Correio de Carajás

Tensão cresce e invasores não descartam confronto na Coca Cola

Invasores denunciam incêndio em barracos e ameaças por parte de segurança armada contratada pelo dono da área e preveem confronto em breve

Equipe de seguranças contratada pelo proprietário intimidou até mesmo a equipe de Imprensa do Correio de Carajás

Aos poucos, os barracos de lona e madeira estão tomando conta do espaço. Cada ocupante tem demarcado de forma improvisada o seu terreno de 8×20. Organizado, o grupo de moradores disse ter feito uma seleção de quem poderia morar naquela que pode vir ser a mais nova invasão que se transforma em bairro sem estrutura em Marabá.

Há cerca de dez dias, uma área localizada entre as margens da Estrada de Ferro Carajás e o viaduto que dá acesso ao bairro Nossa Senhora Aparecida (Coca-Cola), no Núcleo Nova Marabá, em Marabá, foi ocupada por cerca de 150 famílias. Acontece que proprietário da área é Cornélio Pereira Bitaraes contratou vigilância armada, que armou tenda no local, com viaturas por 24 horas. Já os ocupantes alegam que estão sendo ameaçados.

É o que conta, por exemplo, Maria Amélia (pode ter dado nome fictício para não ser enquadrada em processo). Segundo ela, o motivo da ocupação foi por segurança e dignidade, pois a área era dominada pela violência e falta de segurança. Disse que houve um mapeamento do terreno e que cada família ficou com uma área de 8 metros de frente por 20 de fundo. “Eu vivo na casa de minha mãe com duas filhas. O espaço lá é pequeno e acho que posso ter meu cantinho aqui”, disse ela.

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Assim como Amélia, Marcos Melo (que sorriu ao dar o nome à reportagem), diz que a área servia para acúmulo de lixo urbano, enquanto centenas de famílias necessitam de um lugar para morar. “A gente decidiu agir sozinhos, nos reunimos, e viemos para cá. Se a Justiça nos tirar, terá de encontrar outro lugar pra gente morar”, alega.

“Quem tem casa e tem como pagar, estamos dispensando”, comenta o autônomo Alisson Reis de Souza, de 24 anos, um dos organizadores da invasão (embora ele negue, outros quatro indicaram que seria ele).

Por volta de 14 horas desta quarta-feira, 7, Antônio Spíndola, um dos enviou vídeo para a Imprensa local indicando que durante a última madrugada, seguranças teriam colocado fogo em vários barracos que eles levaram dias para construir. “Agora ameaçam colocar uma cerca em volta do terreno, mas não vamos deixar, vai ter reação”, avisou ele.

A Reportagem do CORREIO foi ao local por volta de 15h30 e também foi constrangida pelos seguranças da empresa que presta serviço ao proprietário, com filmagens da equipe por parte dos homens armados e olhares ameaçadores.

 

Este aqui fez questão de filmar cada passo da equipe na área de reportagem na área

Segundo os invasores, tiros também foram ouvidos no local durante a noite passada.

Um deles, que terá a identidade preservada, explicou que estava em seu barraco, com outros dois homens, quando viu o fogo subindo em um dos abrigos. Outros dois pegaram fogo na sequência. “Aí depois ouvimos uns dez tiros. Não deu para ver quem que fez isso”.

Após o ocorrido, o clima de tensão se instalou no acampamento. À medida que aumenta o estresse entre os ocupantes e a equipe de segurança privada (contratada pelo proprietário da área) que se instalou no local, se intensificam os relatos – e a sensação – de que um confronto pode acontecer em breve.

Quem confirma esse sentimento é uma das mulheres que estavam no acampamento nesta tarde. “O que acontece é que o cara ali ficou andando ao nosso redor e nos ameaçando. E ainda falou que ‘a noite a gente pode se encontrar por aqui’. E eu não sei quem ele é”, relata.

Durante o tempo que a reportagem permaneceu no acampamento, o homem ficou por lá, mas escondido atrás de uma árvore. Ele não vestia nenhum uniforme de segurança que facilitasse sua identificação.

Receosos, os acampados temem a próxima noite. “Com essa história que ele falou aí (a ameaça) a pessoa tem que ficar de olho aberto, prestar atenção. Essa noite vai ficar mais gente aqui”, avisou um dos homens.

Apesar do receio e da ameaça, ele demonstra otimismo ao comentar sobre sua crença de que não haverá um combate físico pela área ocupada. “A gente tá aqui só pra garantir um lugar para morar”, finaliza.

Dezenas de barracos já ocupam a área de propriedade de Cornélio Pereira, que foi à Justiça

EM BUSCA DE LIMINAR

Com a ocupação, o proprietário da área, Cornélio Pereira Bitaraes, apresentou os documentos da propriedade à Delegacia de Conflitos Agrários (Deca), fazendo o pedido de retirada dos ocupantes. Na última segunda-feira, 5 de agosto, Cornélio ingressou com uma ação judicial junto à 2ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Marabá, solicitando a reintegração de posse.

Na tarde desta quarta-feira, os advogados do proprietário enviaram a seguinte nota ao CORREIO:

“Nota de Esclarecimento

A presente nota tem por objetivo esclarecer os fatos e refutar as informações inverídicas que têm fomentado a invasão de pessoas na área em questão.

Desde o dia 27 de julho de 2024, a área particular situada no bairro “Coca-Cola” foi ilegalmente ocupada por invasores, motivados pela divulgação de informações falsas.

Tal situação gerou um conflito urbano de terra, mobilizando a comunidade local e as forças de segurança pública. Ao chegarem ao local, as autoridades apresentaram toda a documentação aos ocupantes, que espontaneamente desocuparam a terra por completo. No entanto, os invasores foram instigados a retornar à área sob argumentos e fatos mentirosos e ilegítimos, mesmo estando acompanhados de advogado.

Em 5 de agosto de 2024, os legítimos proprietários da área ajuizaram uma ação judicial visando à imediata retirada dos ocupantes. Na ação, foram apresentados os registros gerais dos imóveis, que comprovam inequivocamente a propriedade da área invadida, bem como um relatório detalhado indicando que os bens estão devidamente disponíveis aos proprietários. Adicionalmente, foi anexada aos autos a decisão da Justiça do Trabalho que comprova que os bens não estão indisponíveis ou embargados em virtude de débitos trabalhistas, contrariando o que foi divulgado em mídias sociais.

É importante destacar que a ocupação é ilegal, configurando violação do direito de posse dos legítimos proprietários do terreno, o que constitui crime de esbulho possessório, além de outros crimes que estão sendo investigados pelas autoridades competentes.

No que se refere à empresa de segurança contratada, trata-se de uma empresa devidamente legalizada, cuja finalidade é a proteção de patrimônio. Atualmente, a referida empresa está exercendo sua atividade fim, protegendo as áreas que não foram invadidas pela população.

Reiteramos nosso compromisso com a verdade e a legalidade, e estamos tomando todas as medidas cabíveis para resolver a situação de forma justa e dentro dos parâmetros legais”.

(Ulisses Pompeu)