Encarar a morte todos os dias, sem perder a fé e o otimismo, para assim, poder levar esperança mesmo diante do caos. A realidade dos profissionais de saúde do mundo inteiro mudou completamente do dia para a noite, quando se viram no olho do furacão ou como muitos dizem: no meio de uma guerra contra o coronavírus.
Diante de incertezas, é preciso administrar os sentimentos, alternando diariamente a alegria e a tristeza, o medo e a esperança. Sendo uma doença relativamente nova, traiçoeira e altamente fatal, é normal que emoções diversas acompanhem as pessoas no atual momento.
Em março de 2020, logo que surgiram os primeiros casos confirmados de covid-19 em Marabá, Tatiana Carvalho, médica intensivista – que atua desde o começo na linha de frente do combate ao coronavírus – se viu diante de uma verdadeira batalha.
Leia mais:Com o objetivo de informar a população sobre a realidade da doença, começou a postar vídeos em suas redes sociais, afim de alertar e explicar, sobre o que estava acontecendo nos ambientes hospitalares. “Eu falava sobre a doença, pedia para quem pudesse ficar em casa, que ficasse e, falava a verdade. Não podemos viver no negacionismo. As pessoas precisavam saber a situação que nós, profissionais da saúde, estávamos passando todos os dias. Recebi muitos comentários positivos nessa época, mas parece que as pessoas cansaram, não querem mais ouvir sobre isso”, lamenta.
Marabá aponta até o dia 1º de abril, 317 óbitos causados pela doença, porém, muitos casos de superação são registrados diariamente, emocionando toda a equipe de saúde que está na linha de frente. Sensibilizada, Tatiana afirma que tenta focar sempre nos casos de superação.
“A gente vê muitos casos de pessoas que vencem a doença, mas infelizmente, muitas notícias circulam nas redes sociais e acabam prejudicando um pouco. Já vi vários vídeos das pessoas falando sobre a intubação. É preciso deixar claro, o intubar é para salvar vidas, não intuba se não tiver necessidade”.
É fato que o vírus existe e está aí. A médica afirma que neste momento é preciso a união da população e enfatiza que é contra o fechamento do comércio. “Não pode haver briga entre política, economia e saúde. Quando falo ‘fica em casa’, não é proibir o dono da barraca de verdura de trabalhar. O vendedor precisa trabalhar, ele tem família pra criar. Vários países conseguiram superar a pandemia com o comércio aberto e por que aqui a solução seria fechar tudo?”, questiona, relembrando que o ‘fica em casa’ é não sair pra beber, não fazer festa e não aglomerar sem necessidade.
Segundo ela, o perfil dos infectados mudou bastante nos últimos meses no município, tendo em vista que muitos jovens têm sido internados em estado grave e estão padecendo diante do vírus.
De onde vem a força?
“De Deus. O amor do meu filho e da minha família. Algumas vezes já chorei ajoelhada, pedindo forças. Há momentos que a sensação é que a gente perdeu mesmo”, com lágrimas escorrendo pelo rosto, a médica se emociona ao falar de onde encontra resiliência.
Morando com pessoas idosas, Tatiana afirma que apesar da força, muitas vezes sentiu-se com medo e, ao chegar em casa, olhava para os familiares e pensava “será que vai você agora?”. Com a convivência diária de tantos casos de infecções graves de covid-19, é praticamente impossível não vivenciar a tristeza das perdas, seja dos amigos ou de um paciente.
“Não é fácil ver um jovem enterrar o pai às 22h e, às 9h do dia seguinte, enterrar a mãe. O que a gente tem na mão agora para mudar essa história, somos nós mesmos. É a união, empatia, compaixão e saber que está faltando leito e, que precisamos fazer a nossa parte”.
Com a equipe, Tatiana, além de recarregar suas forças, tem a missão de contribuir e motivar, para que juntos possam continuar salvando vidas. “Esses dias dancei para animá-los. A gente dá risada, parabenizo, mando mensagem. No Hospital Regional, sempre está indo um padre ou um pastor, para fazer uma oração e dar uma palavra de fé e esperança. Isso é muito importante”.
Mais do que super-heróis, os profissionais de saúde merecem respeito, consideração e carinho. Tatiana Carvalho é um exemplo claro de uma mulher, mãe e médica que luta, diariamente, para combater doenças e salvar vidas.
“Precisamos vencer um inimigo e só vamos conseguir isso se estivermos juntos. Dias melhores virão, tenho certeza disso”, finaliza.