Um ano depois de o governo receber uma série de denúncias sobre o avanço do garimpo ilegal embaixo da linha de transmissão da hidrelétrica de Belo Monte, as ações criminosas continuam a avançar a céu aberto, colocando em risco uma das principais redes de energia do País.
A exploração ilegal se concentra nos municípios paraenses de Marabá, Parauapebas, Curionópolis e Pacajá. Com o avanço de máquinas de grande porte e a derrubada de morros em busca de ouro, o garimpo fragiliza a estabilidade do solo, podendo levar à queda de torres que sustentam a linha.
No mês passado, a concessionária que controla a rede, a Belo Monte Transmissora de Energia (BMTE), empresa que pertence à chinesa State Grid e à Eletrobrás, recorreu novamente à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para alertar sobre o problema.
Leia mais:“Informamos que durante as inspeções aéreas realizadas pela BMTE nos dias 05 e 06 de junho de 2021, constatamos novamente intensa atividade de exploração mineral e reforçamos que tais atividades vêm potencializando os fatores de risco ao empreendimento”, declarou a companhia, por meio de ofício ao qual o Estadão teve acesso.
A empresa chama a atenção para o fato de que a água usada pelos garimpeiros para “lavar” a terra em busca de ouro pode se acumular nas bases das torres, trazendo mais riscos de desestabilizar as estruturas. Com o fim das chuvas na região, alerta a empresa, as ações ilegais tendem a crescer. “Cabe destacar que o período de chuvas intensas na região do Pará chegou ao fim nas últimas semanas e, com isso, há a possibilidade da retomada, cada vez mais significativa, das atividades de extração de minério nas respectivas áreas.”
Apagões
Paralisações já ocorridas no linhão de Belo Monte, motivadas por falhas técnicas, já causaram apagões em boa parte do País, como o ocorrido em maio deste ano. Em outro episódio, em março de 2018, logo após a linha entrar em operação, uma pane provocou o desligamento da linha e causou um apagão que atingiu 13 Estados, deixando 70 milhões de pessoas sem luz. Por questões de segurança, a concessionária suspendeu as inspeções terrestres que eram feitas pelas equipes de campo na região de extração de minério.
Inaugurado em dezembro de 2017, o linhão de Belo Monte é um dos projetos mais caros e modernos do mundo na área de transmissão de energia, tendo custado R$ 5 bilhões. Seus 2.076 km de extensão saem do Pará e cruzam Tocantins, Goiás e Minas Gerais, até chegar à fronteira com São Paulo.
A ação ilegal dos garimpeiros já foi comunicada aos ministérios públicos federal e estadual, Polícia Civil, Polícia Federal e Aneel. Policiais chegaram a realizar operações na região em abril deste ano, mas os garimpeiros retornaram.
Procurada pela reportagem, a BMTE não se manifestou sobre o assunto. O Ministério de Minas e Energia declarou, por meio de nota, que “os reportes dos eventos, denunciados pelo concessionário, têm sido recepcionados e entregues aos órgãos de inteligência e segurança pública, que junto com a agência reguladora competente, tem atuado para coibir a mineração irregular, mitigando riscos às infraestruturas das torres de transmissão de energia elétrica em alta tensão”.
“Ao Ministério de Minas e Energia (MME) tem cabido o papel de subsidiar tais instituições com informações, quando demandado”, declarou a pasta. Apesar dos conhecidos apagões em diversas regiões do País decorrentes de paralisações do linhão, como aponta a reportagem, o MME afirmou que “o desligamento do bipolo Xingu-Estreito não provocaria corte de energia, já que os limites de transferência de energia entre os subsistemas utilizados na operação do SIN são definidos de modo que a perda de qualquer bipolo não provoque o corte de carga”. (André Borges, O Estado de S. Paulo)