Correio de Carajás

‘Vaca louca em Marabá’ pode baixar preço da carne

Relatório do Bradesco menciona que o governo brasileiro tenta negociar com a China embargo apenas ao Pará, liberando exportações de outros Estados

Animal com 9 anos de idade foi identificado no primeiro exame como portador do vírus da “vaca louca”/ Foto: Gustavo Magalhães/MRE

Economistas monitoram os desdobramentos do caso de “vaca louca” que está sendo anunciado no País como sendo em Marabá para avaliar os impactos sobre a inflação e o preço da carne.

Desde que o caso foi confirmado, na quinta-feira (23), as exportações de carne bovina para a China foram suspensas voluntariamente pelo Brasil, seguindo protocolo sanitário.

A China é o maior comprador de carne bovina do país. Em 2022, absorveu 53,3% do volume de embarques e 60,9% da receita consolidada, segundo a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo).

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Sem ter como escoar a produção para seu maior comprador externo, o mercado doméstico brasileiro pode vivenciar um excesso de oferta de carne bovina, o que levaria a uma queda nos preços do produto, que já não andam pressionados.

Na prévia da inflação de fevereiro, divulgada ontem, as carnes em geral (não apenas bovinas) acumulam queda de 0,70% em 12 meses, enquanto o índice cheio (IPCA-15) sobe 5,63%, e a alimentação no domicílio, 11,82%. Entre as carnes bovinas com maior peso no índice, o contrafilé acumula deflação de 0,46%, a alcatra recua 0,50% e o acém cede 3,71%.

“Temos sinais de que o lado da oferta está ajudando a inflação [o índice cheio], na função custo – a energia não está tão cara, por exemplo -, as commodities em reais estão nos níveis mais baixos dos últimos 14 meses. E temos questões pontuais também, como a ‘vaca louca’, que acaba gerando excesso de oferta de boi no país e traz um risco baixista também pela ótica da oferta”, diz Vitor Martello, economista da Parcitas Investimentos.

Com o autoembargo brasileiro, agora cabe a Pequim dar o sinal verde para a retomada dos negócios, mas não há prazo para isso. Em 2019, foram 13 dias de espera. Em 2021, mais de 100 dias.

Citando consultores, o Monitor Agro do Bradesco diz que o prazo para o fim do embargo tende a ser menor do que no último episódio.

“Vale lembrar que quanto maior o tempo de embargo, mais intensa a queda das exportações e dos preços internos do boi gordo, ainda que efeito seja temporário”, afirma a equipe do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos.

O vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento e da Indústria, Geraldo Alckmin (PSB), que tem importante interlocução com o agronegócio, disse ontem que “tudo indica” que o caso de “vaca louca” atual é “atípico”. Segundo ele, um exame para confirmar esse resultado deve ficar pronto até a próxima quarta-feira (1º).

Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Exportadores Brasileiros (AEB), um prazo para a retomada das exportações à China até abril é realista, mas ela pode ocorrer antes. Ele lembra que o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem viagem marcada para a China no fim de março. “Lula não vai querer levar um caso de ‘vaca louca’ para a viagem presidencial. Estou colocando abril, mas pode ser até antes”, afirma

Segundo Castro, nesse período, o setor pode perder US$ 500 milhões em exportações. “Mas não vamos deixar de exportar, vamos apenas adiar os embarques ou redirecionar para outros países”, pondera.

O valor estimado é bem menor do que as perdas com a paralisação de 100 dias em 2021, de cerca de US$ 1,5 bilhão, segundo Castro. Ele lembra, no entanto, que, naquela época, “o Brasil tinha acabado de falar algumas coisas não muito agradáveis sobre a China”, o que pode ter atrapalhado as negociações para liberação dos embarques.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que ocupava o Planalto naquele momento, não poupava ataques à China, por exemplo, ao chamar a covid de “vírus chinês” e insinuar que o gigante asiático teria criado o coronavírus de propósito. “Agora, a diplomacia comercial está em paz, tem uma tendência de melhorar esse prazo [de liberação]”, diz Castro.

O relatório do Bradesco menciona que o governo brasileiro tenta negociar com a China embargo apenas ao Pará, liberando exportações de outros Estados. “O Pará não é um grande produtor de carne”, observa o presidente da AEB.

Economistas ponderam que, dependendo do tempo de duração do embargo, se for curto, o preço da carne bovina pode voltar e anular qualquer ganho de curto prazo.

Se for um caso atípico, “não indica que haverá grande disseminação”, diz Fábio Romão, economista da LCA Consultores. “Foi cancelada a exportação, frigoríficos pararam o abate. Isso, em um primeiro momento, pode aumentar a oferta doméstica. Mas me parece algo de curta duração e não algo que vem para mudar de maneira drástica os preços internos pensando no ano de 2023”, afirma.

Frigoríficos brasileiros estão recorrendo a vizinhos para não ficarem parados, mostrou reportagem do Valor. A Minerva, maior exportadora de carne bovina da América do Sul, disse que atenderá à demanda da China a partir de suas três plantas no Uruguai e de sua unidade na Argentina. A Marfrig também disse que vai exportar para a China de suas seis unidades nos dois países vizinhos.

O caso de “vaca louca” foi confirmado em um animal de 9 anos – idade considerada avançada para um boi – em uma propriedade rural de Itupiranga, mas os jornais do País informam que o caso teria seria em Marabá.

Se for confirmado, será o sexto caso atípico no Brasil em mais de 25 anos de vigilância. Um caso atípico ocorre de forma espontânea em animais mais velhos, não é transmissível nem gera riscos para a saúde humana. Nesses anos de vigilância, o Brasil nunca registrou um episódio clássico de “mal da vaca louca”, que ocorre quando bovinos ingerem produtos que contêm material de origem animal (farinhas de carne e ossos, por exemplo) contaminados pela doença. (Fonte: Valor Econômico)