Correio de Carajás

Cinco gerações dos Pompeu ligadas ao Velho Itacaiunas

Eu nasci e cresci banhando e nadando nas águas do Rio Itacaiunas. De lá peguei cauí, jacumã, pacu, piabanha e duas malárias. Toda a minha infância surgiu às margens desse rio onde também aprendi a nadar e, depois, isso me serviu de base para ser professor de natação durante uma década.

Meu pai, Francisco Pompeu, o Chico Pompeu, nasceu, cresceu e formou-se no timão de um motor Archimedes subindo e descendo o Itacaiunas. Mesmo com um olho cego, ele era capaz de identificar, com uma boa distância, as pedras que estavam pouco abaixo da lâmina d’água e que poderiam causar um estrago enorme no casco. Por mais de 40 anos, ele descia com castanha-do-pará, couro de onça, gatos do mato, entre outros produtos clandestinos.

Chico Pompeu era filho de Ulisses Pompeu, um cametaense que aqui chegou na década de 1920, constituiu família em Marabá, onde morreu em 1969. Com o sotaque meio francês, Ulisses apaixonou-se pelas riquezas naturais do Itacaiunas e de lá tirou o sustento para ele e a família – foram sete filhos.

Leia mais:

Meu pai, como muitos pilotos experimentados no Itacaiunas, tomava muita bebida alcoólica e ela o encorajava a viajar, inclusive, durante a noite, atravessava cachoeiras como o Deus-me-livre, as 366 ilhas da Caranha, Surubim e ia aquietar-se na Comasa, onde o Itacaiunas recebe as águas do Tapirapé.

A viagem de paco-paco, tipo de embarcação da minha infância, demorava uma semana rio acima e o meu desejo era que nunca terminasse porque achava bom dormir numa rede em casas rústicas no beiradão, protegido apenas por um mosquiteiro, pescar o almoço com a certeza que o rio não iria nos deixar com fome. Sim, do Itacaiunas vinha todo o nosso sustento.

Na década de 1970, quando navegávamos, eu enxergava de um lado e outro centenas de castanheiras. Na viagem que fiz recentemente até a Cachoeira Grande, avistava uma aqui outra acolá. E nenhuma era tão grossa que aparentasse mais de 100 anos.

A viagem ficou mais especial para mim porque meu filho, Breno Pompeu, de 30 anos, me acompanhou como fotógrafo. Agora, posso afirmar que quatro gerações dos Pompeu conhecem o Itacaiunas e se apaixonaram por ele. Na estrada do rio, nós não vimos o que vi há quatro décadas, mas ainda havia beleza para ser vista e fotografada.

Tanto Breno quanto Brenda, quando tinham cinco anos de idade, estavam prontos para nadar distâncias razoáveis – até 1.000 metros. E com muito orgulho eu os levei para atravessar o Itacaiunas. Claro, numa experiência cercada de cuidados e segurança.

Maria, filha do Breno, que completou semana passada dois anos de idade, vai iniciar ainda neste mês de junho sua primeira aula de natação com o vovô. Espero que esteja preparada para a mesma aventura que eu e meus filhos tivemos, de atravessar o velho Itacaiunas aos cinco anos de idade. Sei que a mãe, Gabriela Saraiva, ficará com o coração na mão, mas isso a gente negocia, nem que eu pague um cardiologista para acompanhá-la durante o desafio.

Voltando à expedição fotográfica que fiz com Breno Rio Itacaiunas acima, ele se encantou com as aves diferenciadas, com algumas nascentes e fez questão de subir e descer as corredeiras da Cachoeira Grande por duas vezes seguidas. Na primeira, usou uma câmera fotográfica Canon 6D com uma lente 24-105m. Na segunda, preferiu subir o drone e registrar a aventura emocionante do alto.

A tecnologia chegou ao Itacaiunas. Que ele viva para sempre, não apenas no meu imaginário.

Ah, antes que alguém pergunte no meu PV, Itacaiunas não tem mais acento, assim como Bocaiuva. Dá um Google aí e vê que, no último Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, obrigatório desde 2016, o acento no “i” e “u” tônicos não existe mais quando vierem depois de ditongos nas paroxítonas. Dessa forma, vocábulos como: feiúra, baiúca, bocaiúva e o nosso Itacaiúnas não têm mais acento. E tá tudo bem!

*O autor é jornalista do Correio há 28 anos e escreve crônica às quintas-feiras. Todavia, abriu exceção nesta quarta em função do Dia Mundial do Meio Ambiente

Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.