A maior reserva indígena do Brasil, o território Yanomami, vive um cenário de crise humano-sanitária que afeta a saúde da sua população, principalmente das crianças, que sofrem com a desnutrição.
Somente no ano passado, o Ministério dos Povos Indígenas estima que ao menos 570 tenham morrido de fome, desnutrição e contaminação por mercúrio.
Além disso, em apenas uma semana, um hospital infantil de Roraima registrou 29 internações de crianças Yanomami que tiveram diversos problemas de saúde, principalmente uma desnutrição severa.
Leia mais:Mas quais são as caraterísticas e sintomas da desnutrição? Como os médicos identificam o quadro e quais são os tipos de tratamento disponíveis? Entenda abaixo.
O que é a desnutrição?
O principal sintoma da desnutrição é a perda de peso não intencional, embora isso nem sempre aconteça em todos os quadros.
Pessoas com peso saudável ou até mesmo aquelas acima do peso também podem estar desnutridas.
O serviço de saúde britânico, o NHS, explica que isso pode acontecer caso uma pessoa não receba nutrientes suficientes, como alguns tipos de vitaminas e minerais, por meio de sua dieta.
“A desnutrição é a deficiência ou excesso, de um ou mais nutrientes essenciais, podendo estar associada a hipernutrição, como na obesidade, ou a um déficit nutricional, a subnutrição“, diz Tamires Bernardes, médica da equipe de Reabilitação Intestinal do Hospital Infantil Sabará.
Os principais indicativos de um quadro de desnutrição são:
- redução no apetite;
- sensação de cansaço constante;
- fraqueza;
- incapacidade de se recuperar rapidamente de doenças, que passam a ser mais frequentes;
- ferimentos que demoram muito tempo para cicatrizar;
- dificuldade de concentração;
- um sentimento de frio constante;
- sintomas de tristeza, ansiedade ou depressão.
Bernardes diz ainda que a desnutrição pode ser:
- primária, quando é decorrente de um consumo dietético inadequado;
- secundária, quando existe alguma doença que interfere na deglutição, absorção e digestão de alimentos;
- ou provocada por uma condição patológica que aumenta o consumo energético de forma que as calorias ingeridas pelo individuo sejam insuficientes para garantir o crescimento e ou desenvolvimento do corpo.
Além disso, os quadros mais graves e agudos de desnutrição por subnutrição têm duas principais formas: o Kwashiorkor e o Marasmo.
O Kwashiorkor é um termo médico que faz referência a uma desnutrição causada principalmente pela deficiência de proteínas. Nesses casos, a médica explica que a pessoa fica com uma aparência inchada, os cabelos podem ter uma coloração avermelhada com alteração em sua textura, a pele pode ter manchas mais claras e/ou mais escurecidas.
Já o Marasmo é a perda de massa muscular e gordura. Nesses quadros, o indivíduo torna-se muito emagrecido com perda do tecido adiposo (que armazena gordura) e de massa muscular, os cabelos tornam-se fracos e quebradiços e a pele pode ficar frouxa.
“Em ambos os casos, quando existe deficiências da ingestão de proteínas e de zinco há dificuldade na cicatrização de lesões cutâneas. Usualmente a pele torna-se ressecada, com descamação, e as unhas tornam-se frágeis e quebradiças”, diz Bernardes
Quais são os sintomas em crianças?
A desnutrição é um problema de saúde grave, principalmente em crianças, porque ela as tornam muito mais vulneráveis a doenças e até mesmo à morte.
Sem um tratamento adequado, a desnutrição grave afeta todos os órgãos da criança, o que pode resultar em óbito.
Segundo o Ministério da Saúde, o quadro pode começar precocemente, até mesmo na vida intra-uterina, quando o bebê tem um um baixo peso ao nascer e cedo na infância, em decorrência da interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo e da alimentação complementar inadequada nos primeiros 2 anos de vida.
Nesse último caso, a doença é associada, muitas vezes, à privação alimentar ao longo da vida e à ocorrência de repetidos episódios de doenças infecciosas (diarreias e respiratórias).
Ainda de acordo com a pasta, outros fatores de risco para a desnutrição nesses casos incluem:
- problemas familiares relacionados ao nível socioeconômico;
- um conhecimento precário dos pais sobre os cuidados com os filhos (alimentação, higiene e cuidados de saúde em geral);
- e um vínculo fraco entre os pais e a criança.
A desnutrição em uma criança pode causar os seguintes sintomas:
- um padrão de crescimento ou ganho de peso mais lento que o esperado para a sua idade;
- mudanças no comportamento, como uma irritabilidade anormal, maior lentidão ou ansiedade;
- baixos níveis de energia e um cansaço maior que o aparente em outras crianças.
“Usualmente a criança com desnutrição tem apatia não se desenvolvendo ou interagindo como as crianças da mesma idade”, diz Bernardes, que também é médica pediatra.
Segundo a OMS, cerca de 45% das mortes de crianças menores de 5 anos estão ligadas à desnutrição. E esses quadros ocorrem principalmente em países de baixa e média renda.
Como é feito o diagnóstico?
Ainda de acordo com o Ministério da Saúde, muitos exames adotados nas rotinas dos serviços de saúde são úteis para o diagnóstico de problemas associados à desnutrição.
A Faculdade de Medicina Johns Hopkins, por exemplo, destaca os seguintes procedimentos:
- Uma análise da aparência geral, comportamento, distribuição de gordura corporal e função dos órgãos;
- Exames de urina e de sangue (indicativos de níveis de vitaminas e minerais);
- Exames de raio-X, que podem revelar problemas com o coração e os pulmões, bem como níveis de densidade óssea e distúrbios gastrointestinais comuns ao quadro de desnutrição;
- Além disso, os pacientes podem ser questionados sobre o que comeram durante um período específico.
A desnutrição, porém, pode afetar os resultados de exames complementares, dificultando a interpretação dos mesmos.
Por isso, a o Ministério da Saúde orienta que crianças com desnutrição precisam de um diagnóstico preciso, uma avaliação cuidadosa de seu estado clínico e um monitoramento rigoroso de seu progresso.
E como funciona o tratamento?
Bernardes explica que a internação hospitalar é fundamental em casos de desnutrição grave.
Nessas situações, é feita a adequação da oferta calórica. Nesse processo, a médica afirma que o aumento do aporte calorias pode levar o desenvolvimento síndrome de realimentação, condição ligada a distúrbios metabólicos que podem levar a arritmias cardíacas, alterações respiratórias e neurológicas.
“Dessa forma, é fundamental que o individuo esteja monitorizado em ambiente hospitalar para reavaliação clinica frequente e realização de exames laboratoriais”, diz.
Segundo a Johns Hopkins, em quadros graves, a nutrição intravenosa pode ser administrada a pacientes que não conseguem, que não querem comer ou que não podem absorver nutrientes ingeridos por via oral.
Fora isso, pacientes com doenças inflamatórias intestinais ou queimaduras geralmente recebem nutrientes por meio de alimentação via sonda.
Pela complexidade da condição, a médica do hospital Sabará explica que é ideal que o acompanhamento seja feito por uma equipe multidisciplinar.
“[Isso porque] ao longo da estadia hospitalar ainda é necessária a correção de hipovitaminoses e carência de outros micronutrientes, além da implantação de estratégias de estímulo emocional e sensorial da criança”, acrescenta Bernardes.
(Fonte:G1)