Correio de Carajás

O advogado mais pobre de Marabá

Quando conheci Roberto, lá em meados da década de 1970, ele ajudava seu pai nos trabalhos do Chiqueiro de Porcos, no final da Rua Barão do Rio Branco, onde hoje funciona o Residencial do PAC. Dali saíram animais para abastecer as casas de muitos marabaenses. Pertencia ao saudoso João Francisco Pedro, João Pernambuco, que resistiu no abate de porcos no local até o final do ano de 1999.

Roberto ajudava seu pai, principalmente, a lavar as vísceras para vender e ganhar um dinheiro extra. Quando terminava, e antes de ir para a aula, a gente jogava um racha num campinho ali dentro do Cabelo Seco, onde fiz vários gols.

Mas meu colega de infância mudaria muito nos anos seguintes. Depois de ralar bastante nos estudos, conseguiu passar no vestibular para Direito na UFPA. Eu o acompanhava de longe, porque os caminhos da cidade não apontavam mais para o Chiqueiro de Porcos, onde nos conhecemos.

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O garoto de outrora, que limpava as vísceras dos porcos, agora era um imunizado, que só andava de paletó, camisa Aramis de R$ 600,00 e paletó Armani, que só vende longe de Marabá.

Mesmo assim, posso dizer que é o advogado mais pobre de Marabá. Pelo menos no patrimônio que diz que não tem. Anda numa camionete de luxo, última edição da Toyota Hillux, mas diz que não é dele, mas emprestada do irmão. Possui três escritórios de advocacia na cidade, mas os empreendimentos – de novo – não são dele, mas do sócio.

Recentemente, encontrei Roberto em uma partida de futebol e ele me convidou para jogar beach tennis. Disse que era um esporte mais empático, menos brutal e mais moderno. Mas as raquetes custavam R$ 2.200,00. As dele, claro, eram emprestadas pelo irmão.

Mudou-se com a namorada para uma casa de três pavimentos em um condomínio do Grupo Mirante na direção de Itupiranga. Fui lá ver o luxo, a convite dele numa noite de quinta-feira. Um lugar incrível, com muitos móveis caros, carrões na porta, piscina no quintal, uma vista incrível para o Rio Tocantins e Alexa falando alto em todos os cômodos da mansão. Relembramos os tempos do Chiqueiro de Porcos, dos campinhos de terra batida e até mesmo dos timbungos nos rios – sim, ali na confluência do Cabelo Seco a gente tinha o Tocantins e o Itacaiunas à disposição.

Mas, para minha surpresa, a casa não era dele, de novo. Era cedida pelo irmão. Então, eu desejei conhecer o irmão secreto de Roberto. Deveria ser alguém um altruísta fora do comum, daqueles que ficam imaginando o tempo todo como surpreender os irmãos com algo maravilhoso.

E foi ali, naquela noite, que fiquei bravo com meu pai. Nunca tive um irmão, nem para brincar ou para me emprestar uma bicicleta para ir à escola. E se tivesse, eu queria que fosse com o DNA do que Roberto tem e que nunca soube o nome ou conheci.

Mas o advogado pobre, filho do funcionário do Chiqueiro de Porcos, é um amigo de infância que não deve contas à Receita Federal, porque não tem patrimônio; não deve declarar imposto de renda. E não sei como faz para ir ao supermercado sem o cartão de crédito do irmão.

Abastecer aquela camionete beberrona duas vezes por semana é algo incompreensível para minha mente. Quando saímos para comer pizza na Vó Betina, dias atrás, achei melhor pagar a conta, porque seu irmão não estava por perto.

Quando disse isso a ele, veio um sorriso sarcástico no rosto e ele não fez questão de reprovar. A nova verdade não o assusta e prefere colocar a conta no bolso no irmão do que assumir que acumulou um patrimônio invejável fruto do seu trabalho na Justiça Estadual, Federal e Trabalhista.

Conheci, nos dois últimos anos, duas namoradas dele. Ambas me confessaram a mesma história, de que a casa, o carro e outros bens não são dele, mas de um mano generoso que elas também nunca viram. Parece Charlie’s Angels, aquele chefe de As Panteras, que só a voz surgia num rádio, mas nunca aparecia para as três gatas espertas.

 

 

* O autor é jornalista há 27 anos e escreve crônica na edição de quinta-feira

 

Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.