O uso excessivo de álcool pode causar esteatose hepática, hepatite alcoólica e cirrose. A cirrose alcoólica é responsável por cerca de 40% das mortes devidas à cirrose. Com frequência, a história de uso excessivo de álcool é negada.
As formas graves (hepatite, cirrose) estão associadas à ingestão de 160 g/dia por 10 a 20 anos. As mulheres são mais suscetíveis que os homens e desenvolvem hepatopatia avançada com menor ingestão de álcool. As hepatites B e C podem ser cofatores no surgimento de doença hepática. A desnutrição pode contribuir para o surgimento de cirrose.
Em relação a esteatose hepática ela manifesta-se com frequência como hepatomegalia assintomática e elevações leves nas provas bioquímicas de função hepática. Observa-se reversão com a eliminação do etanol, em que não evolui para cirrose.
Leia mais:Em relação a hepatite alcoólica, a manifestação clínica varia de assintomática a insuficiência hepática grave com icterícia, ascite, sangramento gastrointestinal e encefalopatia. Ocorrem anorexia, náuseas, vômitos, febre, icterícia e hepatomegalia dolorosa. Há um quadro colestático ocasional que simula obstrução da via biliar.
Aspartato aminotransferase (AST) habitualmente menor que 400 U/L e mais que 2 vezes mais alta que a alanina aminotransferase (ALT). A bilirrubina e os leucócitos podem se mostrar elevados. O diagnóstico é definido pelos achados na biópsia do fígado: tumefação dos hepatócitos, corpúsculos hialinos alcoólicos (corpúsculos de Mallory), infiltração de polimorfos nucleares, necrose de hepatócitos e fibrose em torno da vênula centrolobular.
Outras consequências metabólicas do alcoolismo. Um aumento na relação da coenzima NADH/NAD que resulta em acidose láctica, cetoacidose, hiperuricemia, hipoglicemia, hipomagnesemia e hipofosfatemia. Também há disfunção mitocondrial, indução de enzimas microssomais que resulta em metabolismo medicamentoso alterado, peroxidação lipídica que acarreta dano à membrana, estado hipermetabólico.
Muitas características da hepatite alcoólica podem ser atribuídas aos efeitos tóxicos do acetaldeído e das citocinas (interleucinas 1 e 6, bem como TNE, liberados em razão da detoxificação deteriorada de endotoxinas).
Em relação aos fatores prognósticos adversos. Os pacientes gravemente enfermos com hepatite alcoólica exibem taxas de mortalidade em 30 dias maior que 50%. A hepatite alcoólica grave caracteriza-se por Tempo de Protrombina (TP) maior que 5 vezes acima do controle, bilirrubina maior 8 mg/dL, hipoalbuminemia e azotemia.
Uma função discriminante na avaliação prognóstica pode ser calculada como 4,6 vezes (TP do paciente em segundos) (TP controle em segundos) + bilirrubina sérica (mg/dL). Os valores ≥ 32 estão associados a um mau prognóstico. Um escore no Model for End-Stage Liver Disease (MELD) > 21 também está associado com significativa mortalidade na hepatite alcoólica. Ascite, hemorragia visceral, encefalopatia hepática e síndrome hepatorrenal predizem um mau prognóstico.
Em relação ao tratamento, a abstenção alcoólica é essencial; deve ser adotada uma dieta de 2.000 a 3.000 kcal com 1 g/kg de proteína (menos se houver encefalopatia). Administração diária de multivitaminas, tiamina (100 mg) e ácido fólico (1 mg). Corrigir as deficiências de potássio, magnésio e fosfato. Transfusão de concentrado de hemácias e plasma, se necessário. Monitorar a glicose (hipoglicemia na doença hepática grave).
Os pacientes com hepatite alcoólica grave definida por uma função discriminante maior que 32 ou MELD maior que 20 devem receber predisona 40 mg/d ou prednisolona 32 mg/d VO por 4 semanas seguidas de redução gradual.
A pentoxifilina demonstrou melhora na sobrevida, primariamente por uma redução na síndrome hepatorrenal, dando origem à inclusão desse agente como alternativa aos glicocorticoides no tratamento da hepatite alcoólica grave.
O transplante de fígado pode ser considerado nos pacientes cuidadosamente selecionados com cirrose em estágio terminal.
* O autor é médico especialista em cirurgia geral e saúde digestiva.
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