Correio de Carajás

Lucélia: educadora BÁRBARA que virou vice-reitora

De família tradicional da Nova Marabá, a professora conquistou espaço no mercado e hoje atua como vice-reitora da Unifesspa

Lucélia Cavalcante: “Meus pais tinham o desafio de me tirar do quarto e me afastar dos livros”

A história de Lucélia Cardoso Cavalcante é daquelas que inspiram. Professora, pesquisadora e hoje vice-reitora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), sua trajetória começou com a timidez de uma menina estudiosa que, aos poucos, foi se descobrindo líder. Em meio aos desafios, que incluíram vencer barreiras sociais e com paradigmas de gênero, Lucélia se tornou uma referência na educação especial, em Marabá e região.

Nascida em Altamira, mesorregião do Sudeste paraense, Lucélia chegou a Marabá aos quatro anos de idade com a família. Filha de pedreiro e de costureira, desde pequena demonstrava uma paixão incomum pelos estudos. “Meus pais tinham o desafio de me tirar do quarto e me afastar dos livros”, relembra, com um sorriso.

DAS RAÍZES À EDUCAÇÃO

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E foi em Marabá que ela viveu toda a trajetória escolar, desde os primeiros anos até a conclusão do ensino médio. Quando chegou o momento de escolher uma profissão, o primeiro desejo foi a psicologia. Mas a proximidade com a pedagogia a levou a se inscrever no vestibular onde ingressou no curso de Pedagogia, se formou em 2003, pela Universidade Federal do Pará (UFPA), no Campus de Marabá. “O curso me conquistou desde o início. Ao contrário de muitas pessoas que entram na faculdade e percebem que não era o que queriam, comigo foi o contrário. Me apaixonei pela pedagogia e nunca mais saí da área”, conta.

O desejo de ensinar nasceu da influência de grandes professores que encontrou pelo caminho. Segundo ela, crescer com boas referências a fizeram se apaixonar pela área, o que foi decisivo para a escolha da profissão.

O DESPERTAR PARA A DOCÊNCIA

Ainda na graduação, ela conta que começou a dar aulas na educação básica como professora contratada. A experiência prática foi moldando sua postura e ajudando a superar a timidez. “Ser professora me ensinou a liderar, a tomar a frente das situações. A pedagogia me permitiu crescer nesse sentido”, reflete.

Hoje, como vice-reitora de uma universidade federal, Lucélia encara desafios diários em um ambiente predominantemente masculino. “A mulher que se posiciona, que tem ideias e propõe mudanças, ainda encontra muita resistência. Muitas vezes, é necessária a aprovação masculina para que nossas propostas sejam aceitas”, afirma.

UMA MULHER EM ESPAÇOS DE PODER

Mas ela não recua diante dessas dificuldades. “Recebi uma mensagem que me marcou muito. Diziam que os alunos me veem como alguém que começou como aluna, passou por diferentes cargos dentro da universidade e hoje ocupa a vice-reitoria. Isso os inspira a acreditar que podem chegar lá também”, disse orgulhosa.

Lucélia também luta pelo fortalecimento das políticas de ações afirmativas para mulheres dentro da universidade. Atualmente, participa de um grupo de trabalho voltado para a criação de espaços de discussão e formulação de políticas específicas para mulheres no ensino superior. Outro ponto abordado pela educadora foi a religiosidade que para ela teve um papel fundamental, durante todo o processo de sua formação. Criada em uma família de pastores evangélicos, ela acredita que a formação religiosa levou à base ética que carrega até hoje. Aqui, ela garante que aprendeu sobre respeito, integridade e justiça dentro de casa.

FÉ, ÉTICA E DIREITOS HUMANOS

Ao mesmo tempo, a convivência com diferentes visões a orientou a questionar e a desenvolver uma postura mais crítica, dando a mentalidade de enxergar incoerências, e construir um olhar mais humano, sobre a liberdade de crença, mas se atentando ao respeito e a neutralidade.

Ao longo dos anos, o trabalho de Lucélia – principalmente na educação especial – a projetou para além de Marabá. O nome da educadora se tornou referência na inclusão de pessoas com deficiência no ensino superior, rendendo convites para eventos nacionais e internacionais. “De repente, me vi palestrando para auditórios lotados, sendo convidada para assessorar órgãos federais e recebendo reconhecimento pelo meu trabalho. Foi algo que me surpreendeu”.

RECONHECIMENTO NACIONAL E INTERNACIONAL

Hoje, a menina tímida que mal falava em pública se tornou uma mulher que integra comissões importantes, como a Comissão de Direitos Humanos da Associação de Reitores e a Comissão de Acessibilidade do INEP, ajudando a formular políticas públicas para inclusão educacional.

Para ela, seu maior legado é a transformação que promove na vida dos alunos. “Recentemente, um estudante me disse que se emocionou ao me ver novamente em sala de aula, porque tinha certeza de que seria um aprendizado enriquecedor. Isso me toca profundamente”, compartilha.

Muitos de seus ex-alunos, que um dia alfabetizou, hoje estão na universidade. Outros, que passaram por seus projetos de pesquisa e extensão, se tornaram profissionais respeitados. Para ela, são sementes que foram plantadas ao longo do caminho e que deram fruto.

Como mulher que rompeu barreiras e conquistou espaços, Lucélia tem um instiga outras mulheres a fazerem o mesmo. “Não desistam. Precisamos nos unir, apoiar umas às outras e combater a cultura machista que ainda nos limita. Assim vamos reivindicar nossos direitos, e garantir que eles sejam respeitados. A luta é difícil, mas vale a pena”.

Com uma trajetória inspiradora, Lucélia continua fazendo história na educação marabaense. Uma mulher, mãe, filha e educadora que tem prazer em transformar vidas e abrir caminhos antes impensáveis.

(Milla Andrade)