Você deve se lembrar desse episódio da História do Brasil. Em 1889 o Marechal Deodoro da Fonseca proclamou a República e, em 1891, foi eleito presidente, tendo como vice o candidato da chapa oposicionista, Floriano Peixoto. Mas em fins de 1891, Deodoro da Fonseca renunciou ao cargo, assumindo a presidência Floriano Peixoto, que tratou logo de destituir os governadores de Estado que eram fiéis a Deodoro, causando, com essa medida, grande agitação política em todo o Brasil. Mas como essa política afetou a história de Marabá, uma cidade que nem existia ainda?
No Estado do Goiás, os seguidores de Floriano Peixoto eram liderados pelo político Leopoldo de Bulhões. Seus opositores reuniram-se em torno de um partido católico, fundado pelo cônego Inácio Xavier da Silva. Bem ao norte de Goiás (na parte que hoje forma o Estado do Tocantins) localiza-se a cidade de Tocantinópolis, então denominada Boa Vista do Tocantins. Nesta cidade, quem dominava era o “coronel” Carlos Gomes Leitão, florianista, que tinha o apoio de Leopoldo Bulhões. Mas a oposição ao coronel Leitão também era forte, reunindo-se em torno do prefeito (chamado de intendente na época) Francisco Maciel Perna.
As hostilidades entre os grupos de coronel Leitão e Maciel Perna aumentaram a partir de 1892, resultando em sérios confrontos armados. O padre dominicano Frei Gil de Vila Nova, que residia na cidade de Porto Nacional, foi chamado para intermediar a paz. Por infelicidade, no momento das negociações, um seguidor de Maciel Perna, exaltado, matou Alexandre Leitão, irmão do coronel Carlos Leitão. A situação tornou-se mais grave com lutas e mortes em toda a região.
Leia mais:Conseguindo o apoio de forças federais vindas do Maranhão, o coronel Leitão tomou o poder, em 1893. Mas grande parte da população juntou-se a Maciel Perna, que cercou a cidade e conseguiu um tratado de paz lavrado com autoridade policial. Leitão discordou, conseguiu a substituição da autoridade policial e retomou ao controle de Boa Vista. Novas lutas ocorreram em 1894, quando os opositores do coronel cercaram, então, a cidade, durante um mês; a fome obrigou finalmente o grupo de Leitão a capitular, em setembro de 1894.
Todas essas lutas ocorridas a partir de 1892 provocaram o êxodo de muitas famílias, que buscavam lugares mais calmos para viver e produzir, sem riscos de sofrer ataques de bandos armados. Essas famílias mudaram-se para cidades próximas, como Imperatriz e Grajaú, ou seguiram para regiões ainda pouco habitadas, nas margens do Rio Tocantins, ou do Araguaia. Dessa forma, surgiu Conceição do Araguaia, em 1897, e Itupiranga, fundada por Lúcio Antônio dos Santos, em 1892.
Após a capitulação, em 1894, o coronel Leitão seguiu para Belém, conseguindo apoio financeiro do governador Lauro Sodré para se fixar, com cerca de 100 companheiros, nas proximidades do Rio Itacaiunas, onde planejava instalar uma colônia agrícola.
Muitos dos seguidores do coronel Leitão já se encontravam nas proximidades do Rio Itacaiunas, onde tentaram se estabelecer no local denominado de “Quindangues”. Mas como ali muitas pessoas adoeceram com febres (provavelmente devido a malária), o grupo resolveu mudar-se para as margens do Rio Tocantins, num lugar distante 18 quilômetros da atual cidade de Marabá. Instalou-se ali o “Burgo Agrícola do Itacaiunas”, no dia 5 de agosto de 1895.
O coronel Carlos Leitão faleceu no Burgo, a 13 de abril de 1903, em situação de grande penúria. Esse fato possivelmente assinalou o fim do Burgo e a mudança dos últimos moradores para o pontal do Itacaiunas, onde maranhense Francisco Coelho já havia instalado uma espécie de mercearia, denominada “Marabá”.
Burgo agrícola é uma denominação mais usada em Portugal, para designar as povoações destinadas especialmente à agricultura. No final do século, além do Burgo Agrícola do Itacaiunas, algumas outras experiências do mesmo tipo foram feitas no Pará. Na zona bragantina, foram criados burgos agrícolas com imigrantes italianos, franceses e espanhóis, mas todos sem resultados. Mais recentemente, nos anos 70, com a abertura da rodovia Transamazônica, foram criadas as “agrovilas”, experiência muito semelhante à dos burgos agrícolas do século XIX. (Ulisses Pompeu, com informações do livro “História de Marabá”, de Maria Virgínia de Mattos)