Correio de Carajás

Sistema penal do Pará está falido

A instituição se chama “Centro de Recuperação Agrícola Mariano Antunes”. O nome é bonito, mas, na prática, o famoso CRAMA não passa de um mausoléu, um depósito de gente empilhada em celas fétidas, onde não há possibilidade de recuperação, porque não existe colônia agrícola nenhuma. Só no nome. O que há são muros frágeis, grades enferrujadas, túneis no subsolo e uma atmosfera contaminada pelas facções PCC e Comando Vermelho. Esta é a péssima realidade em prática no governo de Simão Jatene no Pará.

Talvez por tudo isso, quase 100 presos já fugiram de lá este ano. Enfim, o CRAMA é o retrato do abandono do governo do Pará com Marabá e com o sul do Estado. A casa penal tem 25 anos de existência e carece de reforma urgente.

Nos pavilhões que abrigam as celas do CRAMA estão amontados cerca de 640 seres humanos em um espaço projetado para apenas 180 pessoas. Mas não é só isso. Se as condições são precárias para os agentes prisionais e para os policiais que tiram serviço ali, que dirá para os presos.

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A primeira fuga deste ano no CRAMA, que foi registrada pelo Jornal CORREIO, aconteceu no dia 30 de janeiro, logo no primeiro mês do ano. Naquela ocasião, nada menos de 10 detentos conseguiram fugir. Uma semana depois, no dia 6 de fevereiro mais um presidiário desapareceu misteriosamente de lá; e no dia 4 de março, nada menos de 14 presidiários escaparam do CRAMA por um túnel. Os presos aproveitaram o fim do horário de visita para fugir por um túnel cavado no solário do pavilhão “B” da unidade prisional. A escavação tinha aproximadamente cinco metros de extensão

Mas o pior ainda estaria por vir. Para deixar claro que não existe a menor infraestrutura no prédio, capaz de manter o mínimo de segurança no local, no mês de junho, nada menos de 56 detentos realizaram aquela que é considerada a maior fuga da história de Marabá.

Naquele mesmo mês, no complexo de Americano, em Santa Izabel, fato semelhante também acontecia: quase 50 presidiários também. Mas ali a situação era ainda pior porque, dois meses antes (em abril) uma tentativa de fuga deixou 21 mortos. A carnificina que se viu ali – assim como a carnificina que se viu em Marabá, nas buscas pelos detentos de junho – pode ser imputada à omissão do governo do Estado, que – como Pilatos – lavou as mãos para o que ocorre nesta região.

SUPERLOTAÇÃO

Uma fonte que já atuou no sistema penal de Marabá explica que o problema da superlotação carcerária é antigo no Pará, com uma defasagem de mais de 100%, existindo casa penal com excesso de quase 300%. No caso do CRAMA, a superlotação atinge a incrível marca de 355%.

A mesma fonte explicou que, pela quantidade de casas penais existentes no Pará 0 um total de 47 unidades – seriam necessários pelo menos 3 mil agentes prisionais, mas existem apenas 2.300, o que torna o trabalho desses profissionais mais difícil e vulnerável.

Ações do PCC dentro do CRAMA já são visíveis há tempos e não há providências/ Fotos: Arquivo

FACÇÕES

Além das fugas, outro problema está tornando o ambiente penitenciário ainda mais hostil do que já é: a guerra das facções Comando Vermelho e PCC. Nos últimos dois meses, dois casos idênticos foram registrados, de detentos que apareceram enforcados dentro da cela, após terem gravado vídeos anunciando que estavam deixando uma facção para servir a outra.

No primeiro caso, ocorrido em agosto, a Superintendência do Sistema Penal (SUSIPE) respondeu que não tem conhecimento de guerra de facções dentro da cadeia; no segundo fez pior: mandou um e-mail dizendo que estavam sem comunicação a penitenciária que é responsável por trancafiar detentos de pelo menos 17 municípios.

E é assim, sem comunicação com o governo do Estado, que vivem os moradores desta região. Se os cidadãos livres, pagadores de seus impostos e cumpridores de seus deveres, estão desamparados, imagine os cidadãos presos.

Na ocasião da última grande fuga, o jornal conversou sobre a situação do CRAMA com o presidente da OAB Subseção Marabá, advogado Haroldo Gaia. Ele lembrou do gravíssimo problema da superlotação carcerária, que tem se agravado nos últimos oito anos.

Por este túnel, 14 detentos fugiram do CRAMA no mês de março deste ano

Segundo o advogado, o ideal seria o governo do Estado buscar apoio financeiro e logístico para melhorar estrutura física do CRAMA, porque se trata de um presídio antigo, com problemas nas paredes que não são preparadas para conter tentativas de fuga, ou escavação de túneis.

Ele foi enfático sobre a necessidade de mais atenção ao sistema penal por parte do governo do Estado. “É importante que o governo do Estado olhe a situação do CRAMA porque uma fuga em massa como esta deixa todos apreensivos… O CRAMA precisa ser imediatamente reformado”, denuncia.

Na avaliação de Haroldo Gaia, a equipe do CRAMA é esforçada, mas falta recurso. Diante disso, a função do presídio, que é dar ao preso o cumprimento de pena e também de devolver este detento para a sociedade melhor, não está sendo cumprida. “Infelizmente, nós sabemos, os presídios neste país não estão cumprindo seu papel, que é recuperar aquele preso para que volte a viver em sociedade”, resume.

Entre as falhas existentes no CRAMA, Haroldo Gaia observou, na ocasião, a pouca atividade de ensino, de maneira que os detentos ficam ociosos, pois embora exista sala de aula, o programa alcança poucos detentos.

Saiba mais

Além do CRAMA, a chamada Região Carajás (conforme nomenclatura da SUSIPE) abriga ainda Central de Triagem masculina de Marabá (CTMM) e o Centro de Reeducação Feminino de Marabá (CRFM).

 

Números

180  Capacidade projeta do CRAMA

360  População carcerária atual

355% Percentual de superlotação

 

(Chagas Filho)