Em 2013, quando recebi a missão de escrever um livro sobre a história do Poder Legislativo em Marabá, temi que não conseguisse me aprofundar tanto em fatos passados por falta de fontes, principalmente confiáveis. Mesmo depois de alguns meses, havia um hiato imenso que eu não consegui penetrar (e até hoje sei pouco sobre ele). É a década de 1920, sobre a qual não há livros de atas das sessões e quase nenhum outro registro escrito.
Mas o que mais me motivou em toda a pesquisa, realizada por 14 longos meses, foi conhecer a história de alguns personagens. Eu poderia citar vários aqui, mas tomei tempo hoje para escrever apenas sobre um deles. Dib Salomão. Só isso no registro de nascimento. As atas da década de 1950 são o testemunho do grande vereador que ele foi. Mas eu não conseguia mais nada sobre ele, nem informação, nem fotografias. Os poucos que o conheceram e eu procurei estavam velhos demais para contar sua história de vida.
Neste ano de 2020, fui desafiado a coordenar a reformulação do Memorial Político de Marabá, que tem um espaço privilegiado na Câmara. Para montar uma galeria com fotos dos presidentes de todas as épocas, eu precisava ir atrás da foto de Dib Salomão. Para mim, parecia tarefa impossível (de novo).
Leia mais:Conversando com algumas pessoas mais velhas, consegui o contato de uma de suas irmãs, conhecida como Terezinha Salomão, de 78 anos de idade, que reside em Belém. Tive longas conversas com ela ao telefone. Foi solícita, me contou histórias de sua família, enviou fotos do Dib (pelo Whatsapp mesmo), dos pais e dos irmãos (seis no total).
Ganhei aquele final de tarde de uma quinta-feira como presente. As atas retratavam um Dib Salomão que exercia uma influência positiva entre os colegas vereadores, a ponto de ter sido escolhido presidente da Câmara. Seus discursos eram memoráveis e eu queria saber quem era aquele homem culto e prudente que dominou o Legislativo na década de 1950.
Pasmei quando dona Terezinha me contou que Dib Salomão era um simples sapateiro. Os pais vieram do Líbano na década de 1930, tangidos pelos conflitos armados e montaram aqui um comércio na Velha Marabá. Dib era o mais velho dos seis irmãos e, quando adulto, montou uma oficina de sapateiro.
E, como sapateiro, elegeu-se vereador. Foram dois mandatos e já no segundo foi presidente da Câmara. Não quis seguir carreira política porque preferiu focar nos negócios, embora humilde. Chegou a ter sete trabalhadores em sua velha oficina de madeira.
Aos poucos, os irmãos de Dib foram se mudando para Belém. O velho “Cesário”, seu pai, faleceu na década de 1960, assim como sua mãe. As irmãs Terezinha e Nazaré também se foram e ficou apenas a casa, alugada até hoje na esquina da Rua 5 de Abril com a Santa Terezinha, em frente à Catedral. Dona Terezinha é a única que está viva.
Embora tivesse uma carreira promissora na política, Dib preferiu manter-se na periferia dela. Resignou-se e foi continuar o ofício de sapateiro em Belém. Casou-se, adotou um filho, e a viúva, agora com mais de 80 anos de idade, continua viva em Belém. Ainda vou ligar pra ela esta semana e ouvir histórias pessoais.
Juro que conto pra vocês na próxima quinta-feira…
(Ulisses Pompeu)
O autor é jornalista há 24 anos e escreve crônica na edição de quinta-feira