Correio de Carajás

Você pagaria R$220 bilhões no twitter?

Imagino que, sendo você leitor desta coluna, a sua resposta é não. Tanto porque você não deva ter esse dinheiro, quanto porque você acharia uma “extravagância”. Pois bem, foi esse preço (44 bilhões de dólares, em valores convertidos) que o bilionário Elon Musk pagou para ser proprietário do aplicativo.

A fortuna do dono da Tesla e da SpaceX é estimada em US$ 219 bilhões (R$ 1,021 trilhão), então despender 20% de sua riqueza estimada em um investimento altamente rentável não deve ser um problema, correto? Aí está o problema, primeiro, porque esses U$44 bilhões vêm, sobretudo, de empréstimos bancários e, segundo, porque o twitter não é uma empresa rentável. Segundo dados agregados pelo Laboratório de Contas Regionais da Amazônia (Lacam) da Unifesspa, desde 2013, quando o twitter abriu seu capital, ele só não fechou em prejuízo em 2018 e 2019. Em 2020, por exemplo, teve um prejuízo de mais de 1,1 bilhões de dólares (5,5 bilhões de reais, em valores convertidos). Sua taxa de lucro (retorno sobre o capital próprio), que expressa a saúde econômica do investimento, atingiu patamares de -22% em 2013 e -14% em 2020. Logo, a resposta para essa questão deve, necessariamente, extrapolar aos elementos econômicos.

Para poder responder com qualidade essa questão, é importante observar o que o bilionário está prometendo fazer. O principal mote é a liberdade de expressão irrestrita. Muito provavelmente significa reduzir a moderação da plataforma. O ponto é que liberdade de expressão sem levar em conta se ela é discriminatória ou moralmente reprovável pode ser vista como uma rede social promotora de um ambiente que aceite ofensas contra negros, mulheres, imigrantes, sujeitos lgbts, dentre outros grupos sociais vulneráveis.

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Um elemento importante é que o twitter afeta dinâmicas geopolíticas, eleições, a média da opinião pública, dentre outras implicações sociais. Basta lembrar da relevância dessa rede social na chamada Primavera Árabe. Neste sentido, dominar como o twitter e as demais redes sociais serão reguladas (ou não reguladas) é também uma expressão de poder. Ao que parece, está é uma primeira possibilidade de resposta, ou seja, ampliar a possibilidade de poder afetar os rumos da vida pública em geral.

Adicionalmente, hoje, a mercadoria mais valiosa é a informação. Redes sociais, em geral, têm uma enorme capacidade de aglutinar dados pessoais de milhões de pessoas. Elaborando os algoritmos corretos, é possível qualificar melhor as ações políticas, pois atores e partidos políticos podem filtrar para quem certas informações serão enviadas; ações econômicas, já que é possível estimar de modo mais robusto a demanda a um dado empreendimento, atuando mais fortemente em marketing e propaganda, ou até filtrando melhor onde devem ser feitos os investimentos, reduzindo os riscos por motivo de informação privilegiada, dentre outras.

Assim, se em termos diretos e objetivos, a compra do twitter é algo estranho, tendo em vista que essa plataforma, desde que abriu seu capital, tem registrado sucessivos prejuízos e taxas de lucro negativas, por outro lado, há esses dois pontos citados acima. Ter o controle sobre uma rede social que tem uma enorme capacidade de afetar a vida pública e agrega múltiplos dados pessoais de milhões de pessoas parecem ser bons motivos para um bilionário adquirir esta rede social. Nisto, ao que parece, as exigências sobre os Estados Nacionais serão ainda maiores, já que terão que produzir algum nível de controle social sobre as plataformas, ao risco de comprometer seu futuro político, social e econômico.

* O autor é economista e docente da Faculdade de Ciências Econômicas da Unifesspa

Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.