O ano de 2024 acabou de chegar. E a gente está cheio de expectativas. Por aqui, eu resolvi abrir mão de uma crônica clássica para discutir com os leitores desta coluna dois assuntos que vão povoar a eleição em Marabá, em 2024, para prefeito – e também nas promessas dos candidatos a vereador.
O primeiro é a saúde. Será inevitável. Os pré-candidatos já ensaiam argumentos que vão utilizar no embate, porque sabem que os marabaenses estão querendo mais. Mais hospitais, mais médicos, mais cirurgias, mais exames de diagnósticos.
Já estou vendo as campanhas se maquiarem com maquetes em 3D de hospitais ou UPAs a serem instalados em outros núcleos da cidade, como São Félix e Cidade Nova.
Leia mais:A garantia de um direito só é plena quando eu posso acessar esse direito. A Prefeitura pode construir o hospital mais complexo da história da humanidade, com garantia de todos os serviços pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas nada disso vai me importar se eu não tiver dinheiro para pagar uma passagem de ônibus para gozar do que me é ofertado.
A gente só acessa um direito que está ao nosso alcance. A tarifa zero tem um aroma de pauta política — até um cheiro de tema politiqueiro —, quando na realidade é base de cidadania, assegurado logo ali no artigo 6º da Constituição Federal.
No ano de 2023, que acabou de acabar, aprendi que o transporte pode fundamentar uma sociedade mais justa. No ano que se avizinha, requeiro provas de que as propostas de passe livre são mais do que populismo de governos em campanha. Em 1992, com Luiza Erundina, zerar a tarifa de ônibus na maior metrópole do Brasil parecia papo de bicho-grilo. Uma barulheira que, embora proposta pela então prefeita de São Paulo, não merecia sequer ser analisada pela Câmara.
Quase 20 anos depois, 2013, o país foi atropelado pelo Movimento Passe Livre, até hoje menosprezado como devaneio juvenil pelo inescapável fato de os protestos serem protagonizados por jovens. Confundiu-se mérito por demérito. Hoje, a gente assiste empresários do ramo renascidos em defensores de um modelo estatal para um setor quebrado, que provou-se insustentável numa sociedade que viu minguar o poder de compra.
A roda dos aumentos de tarifa redundou não só na falência de um modelo, como no fim de empresas particulares contratadas para o transporte público. A pandemia acelerou uma sangria que já durava décadas. Não existe discussão sobre mobilidade que não parta dos ônibus. O modelo de transporte individual, fixado em monstrengos de tantas toneladas de ferro retorcido guiados pela imperícia de amadores (todos nós) resulta em acidentes, congestionamentos, poluição, estresse.
O transporte público nos iguala como conduzidos a destinos diversos. A cidade, o país, o estado que eu quero têm faixas exclusivas que garantam que quem opta pelo transporte democrático consiga chegar ao destino até mesmo antes daquele que procura o atalho do conforto. Um ônibus com 20 pessoas são potenciais 19 carros a menos nas ruas. Vai que, com a plenitude de um transporte público eficiente e gratuito, cria-se a tão sonhada casta dos donos de carros, capazes de pagar sem vacilo R$ 100 mil e tanto por um ideal de independência e conforto. Vai que, sem a concorrência de quem migrou pro gratuito transporte coletivo, as ruas vazias garantem espaço para os pilotos de carro pessoal acelerarem rumo aos próprios destinos. Vai que. A garantia de uma base comum não deve afetar.
o sonho do privilégio individual. Não é porque tenho plano de saúde que não vou me beneficiar do SUS. É um bem comum, um avanço mesmo para quem não precisa disso.
É um passo, definitivamente. Fico pensando nos devaneios de 1992, de 2013. Naquelas políticas tachadas de impossíveis, de utópicas, de pueris, de juvenis. A maior barreira contra um objetivo pode ser a falta de criatividade. A falta de vontade política. Que em 2024 sonhemos com sociedades que hoje parecem impossíveis.
* O autor é jornalista há 27 anos, está de férias, mas não deixa de enviar sua coluna semanal por pura paixão de escrever
Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.