Correio de Carajás

Protagonismo feminino e sustentabilidade na luta camponesa são destaques no CGBio

Fotos: Clein Ferreira

Com os avanços nas atuais discussões sobre mudanças climáticas, os métodos de produção e consumo da população têm sido, cada vez mais, levados ao centro do debate. Nesse sentido, os stands do Congresso de Gestão do Conhecimento e Sociobiodiversidade das Áreas Protegidas de Carajás (CGBio), realizado em Parauapebas, ajudam a trazer novas perspectivas pensando não apenas em preservação ambiental, mas também na inclusão de mulheres no mercado de trabalho e no processo produtivo.

O Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) e a Associação de Mulheres Produtoras de Polpas de Fruta (AMPPF) são alguns exemplos de iniciativas que conseguem alcançar essas demandas urgentes e valorizar os trabalhos de comunidades tradicionais, que respeitam os processos da natureza, indo na contramão do desmatamento e do uso de agrotóxicos.

HARMONIA COM A NATUREZA

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No stand da AMPPF, produtos de agricultura familiar, como geleias e queijos, foram expostos ao público, que podiam degustar no local. Eles foram produzidos depois que as trabalhadoras locais passaram por capacitações. Joelma Menezes, representando a AMPPF, que atua em São Félix do Xingu, explicou que a associação foi criada em 2012 e já tem 65 associadas trabalhando com produção sustentável.

A AMPPF trabalha para promover o protagonismo da mulher no campo e evidenciar o debate de gênero em uma perspectiva produtiva, social e econômica. A associação acredita que a organização constrói outras possibilidades para mulheres se tornarem independentes para transformar suas próprias vidas. Atua em comunidades de Maguary, Tancredo Neves e Nereu, assim como com famílias distribuídas num raio de até 50 km no entrono.

A AMPPF se juntou ao IMAFLORA e ajudou na capacitação de trabalhadoras do campo

“Por meio de Sistemas Agroflorestais (SAFs), nossos quintais passaram a dar frutos durante o ano todo, de diferentes tipos e sabores. Da fruta tiramos a polpa, que é processada na agroindústria e despolpamento e em seguida comercializada”, explica a representante.

“As frutas são colhidas no pé pelas mãos dos familiares. As safras reúnem pais, mães, filhos, irmãos. Somos treinadas para boas práticas de manejo de polpas de frutas, com especial atenção aos aspectos referente à higiene, saúde, manipulação de alimentos, armazenamento e congelamento e técnica produtivas agroecológicas para produção de alimentos saudáveis sem o uso de agrotóxicos.”

A associação possui uma unidade própria de beneficiamento de polpa de frutas com capacidade de produção de até 45 toneladas por mês. O foco é atender o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o mercado local de São Felix do Xingu, como supermercados e lanchonetes, e municípios vizinhos.

Lucas Faria, do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (IMAFLORA), que trabalha com sustentabilidade através da conservação da floresta, falou sobre a organização e o suporte dado às mulheres do campo.

“A gente acredita que a melhor forma de manter a floresta em pé é dando valor a ela, atribuindo produtos da cadeira produtiva”, afirmou. “Em São Félix do Xingu o IMAFLORA trabalha no programa ‘Floresta de valor’, que tem como um dos parceiros a AMPPF, que recebe o apoio da organização por meio de capacitação, consultorias e apoio à infraestrutura.”

Ainda conforme ele, hoje a AMPPF conta como uma agroindústria e também recebeu, recentemente, o selo da Agencia de Defesa Agropecuária do Pará (ADEPARÁ). O objetivo agora é conseguir mais selos e certificações para a Associação.

VALORIZAÇÃO E CONSERVAÇÃO

O MIQCB é um movimento que tem o intuito de diversificar e melhorar a renda das famílias das quebradeiras de coco babaçu – atividade tradicional em diversos estados do norte e nordeste do país –, além de organizá-las para reconhecerem seus direitos e defenderem as palmeiras de babaçu, o meio ambiente e a melhoria das condições de vida nas regiões de extrativismo. O trabalho é feito a partir de uma perspectiva que prioriza o desenvolvimento humano, solidário e sustentável.

Do coco babaçu são produzidos azeites, farinhas, sabonetes, sabões, óleos, carvão e até mesmo artesanato, que é feito com a palha da palmeira de babaçu, ou biojóias feitas do endocarpo do babaçu e de sementes variadas.

A iniciativa ajuda a valorizar e conservar o trabalho das quebradeiras de coco babaçu

O ArticulaFito – projeto conjunto entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) fundado em 2015 – tenta estruturar ranchos produtivos de povos tradicionais e agricultores familiares que têm plantas medicinais como base para produção de alimentos, cosméticos e frutoterápicos, explica Albertina Lopes, representante do projeto, que apoia com a capacitação, auxiliando em toda a cadeia produtiva.
Um dos movimentos apoiados pela AriculaFito é justamente o das quebradeiras de coco babaçu, que atua no Pará, Piauí, Tocantins e em três regiões distintas do Maranhão: Imperatriz, Baixada e Mearim.

Os produtos levados ao Congresso foram produzidos em 26 Unidades de Beneficiamento e Produção de Derivados de Babaçu espalhados pelas áreas de atuação do Movimento, gerando trabalho e renda para 562 quebradeiras do coco, além das diversas famílias que atuam em parceria direta e indireta, como explica Clenilde, uma das representantes do movimento no stand.

As trabalhadoras rurais são protagonistas dos grupos, cooperativas e associações que se organizam em torno dos empreendimentos comunitários cujo norteador é uma proposta que reconhece essa cultura local e tenta trabalhar em harmonia com o meio ambiente. Por meio dos seus saberes, elas participam de todas as etapas da cadeia produtiva – produção, beneficiamento e comercialização.

Atualmente, a iniciativa gera trabalho e renda para mais de 300 mil mulheres extrativistas. Os produtos são naturais e elaborados sem o uso de conservantes ou agrotóxicos, sem a prática de derrubada e queimada de florestas de babaçu.

O resultado, explica, é a preservação das florestas secundárias de babaçu, a geração de oportunidades de trabalho, a melhoria da qualidade da vida das quebradeiras de coco e a distribuição de benefícios comuns direta ou indiretamente envolvidas na luta pela inclusão e transformação social. (Clein Ferreira)