O Ministério Público do Pará (MPPA) ofereceu denúncia com pedido de prisão preventiva contra 10 indígenas da etnia Xicrin, localizada no município de Parauapebas. Eles são acusados de vários estupros, praticados de forma coletiva, na aldeia Djudjêkô, contra uma criança de apenas 12 anos de idade.
Os denunciados são Rop-Krore Xikrin, Kokokai Xikrin, Ira Xikrin, Bemrare Xikrin, Bep-Kameite Xikrin, Bemoro Xikrin, Kabetym Xikrin, Noé Xikrin, um menor de idade e, ainda, o cacique da aldeia, Bep Krookroti Xikrin.
O caso teria ocorrido em 29 de novembro de 2021, quando duas professoras que trabalhavam na referida comunidade fizeram denúncia ao promotor de justiça, depois de receberem o relato da criança. Elas declararam que não tinham mais condições de retornar para trabalhar na aldeia com medo do que poderia acontecer.
Leia mais:A denúncia foi registrada também na delegacia de Polícia Civil. Em depoimento, o cacique Bep Krookroti Xikrin declarou conhecer a vítima e que em sua cultura os guerreiros escolhem as mulheres mais bonitas para fazerem “fila” (termo usado para penetração coletiva), mas que não sabe quem fez a “fila” com a menina de 12 anos.
O exame de corpo de delito na garota comprovou que ela fora estuprada, assim como os depoimentos das testemunhas ouvidas no procedimento investigatório.
O vigilante da aldeia Djudjêkô, pai da garota, foi quem levou o caso à polícia. Ele relatou que sua filha, na época com 12 anos, havia sido estuprada por nove homens.
Segundo a denúncia, a menina morava na casa de um membro da aldeia Djudjêkô. Na noite do ocorrido, ela estava dormindo quando três indígenas chegaram, taparam sua boca com a mão e a levaram para uma camionete branca, onde permaneceu com quatro homens, que usavam blusa branca cobrindo o rosto, menos os olhos. A garota clamava para que fosse solta, mas não adiantou.
Segundo o relato, os indígenas estavam com cheiro de bebida alcóolica. Depois, chegaram outros homens em uma camionete preta e a levaram para o mato ali perto e ameaçaram matá-la. A camiseta de um deles caiu e a garota o reconheceu.
Eles a jogaram no chão e fizeram fila para praticar sexo com a garota, um a um. Um professor, que estaria dentro do carro, conseguiu retirar a garota do local, quando percebeu seu desespero. Ao sair do local, a menina estava fraca, tonta e muito suja. Ela foi levada de volta para a aldeia e ordenou que a menina fosse pra casa e não olhasse para trás e não contasse a ninguém o que tinha acontecido.
No dia seguinte, a criança foi levada para a casa de uma enfermeira, que providenciou transporte para que ela saísse da aldeia. A denúncia dá conta que essa prática seria comum na comunidade e que os indígenas faziam vídeo das vítimas e ficavam trocando entre si. A partir dali, a garota passou a ter dificuldades para dormir e sente medo do que possam fazer com ela em outro local.
Ao serem identificados e ouvidos na delegacia, os acusados negaram que tenham participado de estupro coletivo. Mesmo assim, depois de ouvir várias testemunhas, o MPPA ofereceu denúncia contra os nove indígenas por cometer o estupro e incentivar sua prática, enquanto o cacique da aldeia foi acusado de ter concorrido para os faltos e por exercer o comando individual ou coletivo da organização criminosa, ainda que não tenha praticado pessoalmente atos de execução.
Ao oferecer a denúncia, o MPPA destacou que os atos praticados devem ser tratados como atos mais ignóbeis possíveis, entendendo que o estupro de uma menor de tenra idade, de forma continuada, foi perpetrado, praticamente, por uma aldeia indígena inteira. “Temos um modo de vida em uma aldeia indígena que se constitui em realizar estupros de mulheres, menores, bem como a própria gravação de vídeos de tais crimes, em nítida ofensa à ordem pública e aos direitos humanos básicos das mulheres e crianças deste país. Trata-se de um modo de vida destas pessoas que compõem a referida aldeia indígena, segundo os próprios relatos do seu próprio cacique”.
O pedido de prisão contra os 10 denunciados foi feito pelo promotor de Justiça Arlindo Jorge Cabral Júnior, para garantia da ordem pública, da devida instrução processual penal e, por fim, a aplicação da lei penal.
A prisão preventiva chegou a ser decretada contra todos eles pelo Juízo singular de Parauapebas, mas o advogado de defesa dos indígenas, Robert Alisson Rodrigues Silva, recorreu e conseguiu um Habeas Corpus junto ao Tribunal de Justiça, em Belém, expedido pelo desembargador Sérgio Augusto de Andrade de Lima. “Em que pese o judicioso parecer da Procuradoria de Justiça, entendo que deve ser concedida a ordem da impetração, ante o manifesto constrangimento ilegal que os requerentes estão sendo submetidos, uma vez que, no caso, a prisão preventiva se mostra inadequada e desproporcional”, ponderou o desembargador.
Mas ele também concedeu medidas cautelares: os dez indígenas devem comparecer periodicamente em Juízo para informar seus endereços e justificar suas atividades; proibição de manter contato com a vítima e testemunhas; proibição de se ausentarem da Comarca de Parauapebas sem autorização do juízo de 1º grau.
A Reportagem recebeu informação, ainda não confirmada, de que teria ocorrido o estupro de uma professora na mesma Terra Indígena Xicrin na última semana.
VERSÃO DA DEFESA
O advogado Robert Alisson Rodrigues Silva conversou com a Reportagem e ressalvou que uma decisão do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que só permite a prisão de indígenas em situações extremas, desde que haja laudo antropológico, o que não é o caso ainda neste processo.
Ele confirma que o fato de estupro tenha ocorrido na aldeia, mas será este laudo que vai definir que tipo de sanção será aplicada aos acusados. “A Polícia Civil está incriminando nove indígenas, praticamente todos eles são da mesma classe na aldeia: professores. Isso estamos questionando no processo”, disse o advogado, que garantiu que não houve permissão do cacique para essa prática.
Segundo ele, atualmente há 1.730 indígenas em 20 aldeias na Terra Indígena Xicrin do Cateté, e que buscam uma melhor relação com os não indígenas. (Fonte: Blog do Zé Dudu)