Correio de Carajás

O vendedor de pirulito que virou prefeito de Marabá

Cinco minutos de conversa com Bosco Jadão bastam para entender que ele é um personagem ímpar e que viveu a maior parte dos 106 anos da história do município de Marabá. Além disso, sua voz grave, que causa inveja a muitos radialistas, leva o interlocutor a perder noção do tempo. E se alguém procura uma frase curta para definir Mestre Bosco, pode usar esta: “Senhor da história”.

Aos 84 anos de idade, Paulo Bosco Rodrigues Jadão é considerado, por quem o conhece a fundo, como um exemplo de integridade e honradez. Esse é apenas um dos motivos que levaram a Fundação Casa da Cultura de Marabá a homenageá-lo por meio de uma exposição que terá abertura na noite desta sexta-feira, dia 26, no Shopping Pátio Marabá, ao lado da 17ª Exposição de Orquídeas.

O trabalho e superação sempre estiveram no DNA de Bosco Jadão. Essas duas características surgiram logo na infância, quando ele começou a trabalhar para ajudar a mãe, Pulquéria Jadão, que ficou viúva de Moisés Jadão quando o filho caçula tinha dois dias de nascido.

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Eram sete filhos para cuidar e dona Pulquéria precisou da ajuda de todos eles.  Moisés tinha vindo do Líbano e aqui conheceu Martinho Mota da Silveira, e tornou-se seu amigo. Martinho era casado com Zeferina, que tinha uma irmã solteira em Imperatriz-MA. Era justamente Pulquéria, que veio acabou casando-se com Moisés Jadão.

“Meu pai foi com a mulher de Martinho Mota, Zeferina, para Imperatriz e trouxe minha mãe e fizeram o casamento dos dois aqui em Marabá. Eles tiveram 7 filhos, sendo que três deles nasceram no Mato Grosso, para onde ele passou uma temporada explorando minério, especialmente diamante”, relembra.

Depois que retornou para Marabá nasceu Paulo Bosco Jadão em 15 de janeiro de 1935. Dois dias depois Moisés Jadão faleceu em Belém, para onde foi em busca de tratamento de saúde.

Martinho Mota resolveu ajudar a cunhada e comprou para ela uma máquina de costura. Pulquéria passou a costurar para lojas da cidade mas, mesmo assim, passado um mês os parentes se reuniram e cogitaram a possibilidade de dividir os sete filhos entre as famílias para ajudar a viúva. “Eles diziam que minha mãe não tinha condições de nos criar, mas dona Pulquéria bateu o pé e disse não. Ela não quis mais saber de marido e se dedicou à família. Minha irmã Joaquina ajudou bastante e à medida que os outros filhos iam crescendo ajudavam também. Eu estudei dois anos no Colégio Santa Terezinha. Naquele tempo o ginásio era uma dureza, e a gente fazia dois anos em um. Foi só o que eu pude fazer também”.

Exposição moderna

Segundo a presidente da fundação Casa da Cultura de Marabá, Vanda Américo, o projeto “Balaio de Histórias” foi criado para homenagear personalidades ainda em vida. A exposição no shopping é intitulada “Bosco Jadão: dossiê da vida e da política”. Ela foi produzida com o chamado PDV automático, em que as peças são montadas em até 3 segundos e com alta qualidade de impressão. Também foram produzidos revistas, folders, totem humano e um vídeo-documentário. “É um material especial, condizente com o legado que ele, Bosco Jadão, deixa para nosso município”, explica Vanda Américo.

Ela antecipa que a exposição terá caráter itinerante, ficando três dias no Pátio Shopping Marabá, depois vai à Câmara Municipal, à Maçonaria e, posteriormente, a algumas escolas públicas.

A exposição contará com a presença do prefeito Tião Miranda, familiares, amigos e membros da Maçonaria de Marabá, entidade à qual Bosco faz parte há quase 60 anos.

Trabalho infantil?

Nos primeiros anos de sua infância, Bosco Jadão dedicou-se aos estudos, mas aos oito anos teve de dividir o tempo com o trabalho para ajudar nas despesas de casa. A mãe, Pulquéria Jadão, colocou o filho para vender pirulito, bolo de arroz e cocada. Se fosse nos dias atuais, sua mãe certamente seria chamada pelos órgãos de proteção à criança para impedir o trabalho do filho. Ganharia Bolsa Família e ponto final no trabalho do filho.

Mas a vida de Bosco foi forjada numa plataforma chamada trabalho. “Eu vendia aquilo que minha mãe produzia para arranjar recurso para criar os filhos. O colégio que nós frequentamos era estadual e depois virou municipal, onde todos nós frequentámos. A minha irmã mais nova, Ilan Jadão, que está viva, foi para o colégio das irmãs (freiras), conhecido como Santa Terezinha”, recorda.

Posteriormente, Bosco passou a trabalhar em uma mercearia de um senhor chamado Antônio Lima, já com 12 anos de idade. Aos 14, foi trabalhar na loja do seu tio Antônio Saliba. Pela manhã ficava na loja de tecidos e à tarde seguia para o colégio.

Mas Bosco não conseguia conciliar as atividades da escola com o trabalho na loja. Seu tio não queria vê-lo respondendo tarefas no local de trabalho. Um dia, Saliba tomou o livro que o garoto estudava e ele ficou muito magoado.

Naquele dia, ele ficou na porta debruçado, quando o prefeito Antonio Vilhena de Sousa foi passando e veio falar ele, perguntou o que aconteceu, por que estava chorando. “Eu contei e o Vilhena disse pra eu passar lá na prefeitura 11 horas da manhã pra conversar com ele. Quando cheguei, o prefeito já estava com a portaria me nomeando como fiscal de luz, com um salário de mil cruzeiros. E ainda disse que dali para frente quem iria pagar o meu colégio era a prefeitura. Aquilo pra mim foi até um choque, muito pesado, porque eu não esperava tudo o que aquele homem fez na minha vida”.

Quando completou 16 anos, a necessidade na casa de dona Pulquéria aumentava. Os filhos foram casando, saindo de casa e ficaram apenas Bosco e Ilan Jadão. “Eu me responsabilizava pela parte financeira e minha irmã da parte logística. Tive de procurar um emprego de salário melhor porque o que eu ganhava estava pouco para sustentar a casa. O meu tio Saliba me pagava 400 cruzeiros por mês no verão e 1.000 cruzeiros no inverno”, recorda Bosco. (Ulisses Pompeu)