Seis pessoas foram indiciadas por homicídio triplamente qualificado por envolvimento no assassinato de Beto Freitas. O desfecho do inquérito, conduzido pela delegada Roberta Bertoldo, da 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção a Pessoas, foi divulgado em entrevista coletiva no Palácio da Polícia, no Rio Grande do Sul. Segundo a policial, não há nenhum indício de que a motivação central do crime tenha sido racismo, mas houve contexto discriminatório.
Homem negro de 40 anos, João Alberto Freitas foi espancado até a morte no Carrefour, em Porto Alegre, no dia 19 de novembro, na véspera do Dia da Consciência Negra. O assassinato do cliente do supermercado gerou protestos em todo o país e galvanizou o movimento negro em todo o país.
Entre os indiciados pelo crime estão os seguranças terceirizados Geovane Gaspar Dutra, ex-soldado temporário da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, e Magno Braz Borges. Os dois foram detidos em flagrante pelo espancamento e pela morte por asfixia de Beto Freitas.
Leia mais:De acordo com a diretora do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), delegada Vanessa Pitrezs, a fiscal Adriana Alves Dutra, que filmou o espancamento, e outro segurança, Paulo Francisco da Silva, também foram indiciados por não prestarem ajuda à vítima. Mais dois funcionários do Carrefour tiveram sua prisão solicitada à Justiça.
Ainda segundo a delegada, os indiciados demonstraram “maneira alvitante de conduta”, intimamente ligada à condição socioeconômica da vítima, “a qual não se pode dissociar sua cor de pele”. No entanto, o racismo não foi considerado motivação para o crime. Os indiciados responderão pela asfixia de Nego Beto, o que impossibilitou socorro à vitima, e motivo torpe, relacionado ao “contexto discriminatório” em que o crime aconteceu.
– Se a cor da pele da pessoa fosse outra, provavelmente a situação (também) seria outra – afirmou a delegada Roberta Bertoldo.
Entenda o crime que chocou o país
João Alberto Silveira Freitas, homem negro, de 40 anos, foi espancado até a morte pelos seguranças de uma unidade do Carrefour em Porto Alegre em 19 de novembro, na véspera do Dia da Consciência Negra.
Detidos em flagrante, o ex-soldado temporário da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Giovane Gaspar da Silva, e o também segurança terceirizado Magno Braz Borges, que atuavam no supermercado, cumprem prisão preventiva pelo crime. Ambos foram demitidos da Vector, empresa de segurança contratada pelo Carrefour. Além deles, a fiscal Adriana Alves Dutra, que filmou o espancamento, foi presa acusada de não prestar socorro à vítima.
Ao fim de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), a Brigada Militar decidiu desligar Geovane Gaspar da Silva da corporação na semana passada. Segundo a BM, que equivale à Polícia Militar, ele cometeu transgressão disciplinar grave quando, de folga, se envolveu no espancamento e no assassinato de Beto Freitas. Gaspar tinha funções administrativas na corporação.
Após se recusar a prestar depoimento, Gaspar conversou com os investigadores da Polícia Civil no dia 27 de novembro. Em depoimento de mais de quatro horas, ele negou que tenha agido com violência por racismo e afirmou que tinha apenas intenção de imobilizar a vítima. O circuito de imagens, no entanto, mostra Geovane desferindo uma série de socos contra Freitas.
A defesa do ex-PM argumenta que não foi a ação de Gaspar que causou a morte de Beto, mas a pressão feita com o joelho nas costas da vítima pelo outro segurança. Para a defesa, Gaspar agiu por legítima defesa e deveria responder por lesão corporal.
— O meu cliente tentou apaziguar a situação. Ele agiu em legítima defesa. O João Alberto deu dois socos no Giovane. Ele deu socos porque não havia outro jeito de segurar e de conter o João Alberto — disse o defensor.
A investigação
De acordo com a delegada Roberta Bertoldo, que investigou o caso, Gaspar relatou que, na noite do crime, foi avisado pelo rádio interno da loja que era “solicitada ajuda” no caixa 25 do estabelecimento. Lá, encontrou João Alberto Freitas”olhando de uma forma um tanto braba para uma das fiscais”. A vítima, segundo o circuito de imagens, afastou-se do cliente, que lhe fez um gesto.
Gaspar, ainda de acordo com seu depoimento, teria perguntado a João Alberto Freitas se estava tudo bem, e o cliente respondeu que “estava tudo tranquilo” e saiu. No entanto, como não sabia o que havia acontecido, o policial resolveu seguir atrás.
O policial argumentou ainda que, em determinado momento, durante a agressão, percebeu que João Alberto Freitas havia perdido os sentidos, e achou que ele havia desmaiado. E também confirmou que Adriana Alves Dutra, agente de fiscalização, era a responsável por orientar os vigias, mas que não conseguiu ouvi-la durante o espancamento da vítima, devido ao barulho no local.
Durante as investigações, clientes do supermercado procuraram a Polícia Civil para contar que foram importunadas por Beto Freitas no local em dias anteriores ao homicídio.
Para averiguar os depoimentos, a delegada analisou novas imagens de vídeo das câmeras de segurança do supermercado, mas ressaltou que os relatos “não alteram absolutamente nada o fato de ter havido um homicídio”.
A diretora do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), delegada Vanessa Pitrez, já havia afirmado não haver dúvidas de que existiu a intenção de matar.
— Não há dúvidas que houve um homicídio doloso — afirmou Pitrez.
(Fonte: O Globo)