Correio de Carajás

Uma breve história do “Massacre de Eldorado” e os novos caminhos da luta no campo

2023 marca os 27 anos do Massacre / Foto: João Roberto Ripper

Essa segunda-feira (17) marca os 27 anos do acontecimento que enlutou dezenas de famílias e marcou, para sempre, a luta dos movimentos camponeses do Brasil. O “Massacre de Eldorado do Carajás” ocorreu em abril de 1996, no local conhecido como “Curva do S”, onde 21 trabalhadores sem-terra foram mortos pela Polícia Militar (PM) do Pará.

A HISTÓRIA COMEÇA MUITO ANTES

O professor Pedro Lealci Eleuterio de Jesus, formado em Geografia pela Universidade do Estado de Amazonas (UEA), explica que o Massacre é a culminação de movimentos históricos que datam desde o período colonial do Brasil e atravessam o século XX com a criação das ligas camponesas, que vão lutar por reforma agrária em conflitos que passam, principalmente, do Nordeste e Sul para depois chegar à Amazônia.

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Pedro explica que no bojo do Plano de Integração Nacional de 1970 as rodovias começaram a ser abertas na Amazônia. “Esses rasgos em meio à floresta tinham dois pontos centrais: a) atrair trabalhadores e colonos do sul, via rodovia Santarém-Cuiabá, e b) a Transamazônica para atrair os trabalhadores sem acesso à terra do Nordeste, em especial do sertão nordestino.”

As terras na Amazônia são, então, federalizadas a partir do Decreto-Lei 1.164/71 e os conflitos se intensificam, já que crescia o número de pessoas sem acesso à terra para a produção de alimentos e garantia de moradia, ao mesmo tempo que a repressão aos camponeses aumentava, tendo em vista que o Brasil estava sob o Golpe Militar de 1964.

Em 1988, a Constituição traz, em seu texto, a garantia à terra e a reforma agrária. Nesse contexto – continua o professor – nascem os movimentos sociais de luta por terra, em especial o Movimento dos Trabalhadores Ruais Sem Terra (MST) e a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) na década de 1990.

O Massacre ocorre em uma das grandes marchas organizadas pelos movimentos. Essa, em especial, seguia com 1,5 mil pessoas para Belém quando foi interceptada por 155 policiais militares, que executaram 21 camponeses – sendo que 19 morreram no local e outros dois no hospital.

O MASSACRE CONTINUA

De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra, o ano do massacre ultrapassou a média de assassinatos no campo do ano anterior, passando de 383 para 440. No entanto, como explica o professor, a violência segue.

No ano de 2022, o Estado do Amazonas foi o mais afetado pelo desmatamento. Dessa forma, explica, “aumenta a violência contra lideranças camponesas, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, líderes sindicais de trabalhadores rurais, missionários de setores da igreja católica, etc.”, já que o avanço do desmatamento implica no conflito em territórios tradicionais.

NOVOS CAMINHOS

O professor Pedro Lealci entende que uma das formas de reduzir a violência no campo é a partir da implementação de políticas de reformas agrárias, além da criação de alternativas econômicas, como a diversificação da produção industrial e bioeconomia.

“A mudança positiva vem na dialética histórica da luta. Hoje os movimentos de luta por terras tem acesso a tecnologias avançadas, internet, universidade, conseguem produzir com técnicas de agrofloresta, formam novas lideranças e criam escolas no campo”, afirma.

“Há pessoas qualificadas e há condição para começar a resolver esses problemas; agora estamos num estágio da História em que o conflito no campo também envolve os problemas de abastecimento de alimento e as mudanças climáticas”, conclui o professor. (Clein Ferreira)