Correio de Carajás

Distúrbios hidroeletrolítico e ácido-base II

Para o entendimento da perda de alguns componentes hidroeletrolíticos e ácido-base é preciso deixar claro que no organismo existe três grandes compartimentos hídricos, o intracelular, intravascular e extravascular.

Sendo que as reações enzimáticas ocorrem no meio intracelular. E que em circunstâncias especiais ocorre uma perda interna de água, eletrólitos e proteínas, isotônico com o plasma ou ligeiramente hipotônico para o meio extravascular (intersticial). Na forma de edema na área traumática, cirúrgica ou não, edema do peritônio e do mesentério, derrame pleural, ascite, sucos digestivos estagnados nas alças intestinais.

Tais coleções são consequências de desequilíbrios HE e AB gerando meios de cultura para patógenos e para possíveis complicações médicas as quais podem necessitar de procedimento cirúrgico no curso terapêutico. Esse quadro retrata também o “sequestro hídrico” podendo corresponder a uma perda de vários litros de água.

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A super-hidratação desenvolve-se, teoricamente, na vigência de oferta exagerada e/ ou perda insuficiente de água. Na prática, porém, o rim normal e não sujeito à ação hormonal é capaz de eliminar o excesso de oferta de água e a super-hidratação resulta sempre por perda insuficiente.

O paciente cirúrgico pode apresentar alterações do equilíbrio hidroeletrolítico (EHE) em qualquer período relacionado à intervenção cirúrgica. No período pré-operatório essas alterações podem decorrer da própria doença de base ou de problema clínico associado.

Durante a cirurgia as alterações são mais frequentes e mais intensas nas operações mais demoradas e nas de grande porte, que requerem mais atenção e maior controle pelo anestesista, sobretudo em pacientes predispostos.

No pós-operatório os distúrbios hidroeletrolíticos estão condicionados à magnitude das alterações hormonais da resposta orgânica ao trauma e ao tempo de duração da hidratação endovenosa, necessária enquanto as vias oral e enteral não forem factíveis.

Pacientes hígidos, bem hidratados, candidatos à cirurgia eletiva de pequeno porte, não necessitam, em geral, de fluidoterapia prévia. Para pacientes a serem submetidos à cirurgia eletiva de médio ou grande porte, principalmente nos que se prevê área extensa de dissecção.

A hidratação sustentada, mediante administração de água e sal nos períodos pré, intra e pós-operatórios, visa à compensação adequada das perdas externas e internas, e constitui o método de eleição para as grandes cirurgias, principalmente quando as perdas para o terceiro espaço são significativas.

As reações ao estresse cirúrgico são desencadeadas por vários componentes, tais como perda sanguínea, lesão tecidual, ansiedade e dor. A infecção e o jejum prolongado são fatores que podem contribuir para reiniciar ou agravar os eventos da resposta orgânica do organismo.

A extensão e a magnitude da resposta dependem da intensidade da patologia, da imunidade do organismo, dos procedimentos corretos e da capacitação dos profissionais. Logo podemos observar como as alterações dos componentes hidroeletrolíticos e ácido-base são essenciais e determinantes para os resultados do sucesso ou o fracasso de uma operação.

Acreditamos ser estritamente necessário o fino manejo e a condução adequada perante a presença desses distúrbios mencionados, tão recorrentes no exercício da medicina. Para que aconteça um maior entendimento desses parâmetros, já que as estimativas são que 50% dessas mortes ocasionadas por complicações inerentes podem ser evitáveis.

Essas alterações no organismo podem acarretar na amplificação do estresse cirúrgico, sendo muitas vezes negligenciado em termos de mortalidade, morbidade e custos. Todos os anos são realizadas centenas de milhões de intervenções cirúrgicas, e dependendo do país e da instituição, temos um número alarmante de complicações graves que aumentam o número de mortalidade de pacientes no pós-operatório.

* O autor é médico especialista em cirurgia geral e saúde digestiva.

Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.