Um mês antes daquela noite de terça-feira, 20 de agosto de 1991, Gabriela e Edna haviam feito um pacto de amizade – e também de amor. Estavam comendo uma pizza de frango na Pizzaria Verdes Mares com seus namorados e queriam perder a virgindade juntas – ambas com 17 anos de idade.
Marcaram dia, horário e local. E até a cor da calcinha, que deveria ser a mesma para as duas, embora fossem ficar em quartos diferentes no Flor de Liz, único motel na Nova Marabá naqueles tempos, localizado na quase esquecida Folha 21. Aliás, até hoje ele está por lá com o mesmo nome, os vizinhos garantem que ainda funciona, mas a maior parte dos marabaenses desconhece sua existência.
Ah, fui ver agora e tem até página no Instagram (pasmem) com mais de 400 seguidores! Mas vamos deixar de fazer propaganda do lugar e focar no que interessa nessa história.
Leia mais:As duas, então, acertaram detalhes e ficou definido que os homens comprariam os preservativos, pagariam os quartos e as comidas, que levariam para a primeira noite delas, porque naqueles tempos os motéis daqui não tinham nem frigobar.
Carlos, o Paulista, tinha 20 e namorava Gabriela desde que ela completara 15. Pimentel, o mais velho e rodado do quarteto, tinha 24, e namorava Edna. Ele gostou da novidade proposta e resolveu pagar a conta toda, mas Carlos não deixou.
Eles moravam na Folha 16 e elas na Folha 20. Os meninos trabalharam duas semanas só pra garimpar o dinheiro do táxi para chegar e sair do motel e, ainda, pagar as outras despesas que foram minunciosamente calculadas pelas amigas.
Os pais de Gabriela tentaram, em várias ocasiões, terminar o namoro e queriam que a menina focasse nos estudos. Era a mais velha de uma família de três irmãos, que nasceram na Macaxeira, um castanhal/fazenda que pertencia ao saudoso Osório Pinheiro.
Depois que o último nasceu, ainda na década de 1970, a mãe botou banca e queria vir morar na cidade para os meninos irem para a escola e desasnar.
Depois de seis meses de pressão diária, o marido cedo e comprou uma casa no Km 7 e depois montou um comércio na Folha 20, onde a família morava em três cômodos construídos com muito sacrifício.
Na escola, Gabriela era a queridinha dos professores, que a elogiavam para a mãe e previam um futuro promissor para a garota. “A senhora vai conseguir mandar essa menina pra fazer medicina em Belém?”, indagava Rita, secretária do Pequeno Príncipe.
Graça, a mãe de Gabriela, sabia que esse sonho seria impossível. Mesmo assim, queria o melhor para a menina. Ela passou no vestibular da UFPA para Pedagogia e foi ser professora.
Voltando à noite de terça-feira, no Flor de Liz, os quatro chegaram de táxi, pediram dois quartos e, lá dentro, Edna quis desistir, porque lembrou-se do tamanho do cinto de sua mãe, caso descobrisse que não era mais virgem.
Mas Pimentel, com jeitinho, a fez ficar e focar no que interessava.
Conversando com ambas, semanas atrás, me confessaram que foi um pouco tenso, dolorido, mas prazeroso. E não se arrependem de nadica de nada. Gabriela casou-se com o namorado – que fora seu primeiro também.
A mãe de Edna não descobriu escancaradamente a relação sexual da filha, mas desconfiou de seus hábitos. E não deu outra. Veio o castigo. Mandou a garota quatro meses depois para estudar em São Paulo, morando na casa de uma amiga. Lá, fez enfermagem e trabalha até hoje em dois hospitais particulares na capital paulistana.
Gabriela e Edna continuaram amigas. Em três décadas, se comunicaram por carta, telefone fixo, depois por e-mail e, agora, via redes sociais, por onde fazem chamadas de vídeo, compartilham fotos e se veem com mais frequência aqui ou lá.
Retirada à força dos braços de Pimentel no início da década de 1990, Edna só voltou a Marabá 25 anos depois, quando quis rever o rapaz e matar a saudade, embora ambos estivessem casados.
Foram ao mesmo Flor de Liz numa noite de terça-feira. O cheiro de amêndoas que ela espalhara no quarto de número 4 ainda estava por lá. Fizeram amor sem pudor e sem compromisso de voltar o relacionamento.
Um irmão dela descobriu o reencontro e ensaiou uma reclamação, lembrando que não tinham mais idade para isso.
Ela respondeu com uma frase que não esquece até hoje:
– Há 30 anos, me cagaram a vida porque éramos demasiados jovens para ficarmos juntos. Agora, querem repetir a dose porque somos demasiado velhos. Vão se à merda!
* O autor é jornalista há 27 anos e escreve crônica na edição de quinta-feira
Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.