Imagine ficar três anos preso por um crime que você não cometeu. Pois é, isso ocorreu com o jovem Marcelino da Silva, preso sob acusação de um crime bárbaro: latrocínio. Ele sempre alegou inocência, mas foi condenado pela Justiça e entrou com recurso, que finalmente foi acatado pelo Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), nesta quarta-feira (4). Agora, ele tentará reconstruir sua vida, que foi devastada no período em que ficou preso.
O caso em questão diz respeito ao cruel assassinato do comerciante Emanuel Gustavo Ferreira Gonçalves, dono de um supermercado em Cumaru do Norte, sudeste do Pará. Criminosos invadiram o comércio dele, amarram sua esposa, depois o executaram a golpes de faca e roubaram R$ 2 mil e ainda uma moto Honda Fan.
Na época do crime, algo muito sério aconteceu: um dos envolvidos foi identificado pela esposa da vítima e preso em flagrante. Mas a população se revoltou e cerca de 80 pessoas o tomaram das mãos da Polícia Militar, que tentava recambia-lo para Redenção, justamente por medida de segurança. O acusado foi linchado até a morte.
Leia mais:Os outros três suspeitos tiveram melhor sorte porque foram presos pouco tempo depois e o Estado conseguiu manter sua integridade física. Um desses acusados era justamente Marcelino da Silva, que, segundo sua defesa, foi apontado apenas por boatos de populares, só porque o achavam parecido com um dos envolvidos.
Quem conta essa história é o advogado Raphaell Braz, que assumiu a defesa de Marcelino. Segundo ele, a esposa da vítima, sobrevivente do latrocínio, nunca reconheceu Marcelino, ex-funcionário das vítimas, como um dos participantes do crime.
De acordo com Braz, ficou comprovado ao longo da instrução processual que Marcelino foi envolvido de forma injustificável no processo, de modo que a decisão da 2ª Turma de Direito Penal do TJPA entendeu que ele não teve envolvimento nem no planejamento e nem na execução.
Na visão do advogado, a condenação de Marcelino pode ter relação com sua condição social, por ser uma pessoa pobre e morar em um bairro bastante humilde. O resultado de tudo isso foi que Marcelino não pôde ver o nascimento do filho, pois sua esposa estava grávida na época em que ele foi preso e depois condenado.
“Os boatos destruíram a vida dele”, resume o advogado, acrescentando que nossa Constituição Federal deixa claro que toda pessoa é inocente até prova em contrário. Ou seja, o que deve ser comprovado é a culpa e não a inocência.
Perguntado se ele vai pedir uma reparação financeira para seu cliente, Raphaell Braz diz que os três anos que Marcelino ficou preso não voltam mais e não tem dinheiro no mundo que pague isso. O filho que ele ficou sem ter contato durante esse tempo, toda a angústia e violência física sofridas na prisão são irreparáveis, mas é preciso recorrer.
“A gente tem que buscar o máximo de reparação ao Estado para que outros inocentes como ele não passem pelo que ele passou”, argumenta o advogado, acrescentando que torce para que outras condenações pautadas apenas em meros boatos não voltem a acontecer. “Finalmente a Justiça começou a ser feita agora”.(Chagas Filho e Evangelista Rocha)