Correio de Carajás

Três décadas após sua morte, Palmica ainda não recebeu as honras devidas

O folclore deve ao mestre Cambraia o título de precursor do boi-bumbá em Marabá. Seu discípulo – e não menos importante Palmica – manteve a manifestação artística acesa pelas décadas de 1960 até 1990. Esses dois nomes estão guardados na memória afetiva de milhares de marabaenses que os conheceram, mas não têm um lugar mais honrado por parte do poder público.

Cambraia, em verdade, chamava-se José Euclides “Cambraia”, um homem de estatura mediana, magro, que veio do Maranhão e instalou aqui um boi-bumbá que percorria as ruas da cidade, levando alegrias para crianças e adultos no mês de junho. Várias pessoas atuavam junto com ele para que a apresentação fosse brilhante. Entre estes, o “miolo” Américo, integrante que ficava embaixo do boi e durante as apresentações caprichava nos movimentos para contagiar quem prestigiava a brincadeira.

Cambraia, que era manco de uma perna, não poderia executar essa função, mas tratava de repassar cada detalhe para o “coração” do boi que levava seu nome. No final da década de 1969, ele tornou-se evangélico, sendo batizado e, então, abandonou o folclore para sempre. A Reportagem não conseguiu apurar a data precisa de sua morte, mas amigos creem que foi no final da década de 1970.

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Porém, Palmica manteve viva a magia do boi-bumbá em Marabá. Seu verdadeiro nome era Epaminondas Cordeiro de Castro. Nasceu no Maranhão, mas ainda pequeno, aos seis anos de idade, veio para Marabá, onde foi adotado por Hilda Mutran, que tinha o principal hotel da cidade por longos anos.

Na adolescência, preenchia parte de seu tempo vendendo picolés pelas ruas da cidade, mas embora tenha crescido com os costumes das crianças marabaenses, trazia em si o espírito folclorista do maranhense.

Organizar uma escola de samba era tarefa fácil para Mestre Palmica, mas sua grande paixão era mesmo o boi-bumbá, que começou em 1964. Ele fazia de tudo pelo cobiçado boi “Tira-Fama”. Às vezes, arriscava até uma briga.

Com seu boi-bumbá, nos meses de junho, participava de apresentações em escolas, praças, residências, entre outros espaços. Em 1988, o Tira-Fama, com seu tradicional traje de gala (muito colorido enfeitado com plumas e paetês) conquistou os olhares e aplausos da plateia belenense, numa apresentação especial no festejo junino da Capital.

Em 1º de junho de 1990, Palmica recebeu autorização do poder público para transferir seu arraial do Bairro Laranjeiras, onde passou a residir, para a Praça São Félix de Valois. Mas na festa daquele ano o folclorista não assistiria a morte do “Tira-Fama”, tendo falecido em 24 de julho de 1990, com 54 anos de idade, vítima de parada cardíaca.

Abaixo, um trecho de uma das canções do extinto “Tira-Fama”:

“O Tira-fama se despede e vai embora.

Moça bonita não deve chorar.

Eu tenho pena, tenho saudade,

Eu tenho pena pois não posso te levar.

Eu tenho pena, tenho saudade,

Morena tenho pois não posso te levar”

O legado de Cambraia e Palmica ficou para as gerações seguintes do folclore marabaense, com os bois Estrela Dalva, Flor do Campo, Rei do Campo, Senador, Treme Terra e Encantos da Minha Terra.

Um aceno oficial para manter viva a memória de Cambraia e Palmica ocorreu no festejo junino de 2017, quando a Prefeitura e a Liga Cultural de Marabá escolheram o tema daquele ano como “TEMA: “CAMBRAIA E PALMICA Mestres da Cultura Tradicional Marabaense”. Ainda parece pouco para a história e o legado de ambos. Talvez fosse mais interessante denominar de “Arena Palmica ou Cambraia o espaço onde são realizadas as festas juninas no Largo da Santa Rosa, ou batizar, de forma definitiva, o evento de “Festival Palmica de Boi-bumbá”.

Os leitores poderão dar mais ideias para a homenagem aos dois personagens do nosso folclore. (Ulisses Pompeu)