Correio de Carajás

Virtualização da justiça em Marabá traz celeridade, mas expõe precariedade

Presidente da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil em Marabá, Rodrigo Botelho defende atendimento mais humanizado à população

Rodrigo Botelho: “Além das audiências online, a pandemia trouxe outros desafios ao sistema judiciário brasileiro”

Nesta quarta-feira, dia 9 de agosto, a Câmara Municipal de Marabá vai entregar comenda para advogados que se destacaram na Comarca local, como parte da programação de homenagem ao Dia do Advogado, que transcorre na sexta-feira, 11. Para discorrer sobre os avanços recentes e os desafios da categoria, a Reportagem do CORREIO conversou com o presidente da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil em Marabá, Rodrigo Botelho, que apresentou um documento entregue à Presidência do Tribunal de Justiça do Pará, recentemente, com as principais reivindicações da categoria.

No pós-pandemia, o Fórum Juiz José Elias Monteiro Lopes, situado na Rodovia Transamazônica, bairro Amapá, no núcleo Cidade Nova, de Marabá, se deparou com um novo desafio: o de conciliar um modelo de justiça ágil, consistente, efetiva e cada vez mais virtualizada. Com corredores quase vazios, o órgão também passa, atualmente, pela necessidade de proporcionar um atendimento mais humanizado à população.

A covid-19 trouxe inúmeras mudanças para a sociedade, e o sistema judiciário brasileiro não ficou imune a essas transformações. A fim de garantir a continuidade dos processos e a celeridade das demandas, as audiências online se tornaram uma alternativa fundamental – e agora transformou-se em regra.

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Em entrevista ao CORREIO, Rodrigo Botelho, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção Marabá, expõe como as audiências virtuais têm impactado na agilidade dos processos, mas aborda outros desafios enfrentados pelo sistema judiciário escancarados durante este período.

VIRTUALIZAÇÃO

Botelho relembra que as audiências online surgiram como uma solução essencial para manter o andamento dos processos judiciais durante a pandemia e que elas tiveram um impacto positivo na celeridade dos procedimentos, principalmente na Justiça do Trabalho, onde a urgência das questões discutidas requer uma resposta ágil.

Em relação à aceitação das audiências online, Rodrigo menciona que, em geral, os juízes têm se mostrado receptivos à ideia, especialmente quando há fundamentação para a realização desse formato. No entanto, ele destaca que ainda há desafios, como a falta de acesso à internet em algumas regiões, o que pode prejudicar advogados e partes envolvidas no processo.

“Prestigiamos a celeridade, a videoconferência e os avanços tecnológicos. No entanto, é preciso prestigiar também as limitações estruturais que a comunidade do nosso município e região enfrenta”, adverte.

DESAFIOS

Além das audiências online, analisa o presidente da Subseção, a pandemia trouxe outros desafios ao sistema judiciário brasileiro. Entre eles estão a instabilidade dos sistemas, o hackeamento de dados e a repetição de tramitações. Essas questões impactaram a celeridade e o andamento dos processos, exigindo soluções eficientes para superá-las.

Diante dos desafios enfrentados durante a pandemia, a Subseção da OAB tem sido proativa na busca por soluções, tendo ido a Belém para conversar com a presidente do Tribunal de Justiça do Pará, e apresentar as dificuldades enfrentadas. Como resultado, conseguiram melhorias na estabilidade dos sistemas.

“A Ordem tem, hoje, proposições em relação ao PJE visando que a advocacia e a sociedade tenham como acompanhar o andamento processual da atividade de cada vara por meio da plataforma digital”, diz Rodrigo.

Além disso, a ordem está solicitando a criação de duas varas em Marabá, com foco em questões de família e processos da fazenda pública, buscando agilizar o andamento dessas demandas, que frequentemente causam morosidade.

“Se você for na estrutura cível do Poder Judiciário Estadual, na comarca da cidade, existe uma demanda represada de milhares de processos que ainda não conseguimos fazer andar de forma mais rápida”, lamenta, citando que houve até reuniões, mas a efetividade, de fato, ainda não aconteceu.

ENTENDA

A Subseção de Marabá apresentou um relatório ao Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), que expõe a situação atual da Comarca em relação à quantidade de casos pendentes de julgamento e à estrutura judiciária disponível.

Segundo o ofício, que a reportagem teve acesso, a cidade conta atualmente com 11 Varas e possui 40.884 casos pendentes de julgamento.

Comparando a estrutura entre Marabá e Santarém, é evidenciado que a maior cidade do oeste do Pará conta com duas varas cíveis a mais, uma Criminal e outra de Juizado de relações de Consumo. Segundo ele, essa discrepância na estrutura pode afetar diretamente a agilidade dos processos em Marabá.

Um ponto importante destacado no relatório é a necessidade de mais uma Vara de Família e outra da Fazenda Pública. Atualmente, as ações de família são distribuídas apenas entre a 1ª e 2ª Varas Cíveis, enquanto em Santarém, mesmo com um número menor de casos, essas ações são distribuídas entre a 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Varas Cíveis. A competência da 4ª Vara Cível de Marabá equivaleria à da 5ª Vara Cível de Santarém, mas, na primeira, ela trata também de matérias de fazenda pública.

Outro ponto abordado é a judicialização da saúde na Comarca de Marabá, que ocupa o segundo lugar nas estatísticas do TJPA, ficando atrás apenas da Comarca de Belém. Esse dilema reforça a necessidade de melhorias na estrutura judiciária da região para dar conta dessa demanda crescente.

O presidente Rodrigo Botelho também destaca o crescimento do orçamento municipal, o que poderia viabilizar investimentos na infraestrutura judiciária, mas as carências de espaço físico no Fórum Cível e Criminal e a falta de servidores públicos em áreas cruciais, como psicologia, assistência social, oficiais de justiça, magistratura, analistas e técnicos judiciários, tornam a rede de proteção a direitos sociais básicos lenta e burocratizada.

“Marabá tem vivido um processo de desenvolvimento acelerado e o Tribunal de Justiça precisa estar antenado com isso”, ressalta, acrescentando que outro pedido seria a implantação de uma sede do TJPA na cidade, para aproximar sociedade, OAB, Defensoria Pública, Promotorias de Justiça e entidades públicas e privadas.

Em relação à tramitação de processos originados da violência doméstica e familiar contra a mulher, a criação da 3ª Vara Criminal de Marabá, com competência exclusiva para esses casos, é elogiada pela OAB, mas é ressaltada a necessidade de aumentar a abrangência, incluindo os casos cíveis reflexos dessa violência, que continuam sob a competência de varas cíveis.

Por fim, a Ordem dos Advogados solicita o aumento da estrutura física do Fórum Cível e Criminal de Marabá, a contratação de mais servidores para atuar nas áreas críticas, e a juntada do índice de carência de varas do TJPA e da nota técnica 001/2023 da Defensoria Pública do Estado do Pará, que apresenta sugestões de melhorias no atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.

TRANSPARÊNCIA DO JUDICIÁRIO

A transparência é uma questão importante para a OAB, e Rodrigo destaca que a entidade está buscando automação do Processo Judicial Eletrônico (PJE), para permitir o acompanhamento individualizado da produtividade de cada vara. Com essas informações disponíveis, a sociedade, a advocacia e outras instituições poderão contribuir e auxiliar no aprimoramento da rapidez processual, tornando o sistema judiciário mais eficiente e responsivo.

“O período pandêmico trouxe desafios significativos para o sistema judiciário brasileiro, mas também impulsionou mudanças importantes. As audiências online se mostraram uma alternativa viável para manter a celeridade dos processos e garantir a continuidade da justiça em tempos adversos”, conclui ele. (Ulisses Pompeu e Thays Araujo)