Ofício de repórter, de texto ou imagem, não é dos mais fáceis. Para mim, é a melhor profissão que se inventou para contar sobre o mundo. Estamos na rua por livre escolha na vida. Poderia ter estudado para outra história, mas o encanto pela arte de sentir, perguntar, ouvir, ver e reportar é indizível.
Perguntar, já escrevi por aqui, é ato amoroso puro. Quando se faz com honestidade e gentileza, possibilita-se incluir quem está fora. Indagar revela o que pode ser divergente e iluminador para um rumo torto ou ajuste do equívoco da certeza.
Estamos nas ruas, somos fiandeiros de versões múltiplas sobre um ocorrido ou um por vir. Não lidamos com a verdade absoluta. Nem temos parte com o divino e autoritário. Existir repórter, ser livre a pergunta, é sopro de liberdade, de paz.
Leia mais:Nesta quarta-feira, 23 de dezembro, peguei o carro 6h30 para ir, na companhia do amigo Geismario Santos, para conhecer uma família (quatro em uma) que reside na Vicinal 10 de São João do Araguaia. Em verdade, bem mais perto de Marabá do que da sede do município vizinho. Fui para perguntar, ouvir…
Já fiz muitas entrevistas com pessoas simples e necessitadas. Nunca esqueci de uma das mais sensíveis: “Não haverá Natal no número 53”, narrando o drama de uma mulher sem marido e com três filhos, perto de ser despejada da casa que morava no Bairro Jardim União, há cerca de dez anos.
Mas a história de ontem me causou dores que eu ainda não tinha experimentado, do alto de meus 50 Natais. Inicialmente, pensei que era apenas uma família carente. Mas chegando na Vicinal 10, descobri que dona Antônia da França Bezerra morava em uma minúscula propriedade de apenas quatro linhas, onde construíram três barracos cobertos de palha, um para ela e outro para dois filhos.
Aos 50 anos de idade, Antônia tem quatro filhos, netos e até mesmo uma bisneta, recém nascida. Ela mora em choupana cujas paredes foram feitas com açaizeiro, chão batido e, como todas as outras, coberta de palha de coco.
Os três homens das casas se viram como podem, mas o que ganham só dá para custear o mínimo do mínimo ao cubo. O caso mais emblemático é de Suelbia Beserra Ferreira, de 29 anos, filha de Antônia. Há alguns meses ela saiu de Parauapebas e veio com a família fazer reforma agrária na pequena terra da mãe. Ela, os quatro filhos e o marido. Improvisaram uma barraca coberta de palha, mas sofrem quando chove.
Ela sonha com a cobertura digna da casa para não haver desassossego quando a água cai de cima e começa a incomodar as crianças. A escadinha de Suelbia se conta assim: a mais velha com 13, outra com 8, um rapazinho com cinco e uma mocinha com um ano e sete meses. Ah, eu ia esquecendo, põe na conta uma neta com apenas três meses de vida.
Fomos num dia de chuva e o terreiro não estava muito convidativo para crianças brincarem. Encharcado, só as galinhas saiam do poleiro para ciscar e garimpar uma comida.
Não dá para visitar aquelas famílias sem sentir desejo de voltar para ajudar. Nessa hora, o repórter some e o humano se sobrepõe. Não basta só perguntar, é preciso dividir, pedir, voltar…
E você, leitor, não acha que também pode ajudar Suelbia e os filhos? Eles estão lá, neste Natal, sem saber que é Natal. Pode ser com doação de telhas para cobertura da casa, alimentos ou roupas para as crianças (e o bebê – é menina, viu!), ou até mesmo compartilhando fé e esperança.
Sim, é tempo de pandemia. Mas mesmo em situação tão delicada, sempre é tempo de ser solidário.
Quem quiser entrar nesse amigo secreto e ajudar, pode entrar em contato pelo telefone: 94-99263-9838 (Suelbia).
* O autor é jornalista do CORREIO há 24 anos e escreve crônica na edição de quinta-feira