Correio de Carajás

Garimpeiros são ameaça de genocídio na Terra Yanomami, diz procurador

A corrida aos garimpos na Terra Yanomani em meio a pandemia do coronavírus pode levar a um terceiro ciclo de genocídio dos povos que vivem no território indígena. A análise é do procurador de justiça de Roraima, Edson Damas, que recebeu denuncias sobre a continuidade de invasão dos garimpeiros no território.

Um estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental (Isa) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) aponta que Terra Yanomami é a mais vulnerável ao coronavírus entre as regiões indígenas da Amazônia.

A Terra Yanomami é a maior do Brasil, com mais de 9 mil hectares distribuídos entre os estados de Roraima e Amazonas, a terra abriga 26.780 indígenas. A estimativa é que cerca de 20 mil garimpeiros estejam infiltrados no território. Roraima não possui garimpos legalizados.

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Vemos que quem pode levar mesmo o vírus lá para dentro são os garimpeiros, porque saem da cidade e acabam tendo contato com os indígenas. Eles atraem os índios com comida e bebida. Se esse vírus se espalhar dentro da terra indígena, essa pandemia vai causar um genocídio lá dentro“, afirmou Damas.

Desde março, quando surgiram os primeiros casos de coronavírus em Roraima, a Fundação Nacional do Índio (Funai) limitou o acesso às comunidades indígenas a agentes do órgão e profissionais de atividades essenciais. No entanto, a medida não intimidou os garimpeiros.

De um ano pra cá, aumentou o número de ocorrências e denuncias que recebemos de lideranças indígenas e das organizações desses povos. Eles relatam que aumentou muito o fluxo de entrada destes garimpeiros, inclusive, neste momento de pandemia“, afirmou o procurador do Ministério Público de Roraima.

O coordenador do programa de Monitoramento do Isa, Antonio Oviedo, afirmou que além da invasão de garimpeiros, as falhas no sistema de Saúde e a falta de políticas públicas específicas agravam a pandemia nas comunidades e deixam os Yanomamis sob ameaça de um genocídio.

A terra Yanomami fica a 246 km de Boa Vista, onde fica o Hospital Geral de Roraima (HGR), o único do estado. Quanto mais distante dos centros urbanos uma área indígena se encontra, mais vulnerável ela é considerada pela pesquisa.

No caso de Roraima, essa vulnerabilidade também ocorre muito em função do baixo atendimento à Saúde. A disponibilidade de leitos e respiradores é muito baixa“, aponta Oviedo.

Lideranças dos povos Yanomami e ye'kwana se reúnem em encontro que debateu a presença de garimpeiros no território, em 2019 — Foto: VICTOR MORIYAMA / ISA
Lideranças dos povos Yanomami e ye’kwana se reúnem em encontro que debateu a presença de garimpeiros no território, em 2019 — Foto: VICTOR MORIYAMA / ISA

Damas acompanha a situação dos povos indígenas de Roraima há décadas e afirmou que este pode ser o terceiro genocídio sofrido pelos Yanomami.

“Em 1968, os Yanomami tiveram um surto de sarampo e se estima que quase 80% da população deles foi dizimada. No final da década 1980, veio a abertura da perimetral Norte, e o contato com não-índios ocasionou em milhares e milhares de indígenas contaminados com sarampo, varíola, febre amarela e outras doenças. Foi terrível.”

Um levantamento do Isa, mostra que 106 indígenas, de diversas etnias, já fora infectados em Roraima e quatro mortes foram registradas pelos distritos sanitários especiais indígenas (DSEI) Leste e Yanomami.

A primeiro morte de indígena causada pela Covid-19 no Brasil, foi o adolescente Yanomami, Alvanei Xirixana, que tinha apenas 15 anos. Ele vivia na região da Comunidade Xirixana, região do município de Alto Alegre, ao norte de Roraima.

Área para indígenas no hospital de campanha

Com abertura adiada há mais de dois meses, o hospital de campanha construído pela Operação Acolhida ainda não funciona, mas tem como missão desafogar o sistema público de Roraima durante a pandemia e promete ter uma área isolada para o atendimento de pacientes indígenas.

O procurador Edson Damas trabalhou na mediação de protocolos estabelecidos pelos DSEI’s Leste e Yanomami que devem ser cumpridos na unidade do Exército.

“Agentes de saúde não-índios vão precisar fazer uma quarentena na cidade e depois uma quarentena nos polos dos DSEI’s para então ter acesso e fazer contato com os indígenas”, explicou.

O hospital deve começar a funcionar com 782 leitos, que devem ser usados de acordo com a necessidade, segundo o general Luiz Eduardo Possídio.

“Nos vamos adequar a quantidade destinada à indígenas. Se houver uma procura baixa, não posso deixar leitos vazios, enquanto não-indígenas ficam esperando. Por isso, vamos trabalhar seguindo o fluxo de necessidade”, explicou o militar.

Terras indígenas em meio à pandemia

 Cerca de 27 mil indígenas vivem na Terra Indígena Yanomami — Foto: Reprodução/ Hutukara Associação Yanomami
Cerca de 27 mil indígenas vivem na Terra Indígena Yanomami — Foto: Reprodução/ Hutukara Associação Yanomami

O estudo divulgado pelo Isa e UFMG considera dados de casos e mortes divulgados pelas secretarias estaduais de saúde, dados de população indígena e faixa etária das secretarias especiais de saúde e quantidade de leitos por município informado pelo Ministério da Saúde.

Se o vírus chegar na terra indígena, temo grupos muito pequenos que podem sofrer uma perda significativa em sua população. Pode não chegar a um extermínio completo de etnias, mas ainda devem ocorrer muitas perdas, que podem chegar a 40% desse grupo“, disse Oviedo

Além de ser a mais vulnerável dentro da Amazônia, a T.I Yanomami também é a segunda mais vulnerável a Covid-19 de todo o país. Quanto mais próximo de 1, mais critica é a situação da região analisada.

Ainda de acordo com o instituto, a T.I Yanomami é habitada por povos Isolados da Serra da Estrutura, Isolados do Amajari, Isolados do Auaris-Fronteira, Isolados do Baixo Rio Cauaburis, Isolados Parawa u, Isolados Surucucu-Kataroa, Yanomami e Ye’kwana. (Fonte:G1/ Fabrício Araújo)