Correio de Carajás

O que o jornalismo me ensinou sobre a escrita

Que eu gosto de esportes, muita gente que me acompanha sabe o tamanho dessa paixão. Desde criança, no Granito, lá no final da Travessa Lauro Sodré, na Velha Marabá, eu aprendi a gostar de futebol. Depois vieram o vôlei, basquete, natação, ciclismo, pingue-pongue, tênis e acho que qualquer outra modalidade que envolva bola.

E até hoje acordo às 4h45 para ir à academia às 5 e nadar das 6 às 7 horas. Para esta semana, me impus uma meta que não tenho cumprido desde os 35 anos: nadar 10 km em uma semana. Comecei domingo e até esta quarta-feira cheguei à marca de 5,1 quilômetros. Até sábado à noite precisa completar o restante.

Mas minha outra paixão é escrever. Há 28 anos escrevo como jornalista e esse estilo moldou muita coisa em mim. A começar, a forma de contar histórias. Enquanto eu cursava Letras e Artes na Universidade Federal do Pará (UFPA), engatinhava no jornalismo. Pela manhã, na academia, aprendia regras de acentuação, próclise, ênclise, mesóclise, aprimorando o uso da língua culta para depois ensinar aos alunos.

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À tarde, precisava usar parte disso, mas com a missão, ao mesmo tempo, de deixar o texto compreensivo para pessoas de todos os níveis de linguagem.

No tempo da faculdade, brincávamos que alguns textos eram escritos em “português de Portugal”, fazendo referência à dificuldade de compreensão daquela escrita. Encarar textos tão herméticos, que pareciam ser escritos para a “nata” da intelectualidade, era um grande obstáculo na vida daqueles jovens estudantes universitários.

Essa escrita acadêmica “fechada” reforçava o mito de que texto bom é texto erudito, complexo, difícil de ler.

E foi lá nos bancos da UFPA que li textos de teoria e crítica literária também intragáveis, mas descobri algumas escritas deliciosamente “fáceis”, como a de Antonio Candido (sem acento mesmo), cuja fluidez em nada comprometia a competência de um dos maiores críticos de Literatura do nosso país.

Candido também acreditava que a literatura é uma transposição do real para o ilusório, através de uma linguagem que estabelece um modelo arbitrário de ordem. Essa linguagem não respeita rigidamente as regras e a estrutura lingüística de um idioma.

A escrita “clara e fluida” é um dos pilares do jornalismo, pois se trata de uma comunicação feita para ser compreendida por todos. Não por acaso, muitos dos nossos maiores escritores beberam na água do jornalismo, a exemplo de Gabriel García Márquez ou do nosso Machado de Assis. Dessa relação nascem as crônicas semanais que tenho oferecido aos leitores desde 2015.

É claro que existem diferenças entre escrita jornalística, acadêmica e literária, mas, certamente, a prática jornalística tem muito a ensinar sobre “comunicabilidade”.

Obviamente, alguns gêneros, como a poesia, são feitos para não “entregar o ouro” na primeira leitura. Mas, nesse caso, a palavra é arte, brinca-se com seus sentidos — significados e sensações que o seu som, arranjo, forma gráfica podem transmitir.

Para além de alguns objetivos e peculiaridades de gênero, parece mesmo que essa escrita “para poucos” (ou para ninguém) é incompetência, ou, o que é muito pior, a propagação de uma ideologia elitista. É preciso, urgentemente, desassociar o escrever bem do escrever difícil.

O leitor de notícia está em todas as classes sociais, principalmente em tempos de redes sociais. E não apenas isso, em todas as faixas etárias, porque há muitos estudantes – até mesmo do fundamental – que acompanham o que escrevo e isso me enchente mais ainda de responsabilidade para apresentar um texto jornalístico claro, conciso e peculiar.

Por isso, ao leitor de Ouriço Cheio, digo que a escolha de palavras informais ao invés das cultas é um negócio que vem da veia, do sangue, de tanto ler Ademir Braz, de beber na fonte de gente culta de nossa cidade, mas que preferia usar termos mambembes do dia a dia às palavras frias e sem conexão com as pessoas, com suas ideias.

Então, viva o jornalismo, viva a palavra simples.

 Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.