Correio de Carajás

50 anos depois, saiba como Marabá foi envolvida na Guerrilha do Araguaia

Em uma viagem no tempo, saiba como o município foi implicado em uma das lutas mais marcantes na história da região

No dia 12 de abril de 1972, ocorreu o primeiro enfrentamento armado da heroica Guerrilha do Araguaia. E na próxima terça-feira, 12, completam 50 anos do conflito, que trouxe várias implicações a Marabá. Apesar de não ter ocorrido no espaço territorial deste município, os marabaenses sofreram os impactos do confronto.

A Guerrilha foi um conflito armado ocorrido no período de 1972 a 1974, envolvendo cerca de 70 jovens, membros do Partido Comunista do Brasil, membros do Partido Comunista do Brasil, a população da região da Serra das Andorinhas em confronto com aproximadamente 10.000 militares do Exército, Marinha e Aeronáutica.

Visando obter informações e localizar os envolvidos na Guerrilha, as Forças Armadas usaram de grande violência, que atingiu também comerciantes, barqueiros e religiosos de Marabá. O Exército estabeleceu sua principal base em Marabá e, como consequência, instalou mais tarde o 52º Batalhão de Infantaria de Selva. Posteriormente, a 23ª Brigada.

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A atual sede do DNIT em Marabá, chamada na época de Casa Azul, servia de prisão para participantes da guerrilha. Há vários relatos que apontam para isso. Inclusive, nas décadas de 1990 e 2000 houve escavações no local, porque alguns testemunhos apontavam que lá foram enterrados alguns corpos de guerrilheiros.

O Exército impôs toque de recolher em Marabá e muitos moradores da cidade eram revistados frequentemente.

Os guerrilheiros mais famosos na região foram Osvaldo Orlando Costa, o Osvaldão, ex-campeão de boxe pelo Botafogo e ex-oficial do Exército; Dina Monteiro, geóloga; Tuca, ex-enfermeira do Hospital das Clínicas, em São Paulo; João Carlos Haas, o Juca, médico; e Helenira Resende.

Osvaldão foi um dos ícones da Guerrilha do Araguaia e ficou várias vezes hospedado em hotel de Marabá

Maurício Grabois, dirigente do Partido Comunista do Brasil, membro de seu Comitê Central, da sua Comissão Militar e Comandante da Guerrilha, registrou assim o feito em seu Diário*:

“30/4 – Começou a Guerra Popular a 12/4. O inimigo, possivelmente informado por alguma denúncia, atacou de surpresa o Peazão (na Faveira, na beira do Araguaia) entre as 15 e as 16 horas daquele dia. Avisado com poucas horas de antecedência, pela massa, o Destacamento “A” retirou-se organizadamente para a mata. O Grupamento daquele Destacamento, que estava sediado no Peazão, dada a superioridade do adversário, não ofereceu combate, mas salvou seus efetivos, seu armamento e diversos materiais.”

Assim foi deflagrada a luta armada dirigida pelo Partido Comunista do Brasil entre os anos de 1972 e 1974, que mobilizou centenas de massas camponesas na região sul do Pará, conhecida como ‘Bico do Papagaio’, e animou milhares de brasileiros na luta contra o regime militar fascista pró-imperialista. A resistência despertou um ódio visceral dos generais gorilas, que deslocaram para aquela região dezenas de milhares de efetivos militares e potente arsenal de guerra, com que realizaram três campanhas para reprimir e aniquilar os guerrilheiros e seus apoiadores.

Centenas de camponeses foram barbaramente massacrados e 69 guerrilheiros, militantes do Partido Comunista do Brasil, foram igualmente torturados e assassinados. Vários destes tombaram em combate e sua imensa maioria deu inapagáveis exemplos de firmeza, bravura e heroísmo.

Muitos agricultores da região foram aniquilados por colaborar com os guerrilheiros

A epopeia revolucionária do Araguaia não é somente um marcante acontecimento histórico. Ela representa um marco político e ideológico da luta de classes em nosso país, representa o estágio mais avançado alcançado pelo proletariado brasileiro e sua vanguarda em sua luta pela revolução brasileira até os dias atuais.

Pedro Pomar, dirigente do Partido Comunista do Brasil, foi quem de forma mais profunda e acertada avaliou a experiência do Araguaia. Em seu balanço, apresentado na reunião do Comitê Central do partido em meados de 1976 e retomada em dezembro do mesmo ano (quando o próprio Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Franco Drummond foram brutalmente assassinados no chamado ‘Massacre da Lapa’), Pomar destacou:

“Ressalto, antes de tudo, a firme decisão do CC em realizar a tarefa que aprovou, de implantar, em algumas áreas do mais remoto interior brasileiro, dezenas de camaradas que demonstraram disposição de suportar todos os sacrifícios, a fim de prepararem e desencadearem a luta armada. (…) A experiência do Araguaia representou, inegavelmente, uma tentativa heroica para criar uma base política e dar continuidade ao processo revolucionário, sob a direção de nosso Partido. Tinha em vista formar uma sólida base de apoio no campo e desenvolver o núcleo de um futuro exército popular, poderoso, capaz de vencer as forças armadas a serviço das classes dominantes e do imperialismo ianque.”

Logo criticou, por mais duro que isso fosse, os sérios erros de concepção que resultaram no aniquilamento das forças revolucionárias no Araguaia e na derrota da Guerrilha:

“Tudo leva a crer que a guerrilha se iniciou como um corpo a corpo dos comunistas contra as tropas da ditadura militar. E assim continuou quase todo o tempo. Aí reside, a meu ver, o maior erro, o mais negativo da experiência do Araguaia. Pois a conquista política das massas não pode ser efetuada só depois da formação do grupo guerrilheiro. Tampouco este deve ser constituído única e exclusivamente, mesmo que seja apenas no princípio, de comunistas. E não se diga que a orientação contida nos documentos e resoluções do Partido não seja cristalina a respeito. Tanto pela letra, como pelo espírito, os documentos partidários essencialmente dirigidos contra as teses pequeno-burguesas e foquistas, indicam, sem margem de dúvida, que: 1) a guerra popular é uma guerra de massas; 2) a guerrilha é uma forma de luta de massas; 3) para iniciá-la, ‘mesmo que a situação esteja madura, impõe-se que os combatentes tenham forjado sólidos vínculos com as massas’; 4) a preparação ‘pressupõe o trabalho político de massas’; 5) os três aspectos — trabalho político de massas, construção do Partido e luta armada — são inseparáveis na guerra popular; 6) o Partido, isto é, o político, é o predominante desses aspectos; 7) numa palavra, o trabalho militar é tarefa de todos os comunistas e não apenas de especialistas.”

Transbordando otimismo revolucionário e confiança no partido em superar as dificuldades e erros e no triunfo da revolução, assim Pedro Pomar conclui sua avaliação:

“Nosso Partido, sem embargo de ter sido duramente golpeado e sofrido sérias perdas, já não é o mesmo de 1972. Também ganhou experiência. Portanto, para transformar as presentes condições desfavoráveis, cumpre-nos persistir em nossa política de frente única, concentrar mais esforços para ganhar as grandes massas operárias e camponesas, revolucionarizar mais nossas fileiras, defender com firmeza nossa organização e acelerar a preparação militar. Tudo indica que os horizontes vão clareando para o povo brasileiro. A bandeira da luta armada, que empunharam tão heroicamente e pela qual se sacrificaram os camaradas do Araguaia, deve ser erguida ainda mais alto. Se conseguirmos de fato nos ligar às grandes massas do campo e das cidades e ganhá-las para a orientação do Partido, não importa qual seja a ferocidade do inimigo, com toda certeza a vitória será nossa.”