Correio de Carajás

Mulheres ainda são minoria na política

Embora elas representem grande parcela do eleitorado brasileiro, em sua maioria mulher não vota em outra mulher

“Quando ela fala, eu ouço a revolução/ Em seus quadris, está a revolução/ Quando ela caminha, a revolução está vindo”. O trecho da música “Rebel Girl” (1993) da banda Bikini Kill, que foi símbolo do feminismo e empoderamento, está um pouco longe de representar o atual cenário da mulher na política brasileira. É que dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que uma parcela mínima do público feminino consegue se eleger.

Em Marabá, o quadro não muda, na Câmara de Marabá, por exemplo, das 21 cadeiras, apenas três são ocupadas por mulheres (Cristina Mutran, Elza Miranda e Vanda Américo), ou melhor dizendo duas, já que Vanda está licenciada para presidência da Fundação Casa da Cultura de Marabá (FCCM).

Em entrevista ao CORREIO DE CARAJÁS, o advogado Magdenberg Teixeira, pós-graduado em Direito Penal e  Processo Penal e pós-graduando em Direito Eleitoral, faz um percurso histórico sobre a luta da mulher na política, desde a conquista do direito ao voto, que tornou a mulher brasileira cidadã de fato e de direito, em 1932, por meio do Movimento Sufragista, na década de 30, numa sociedade extremamente machista à época, abrindo mão, em contrapartida, do direito de se separar legalmente, a pedido da igreja católica, até os dias atuais.

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Magdenberg Teixeira ressalta que após essa vitória, somente em 1996 a mulher teve outra importante conquista, um projeto de lei aprovado indicando que o partido político, ao lançar candidatos, deveria ter no mínimo 20% de mulheres candidatas. “Não era uma obrigatoriedade, e sim uma faculdade. Em 1997, o texto mudou, obrigando os partidos a lançarem um percentual mínimo de 30% de mulheres. Mas, ainda assim não foi aplicado. Somente em 2010 essa lei passou pelo crivo do Supremo Tribunal Federal, onde os partidos tiveram de obedecer um percentual mínimo de 30%, a chamada cota de gênero. A luta feminina não foi fácil, tanto no âmbito de votar, quanto de ser votada”, explica o advogado.

Dados do TSE acerca da última eleição de 2020 revelam que 52,50% do eleitorado brasileiro é feminino, contudo, apesar disso, somente 15,80% de todos os cargos que estavam em disputa foi vencido por mulheres. “Portanto, é um número subrepresentado de mulheres exercendo cargos no poder, o que representa que mulher, em termos gerais, não vota em mulher, gerando uma baixa representatividade. Ainda segundo o TSE, quando o assunto é filiação partidária, 47,72% são mulheres”, destaca Magdenberg Teixeira.

Questionado sobre como a representatividade da mulher na política pode ser aumentada, o advogado lembra que o Estado, por meio das mais diversas instituições, busca mecanismo legais para que a mulher tenha representatividade e os partidos tentem incentivar candidatas efetivas. O jurista frisa os mecanismos estatais através da cota de gênero, que ao contrário do que muitos pensam, não é uma cota feminina. “O partido, ao lançar candidatos, tem de ter a cota dos 30% de gênero masculino ou feminino, só que como a mulher não se candidata, o partido se desdobra, vai atrás, para lançar 30% dessa cota feminina”, detalha ele.

Uma novidade desta eleição é que o voto dado à mulher valerá o dobro para distribuição na próxima eleição, para o fundo de financiamento de campanha. Magdenberg salienta que o mecanismo estatal para que a mulher se candidate é burlado pelo partido, por meio da fraude à cota de gênero. “Como existe obrigatoriedade de um percentual mínimo de mulheres, os partidos, pelo fato de a mulher não procurar ser candidata, lança nomes femininos, só que a efetividade não ocorre. O que se constata é que várias candidatas não obtiveram nenhum voto, tampouco movimentação financeira ou política, sem reunião partidária, não se colocou como candidata, portanto, uma candidatura fictícia, somente para atender os termos”, detalha o jurista.

Para melhorar esse quadro, segundo o advogado, a pessoa deve se inserir no sistema eleitoral, buscar representatividade dentro do partido, como também ser presidente de partido, secretária e outros cargos de direção. “Com isso, ela fará com que a política de inserção feminina aconteça de fato. A mulher não ficar apenas no papel, mas precisa ser efetivada, uma vez que o partido detém o poder de lançar candidatos”.

O jurista acentua que ainda no século 21, a sociedade é machista e a mulher ainda tem medo de transpor a barreira política. “A mulher sofre pressão, coerção, abuso psicológico e até sexual, como tivemos recentemente na Câmara dos Deputados, quando uma deputada no gozo do seu mandato recebeu uma importunação sexual por parte de outro parlamentar, tendo sido apalpada. Se uma mulher que detém um certo tipo de poder sofre esse tipo de abuso, imagina outra que quer chegar ao poder. Acredito que esse tipo de abuso psicológico, essa visão sexual do homem machista é uma das principais barreiras para que a mulher ocupe lugar de destaque na política brasileira”, avalia.

“Infelizmente, o quadro é esse. E somente em 2010, tivemos a primeira mulher eleita presidente do Brasil. Em outras democracias, isso mostra um movimento muito tardio, considerado um atraso, pois a verdadeira democracia não é aquela onde a mulher vota, mas onde o cidadão que é trans, o gay, as minorias ocupam lugares de destaque e de poder. Tem de ser uma democracia representativa, conforme nossa Constituição. Por enquanto, esse é um cenário puramente machista”, lamenta Magdenberg Teixeira.