ela.
Na segunda-feira (22), houve um local em que o celular de João vibrou: foi o momento em que conseguiu mandar uma foto sua e das crianças, que circulou por redes sociais durante esta semana. “Nessa hora, tentei ligar para minha esposa e consegui falar com ela e mandei uma foto. Achei que estava perto de casa por causa [do sinal] da internet e tentei mandar a localização, mas o celular descarregou. Aí que deu uma desesperada. ”
Ao ponto em que voluntários já realizavam a busca pelos desaparecidos, Rita contatou o Corpo de Bombeiros, que enviou uma equipe para fazer uma triagem do caso e começar a traçar o plano para resgatar João Paulo e as crianças. Na manhã da quarta-feira (24), um grupo formado por bombeiros militares do 23º GBM de Parauapebas e guardas florestais da Defesa Civil municipal se juntou a mateiros, caçadores, bombeiros voluntários e outros cidadãos que se solidarizaram com o drama que vivia a família de Rita e João Paulo.
Com o passar dos dias, talvez o maior desafio de João Paulo foi conciliar seu medo com a missão de cuidar de seus enteados, tentando passar a mensagem de que tudo iria ficar bem mesmo em meio a tanta incerteza. Ele relata que, no primeiro dia, as crianças choravam muito ao perceberem que estavam perdidas, enquanto ele as acalmava, dizendo que não estavam perdidos e que em breve chegariam em casa – discurso que manteve mesmo quando já anoitecia na mata fechada.
“Teve uma hora que eu pensei ‘não vão nos encontrar’, mas guardava para mim mesmo, porque se eu falasse para eles ia ser pior, iam ficar chorando. Para eles sempre falava ‘vamos sair, é já que a gente sai”. João Paulo também conta que quando a fome se tornou um problema, usou o facão que carregava, quase cego, para cortar palmeiras e comer o palmito delas, além de se alimentarem de castanhas, cupuaçu e coco babaçu que encontraram no caminho.
Na manhã da quinta-feira (25), um grupo de 44 militares da Infantaria de Selva se juntou ao enorme contingente que estava engajado nas buscas, trazendo muita esperança à Rita e os familiares. Mal sabiam eles que aquele era o último dia de medo: no período da tarde, José Ribamar Chaves, proprietário da Fazenda São Pedro e voluntário nas buscas, encontrou João Paulo e as crianças numa estrada próxima à sua terra, em direção ao Projeto Serra Leste – aproximadamente 30 quilômetros longe de onde haviam desaparecido.
“Ficamos um tempo parados, esperando alguém chegar, mas voltamos a andar e encontramos a trilha do Serra Leste; fomos andando até chegar na estrada”. Ao avistar José Ribamar, patrão do irmão de João Paulo, sua emoção foi grande. “Foi muito alívio quando avistei a primeira pessoa, fiquei muito alegre”, ele conta, afirmando que não tinha noção de que havia tanta gente os procurando. Rapidamente, a notícia se espalhou de que os desaparecidos foram encontrados com vida e o clima foi de festa entre os que participavam da busca.
Em tom de gratidão e visivelmente emocionada, Rita de Cássia diz não conseguir descrever ou explicar a sensação de ver seu marido e filhos resgatados: “É uma coisa única, só quem sente, sabe”, disse à reportagem da TV Correio. Rita disse que a cada dia que se passava se sentia torturada e que na mata “eles podem passar por muita coisa – tudo é possível, não tem como se desesperar”. Ela finaliza afirmando que “agora é só alegria” e agradece aos militares, guardas e voluntários que realizaram as buscas.
O esforço de uma família para se reunir novamente tocou o coração de dezenas de pessoas, que fizeram da luta delas sua luta, e ajudaram durante mais de 90 horas de busca, culminando no sucesso do resgate. Entre servidores públicos e simples cidadãos com conhecimento e disposição para ajudarem, havia apenas um foco: reunir uma mãe e seus filhos, e uma mulher ao seu marido. (Juliano Corrêa)