Correio de Carajás

Especialistas explicam leis sobre trabalho de criança e adolescente

Caso da atriz Larissa Manuela provocou debate sobre o tema

Caso da atriz Larissa Manuela provocou debate sobre o tema/Foto: Getty Images

Quando crianças e adolescentes trabalham, quem administra o dinheiro recebido? Em que situações eles podem trabalhar, conforme as leis vigentes no Brasil? Quando eles passam a administrar o próprio dinheiro e quanto lhes cabe? A Agência Brasil conversou com especialistas para responder a essas perguntas.  

Recentemente, o caso da atriz Larissa Manuela, que tinha a fortuna administrada pelos pais, trouxe essas questões à tona. Apesar de ter recebido milhões ao longo da carreira, a atriz tinha acesso apenas a uma pequena parcela do que recebia.

O coordenador da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Rodrigo Azambuja, explica que uma das atribuições do poder familiar é administrar o patrimônio dos filhos, mas ressalta que eles não são os donos desse patrimônio. Essa atribuição, segundo Azambuja, deve ser exercida sempre em benefício dos filhos.

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“A imaturidade própria da idade faz com que o legislador, para a proteção dos filhos, atribua a adultos, pais e responsáveis essa tarefa de administrar o patrimônio. Mas, isso não significa dizer que são donos dos bens dos filhos e, por isso, qualquer ato, inclusive lesivo – que a lei refere a ruína que significa desfalque, ficar em situação de insolvência, em débitos – é proibido e pode gerar suspensão do poder familiar”, diz Azambuja.

A determinação está no Código Civil, Lei 10.406/2002, que estabelece: “Se o pai ou a mãe abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha”.

De acordo com Azambuja, há “má compreensão”, de que os filhos são propriedades dos pais e responsáveis, o que é “absolutamente equivocado. Hoje, a gente entende essas crianças como sujeitos de direito, titulares de direitos e que, em razão dessa idade incompleta que gera imaturidade por estarem em desenvolvimento, que estão submetidos a esse poder/dever, que só existe para beneficiá-los e nunca em prejuízo deles”.

Trabalho no Brasil

No Brasil, pela Consolidação das Leis do Trabalho, é proibido qualquer trabalho a menores de 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. Antes dessa idade, o trabalho infantil artístico exige autorização judicial.

O advogado e especialista em Direitos da Infância e Juventude, Ariel de Castro Alves, detalha que, no pedido de autorização de trabalho infantil artístico, a criança ou adolescente, representada pelo pai e mãe ou responsável legal, deve apresentar os documentos pessoais da criança ou adolescente, dos representantes legais, o alvará de funcionamento da empresa que vai contratar a criança ou adolescente, o contrato social da empresa criada pela família para a criança ser contratada, o comprovante de conta poupança em nome da criança ou adolescente, entre outros documentos que comprovam por exemplo, matrícula e frequência escolar da criança.

A necessidade de autorização, além de prevista na própria CLT, está na Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), reconhecida pelo Brasil, em vigência desde 2002, que condiciona o trabalho artístico de crianças e adolescentes com menos de 16 anos a uma autorização judicial, por meio de alvará. Também consta do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê a competência da Vara da Infância e Juventude para autorizar a participação de crianças e adolescentes em espetáculos públicos e em seus ensaios.

“A atuação da criança ou adolescente só deveria ocorrer mediante a autorização judicial, por meio de alvará. Mas temos falhas na fiscalização do trabalho artístico infantil, que acaba sendo glamourizado e não sendo tratado como forma também de exploração do trabalho infantil em muitos casos”, diz o advogado, que foi secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Fiscalização

Ariel de Castro Alves acrescenta que muitas crianças e adolescentes que trabalham no meio artístico acabam sustentando seus pais e mães e gerando riquezas e bens para a família. “E os pais e mães, em alguns casos, acabam não tendo profissões e se tornam empresários dos filhos. E toda família acaba sendo sustentada e vivendo em função da criança ou adolescente que trabalha”, diz.

Alves explica que, pela legislação, após os 16 anos, os adolescentes passam a poder trabalhar, ter contas bancárias e ser responsáveis pelos contratos e, após 18 anos, passam a ser responsáveis autônomos pelos seus atos e contratos, sem necessidade de acompanhamento.

De acordo com ele, falta, no entanto, fiscalização por parte das varas da Infância e Juventude, promotorias, Ministério do Trabalho e dos conselhos tutelares com relação ao trabalho infantil artístico.

A fiscalização cabe também, segundo o advogado, às empresas contratantes. “As empresas também deveriam verificar essas situações de possíveis cláusulas abusivas nos contratos das crianças ou adolescentes e seus pais e encaminharem os casos para a verificação das promotorias da Infância e Juventude ou defensorias públicas”, diz.

Nos casos de litígio entre os pais e responsáveis e as crianças ou adolescentes, as defensorias e promotorias, de acordo com Alves, atuam em nome das crianças ou adolescentes nos processos. Podem ocorrer também situações de mediação de conflitos entre as partes, mediadas por esses órgãos.

(Agência Brasil)