Mais de um ano após realizar a primeira denúncia por falta de atendimento em Pediatria no Hospital Municipal de Marabá (HMM), ao Jornal Correio e ao Ministério Público do Estado do Pará, o microempreendedor individual Ismael Castro dos Santos voltou a ter dor de cabeça pelo mesmo motivo, o que, para ele, prova que nada mudou apesar da insistência do cidadão em cobrar solução para o problema municipal.
Segundo ele, no último dia 11, levou a filha de 4 anos até o local após ela apresentar quadro de febre alta e não reagir à medicação ministrada em casa, imaginando receber atendimento especializado. A criança passou pela triagem, onde o enfermeiro que a atendeu realizou corretamente os procedimentos e pediu que a mãe desse um banho na menina, em decorrência da febre.
Enquanto isso, a paciente foi chamada pelo médico que a atenderia, mas não estava no consultório por estar realizando o procedimento solicitado pelo enfermeiro. “Quando chegamos lá perguntei e as pessoa afirmaram que já tinham chamado o nome dela. Inclusive o pessoal foi gentil e disse que poderíamos entrar antes, mesmo tendo perdido a chamada. Quando entramos na sala expliquei a situação e o médico simplesmente disse ‘então você vai ser o último agora’. Não teve o bom senso de entender que a criança estava com febre e fez a gente esperar as demais consultas”, relatou.
Leia mais:Trinta minutos depois, afirma, a criança foi atendida, mas o médico sequer a examinou ou solicitou exames laboratoriais. “Nem olhou pra cara da criança. Só viu o prontuário da triagem e passou medicação, a famosa dipirona do HMM. Esperamos 40 minutos ou mais pra medicação fazer efeito, tivemos que esperar novamente para fazer a medição da febre. Depois esperamos de novo para conseguir falar com ele, a criança doente esperando nas cadeiras este tempo todo. A dinâmica é muito errada, as pessoas ficam perambulando pelo hospital. Não sei se é porque não tem mesmo pediatra pra atender o pessoal. Perdemos muito tempo ali”.
Ele diz que em seguida procurou a direção do HMM, de onde foi encaminhado para o setor de humanização. Lá, ao ser analisada a ficha da criança, ela foi novamente levada para a triagem e atendida por um médico diferente. “Este, ao olhar, já pediu exames de sangue e urina, mas no laboratório não tinha material para fazer coleta de urina feminina, só tinha o frasco comum. Acabei não conseguindo por ela ser menina. O exame de sangue sairia depois de 3 horas ou mais para voltarmos com outro médico e avaliar tudo novamente e, então, tentar a sorte de conseguirmos consultar um pediatra”, observou.
Para ele, deveria haver triagens separadas para adultos e crianças. “Em momento algum o médico mandou a criança para atendimento pediátrico. Não adianta investir em estrutura física se não investem em estrutura humana, em humanização. Embora tenha o setor, não funciona. O atendimento praticamente piorou porque em todas as vezes que fui nunca peguei um médico que fosse fazer medicação e mandasse voltar para triagem para então passar exame. Falta de humanização mesmo. É sorte ali, tem que torcer pra pegar atendimento bom, depende do médico que você pegar”, reclamou.
No dia seguinte, dia 12, ele retornou ao Hospital Municipal com a criança e passou pela triagem no horário de almoço. “O plantão começava 13 horas, quando conseguimos consulta com uma médica. Ela avaliou e ainda assim não passamos por um pediatra, que é o correto. Mesmo avisando nos plantões divulgados que há pediatra, porque chequei isso, os médicos não encaminharam para o pediatra”, afirma.
SAIBA MAIS
Ao Jornal Correio, em 2017, ele informou ter encontrado crianças mal alojadas na Pediatria ao longo da madrugada, quando não havia especialista de plantão.
Cobrança ao MP resultou em procedimento administrativo
Após Ismael dos Santos protocolar denúncia sobre falta de atendimento em Pediatria no HMM, em janeiro de 2018 a promotora Mayanna Silva de Souza Queiroz, titular da 6º Promotora de Justiça de Marabá, solicitou informações sobre o fato à secretária municipal de Saúde, Darmina Duarte Leão Santos.
Ela respondeu afirmando que a demanda relativa às especialidades sempre representou grande problema por se tratar de município polo de uma média de outros 21 municípios menores. “Mesmo que colocássemos de 10 a 20 profissionais não dariam conta da demanda existente”, diz o ofício. Com relação à Pediatria, acrescentou que no início de 2017 realizou-se processo seletivo, sendo que todos os aprovados já foram contratados. Afirmou, ainda, que a forma encontrada para suprir a demanda foi concentrar a demanda pediátrica no Hospital Materno Infantil (HMI).
Em maio, Ismael procurou a Corregedoria do MPPA cobrando uma solução para a situação. Em setembro, a promotora instaurou procedimento administrativo tendo por objeto acompanhar e fiscalizar de forma continuada o serviço público na especialidade Pediatria, no município de Marabá. A portaria determinava encaminhamento de ofício ao Prefeito Municipal de Marabá e ao Secretário Municipal de Saúde, cientificando-os do procedimento. No ofício enviado ao prefeito, Sebastião Miranda Filho, ela requisita também que a Promotoria de Justiça seja informada acerca de todos os atos administrativos que venham a ser efetuados em relação ao caso, como perícias, estudos, dados técnicos, informações, depoimentos e notificações.
Diretor-técnico do HMM se posiciona sobre a reclamação
Procurado pelo Jornal Correio na tarde desta sexta-feira (18), o diretor-técnico do Hospital Municipal de Marabá (HMM), Marcos Jeová, informou até o momento não ter sido procurado pelo pai da paciente. Declarou que a administração está aberta a reclamações, questionamentos e sugestões, inclusive com plantão administrativo aos finais de semana e feriados, implantado na atual gestão.
“A gente sempre pede que procure a direção porque muita gente utiliza redes sociais, por exemplo, não temos como monitorar essas denúncias por redes sociais. É importante que as pessoas nos procurem para apurarmos o ocorrido. Estamos à disposição”.
Sobre a questão envolvendo pediatras, destacou que o hospital é porta de atendimento para urgências e emergências e que as pessoas são inicialmente atendidas por clínicos, sendo encaminhadas para os especialistas apenas em casos necessários e que exigem acompanhamento especializado. “Este é um serviço complementar. Os clínicos fazem este filtro”.
Acerca da reclamação do usuário relacionada às repetidas triagens, explica que é rotina do hospital os pacientes passarem por vários atendimentos diferentes: humanização, recepção, enfermaria, consulta médica, laboratório, medicação, entre outros. “Acontece sim de ser atendido por um médico e em seguida ser atendido por outro”, diz. Isso porque, afirma, há seis médicos atendendo à porta do hospital, sendo um clínico na Pediatria entre 7 e 19 horas apenas para acompanhar as crianças internadas. Conforme o médico, até abril do ano passado o HMM atendia a média de 5.500 pessoas mensalmente, número que saltou para 10 mil atualmente. “Aumentamos o quantitativo de médicos em decorrência disso, fui informado que todos os postos de saúde também têm médicos atualmente. Destas 10 mil pessoas, de 10 a 20 fazem reclamações mensalmente, a maioria por questões de espera que são comuns no atendimento hospitalar. A prioridade do hospital é para quem chega correndo riscos”. Sobre o coletor de urina, ele informou que a unidade utiliza o material unissex. (Luciana Marschall)