Correio de Carajás

Adonei Aguiar tenta vender área de Serra Pelada

Adonei Aguiar não para de surpreender negativamente mesmo ao apagar das luzes. Na reta final do mandato como prefeito de Curionópolis, no sudeste do Pará, mais uma grave denúncia emerge contra ele. As informações colhidas pelo Portal Correio de Carajás deixam clara a disposição do gestor em cometer fraudes e ludibriar a população para atender a interesses próprios. 

Vereadores afirmam – e comprovam com prints e áudios – terem sido procurados pela administração pública e recebido generosa e ilegal oferta para aprovarem o Projeto de Lei 07/2020, que autoriza o Poder Executivo a emitir títulos definitivos da área de quase mil hectares de Serra Pelada, ou seja, 367,31 alqueires do norte.

Conforme a denúncia, cada voto positivo seria recompensado por 10 alqueires no entorno da cava, onde foi o famoso garimpo de Serra Pelada. A área foi previamente dividida em um mapa encaminhado ao vereador Ítalo Duarte pelo secretário de Finanças do município, Gleikson Gomes de Oliveira, e ao qual o Correio de Carajás teve acesso.

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Sabendo da ilegalidade do ato e que os títulos não poderiam ser emitidos em nome dos vereadores, o secretário também encaminhou áudios solicitando dados de terceiros para serem colocados no georreferenciamento dessas áreas, ou seja, de laranjas que os edis quisessem indicar.

“Ítalo, preciso que você mande para mim os dados, RG e CPF, de preferência a foto dos documentos, das pessoas que vão ficar com o nome lá no lote, para fazer o georreferenciamento, organiza para mim, tem que ser dois porque são dois lotes e amanhã é o negócio, tá? Não esquece não”, diz, referindo-se a uma sessão na Câmara de Vereadores na qual o Projeto de Lei entraria em votação.

No dia seguinte mais uma vez o secretário encaminha dois áudios tocando no assunto e cobrando que o vereador dê apoio na aprovação do projeto. “A sessão é hoje, entendeu, do negócio lá, então estamos no seu aguardo aí, manda os dados aí pra gente organizar o georreferenciamento”, diz o primeiro. “Não esquece da sessão, ein? 3 horas hoje”, lembra no segundo.

Os prints feitos a partir do celular do vereador foram registrados em Ata Notarial junto ao Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis no dia 29 de dezembro de 2020, comprovando ser verdadeira a troca de mensagens.

PROJETO APROVADO

No dia 16 de dezembro, uma quarta-feira, após a votação da Lei Orçamentária Anual que tradicionalmente fecha os trabalhos da Câmara Municipal de Vereadores, o vereador Paulo Higino, que atuava como presidente interino da Casa de Leis, convocou Sessão Extraordinária para a sexta, dia 18 de dezembro.

A sessão aconteceu de forma controversa e seis vereadores aprovaram em regime de urgência o projeto de lei autorizando o Poder Executivo a emitir os títulos na região de Serra Pelada. O projeto havia sido encaminhado para a Câmara Municipal em 24 de novembro, mas quase um mês depois não havia passado pelas comissões antes de ser aprovado.

O vereador Ítalo Duarte, que recebeu os áudios do secretário, votou contra o projeto e demonstra preocupação com a condução do processo. “Não vamos ter acesso à situação (titulação), não vamos saber como que estão passando, é uma coisa muito estranha”, comentou.

Durante a sessão, o vereador Magno Araújo denunciou que parte da área estaria sendo prometida para pessoas que não vivem na comunidade, tampouco são consideradas hipossuficientes. Para deixar tudo mais grave, o edil foi informado sobre quais seriam as intenções obscuras por trás da manobra.

Ao Correio de Carajás, informou ter ouvido de fonte próxima ao prefeito municipal que a área restante, após a divisão entre os vereadores, seria negociada com uma empresa e que Adonei Aguiar seria pessoalmente beneficiado com o acordo.

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Adonei Aguiar teria interesses particulares na área

“A denúncia recebida por mim dá conta de que o prefeito teria parte nessa empresa com a qual ele negociaria Serra Pelada, prejudicando garimpeiros e moradores que teriam que se retirar da área, além de entregar patrimônio público para uma empresa privada, o que é crime de prevaricação”.

Magno apresentou no plenário o mapa com as divisões e pediu a suspensão da sessão para que a denúncia fosse averiguada. “Eu apresentei pra ele (presidente interino) o mapa com a divisão entre vereadores e as minhas contestações, pedindo a suspensão da sessão. Mesmo assim ele seguiu e aprovou (o projeto) sem passar pelas comissões”, relata Magno.

O vereador alega, ainda, que o projeto é vago e dá “superpoderes” à Prefeitura Municipal, sem estabelecer que os títulos a serem distribuídos sejam votados pela Câmara e sem definir quais critérios serão utilizados na concessão desses documentos. “Aprovaram com número menor de votos, precisaria de oito, se aprovou com seis. Estavam com muita pressa de aprovar”, comenta.

Ao final da sessão, mais regras rasgadas na Câmara Municipal em relação ao tema. Magno solicitou a ata da Sessão Extraordinária ao presidente interino, mas esta nunca foi entregue e nem encontrada na Casa de Leis por nenhum vereador que tentou acessá-la. “Não existe nenhuma ata, não foi feita, não foi lavrada ata, não foi feito o termo de envio (para sanção), não foi feita nenhuma das formalidades que a Câmara tem que fazer pra poder enviar a lei”, declara.

PRESIDENTE INTERINO PROMETE ATA, MAS NÃO ENTREGA

Após a denúncia, a Reportagem procurou o presidente da sessão, vereador, Paulo Higino, solicitando cópia da ata que desapareceu. O vereador sustentou que ela foi registrada e entregue à Casa de Leis, comprometendo-se a pedir que o procurador a enviasse à reportagem, o que não ocorreu desde o último dia 17.

Justifico, ainda, ter convocado os colegas “pelo povo” e negando ter recebido qualquer oferta por parte do gestor do município. “O procurador da Câmara estava presente, secretariando a sessão, eu coloquei em votação o regime de urgência e eles aprovaram”.

Questionado por que não aguardou o projeto tramitar nas comissões, alegou que “outros projetos já foram votados nesse sentido”, referindo-se à urgência, e argumentou que todos os edis receberam cópia do documento. Acrescentou que a discussão em torno da aprovação da Lei Orçamentária Anual teria sido um empecilho para o trâmite normal do projeto.

“Ninguém foi induzido e por muitas vezes deixei a vontade pra todos se manifestarem, todos falarem, ninguém foi forçado a nada. Depois que terminou a sessão, eu tava na estrada, me ligaram pedindo pra retirar, já tava na estrada, não tinha como fazer isso”, defendeu-se.

Ele informou que no mesmo dia o projeto foi entregue para a procuradoria encaminhar para a Prefeitura de Curionópolis providenciar a sanção. Até o momento o documento segue nas mãos de Adonei Aguiar, não tendo sido encaminhado para publicação enquanto lei.

VEREADOR MUDOU VOTO APÓS SABER DA DENÚNCIA

O Correio de Carajás também procurou outros vereadores da Casa para comentarem o caso. O vereador Wilson Ferreira afirma ter votado favorável ao projeto por ter acreditado que iria beneficiar a comunidade de Serra Pelada, mas pediu para ter o voto mudado após ter conhecimento da suspeita de fraude e redirecionamento de áreas.

“Eu, particularmente, achei um projeto muito interessante, mas depois de aprovado foi conversado sobre qual seria o interesse real do autor do projeto (Adonei Aguiar), que tava pra passar até pra empresa, fiquei muito chateado. Vou conversar com o presidente e ver se há como retirar o voto, vou fazer um documento pra retirar”, declarou.

Ele alega ter tentado falar com o presidente da Sessão para reavaliarem o assunto logo após a votação.  “Liguei pra ele, liguei pro assessor jurídico, ele não voltou pra gente poder rever essa situação. Não concordo que seja desviado o título pra outras pessoas que não sejam realmente as que têm posse”.

O Portal também conseguiu contato com o vereador Raimundo Roldão, que votou favorável ao projeto. Ele alegou estar ocupado e desligou o telefone. Outros vereadores procurados não atenderam as ligações.

VOTOS

Os vereadores que votaram favoráveis ao projeto foram Paulo Higino, Aderbal, Junior Brito, Raimundo Roldão, Wilson Ferreira e Junior da Mariona, mas estes dois últimos pediram posteriormente a mudança de voto. Magno Santos e Ítalo Duarte votaram contrários.