Entre os anos 80 e 90, as expectativas de um futuro promissor para jovens humildes de Marabá eram escassas, os tempos eram difíceis, o horizonte não era inspirador. Diante desse cenário, muitos jovens que almejavam um pouco mais do que se tornarem funcionários públicos ou empregados do comércio local se arriscavam para além dos limites da cidade, estavam dispostos a pagar o preço de abandonar esse torrão. Mas o sentimento de pertencimento a esta terra nunca abandonou aqueles que a deixaram pelas circunstâncias da vida, porém o desejo de voltar sempre foi ente constituinte de sua perspectiva.
Pode-se dizer que essa é a história do hoje advogado Antonio Lopes Filho, um marabaense de nascimento, que tem o umbigo enterrado neste solo e que passou 15 anos Brasil a dentro, onde constituiu família, fez amizades, trabalhou, estudou, viveu… Mas o sentimento de pertencer a este recorte geográfico encravado entre os rios Itacaiúnas e Tocantins sempre norteou sua personalidade.
Hoje ele anda pelas ruas da feirinha da Folha 28 – onde foi criado – com um olhar diferente, um olhar mais atento, mais experiente. Afinal ele não é mais aquele jovem de 20 anos que saiu daqui em busca de um sonho, muito menos aquele menino de 12 que jogava bola de pés descalços na rua de chão batido. Já passou dos 40 e sabe que pode contribuir, de alguma forma e à sua maneira, para tornar essa cidade um lugar melhor para jovens que, como ele, estão cheios de incertezas.
Leia mais:Criminalista conceituado em Marabá, ele lembra com nostalgia o ano de 1995, quando foi aprovado no concurso para Sargento do Exército e foi embora para o Rio de Janeiro, onde chegou no dia 5 de janeiro de 1996 e estudou na Escola de Instrução Especializada, formando-se em Sargento de Material Bélico.
Ao concluir o curso, foi lotado na unidade do Exército de Praia Grande, no litoral paulista, onde constituiu família e depois rumou para Boa Vista, em Roraima, sempre a serviço das Forças Armadas. Lá, ao pé do monte Roraima, iniciou o curso de Direito na “inesquecível” UFRR – Universidade Federal de Roraima.
Mais uma vez a mando do Exército, foi transferido para Dourados, no Mato Grosso do Sul, onde tomou a corajosa decisão de se despedir da carreira militar e voltar a Roraima para montar um escritório de advocacia com dois colegas da faculdade. A decisão foi difícil, pois ele já era pai de duas filhas e tinha muitas responsabilidades, mas o Direito já era sua paixão, assim como sua terra natal.
A DIALÉTICA DA TRAGÉDIA
Nesse vai-e-vem, rompendo limites regionais, Antônio Lopes sempre passava ao largo de Marabá, mas algo lhe dizia que um dia iria voltar à terra de “Chico Coelho”. Ele só não sabia que esse retorno seria movido por uma tragédia. No ano de 2010, sua irmã mais nova faleceu subitamente.
Ele veio para participar dos funerais, mas não encontrou só dor e tristeza. Uma beleza colateral brotou diante dos seus olhos naquele momento; ficou encantado com a Marabá que reencontrou. Os signos produzidos pelas velhas ruas da infância dialogavam com as novas facetas da cidade. A viagem lhe permitiu um reencontro consigo mesmo; era claramente um chamado à volta para sua terra natal. Os amigos de infância e adolescência pediram, em nome da cidade, que ele voltasse.
Antônio pegou o voo de volta a Roraima tão tocado pelo desejo de voltar a sua cidade que, no mesmo dia em que regressou a Roraima, seus sócios perceberam que havia algo diferente no seu olhar, na sua voz; o corpo denunciava o desejo do coração. “No primeiro dia depois que eu retornei, eles me perguntam se tinha acontecido algo, falei que não era nada, mas à tarde vieram conversar comigo e foi quando eu falei que estava com vontade de voltar. Aí foi engraçado porque eu disse que fiquei balançado e ia cair de cabeça. Eles me deram um abraço forte e me apoiaram”, relembra com os olhos marejados.
“Eu sou daqui; eu pertenço a esse lugar”, reafirma Antônio, acrescentando que, antes de ser advogado, ele é o filho da dona Dora, uma das feirantes mais tradicionais da Folha 28. Hoje ele é chamado, em vários ambientes formais, de “Doutor Antônio”, mas quem é de Marabá e vive o cotidiano desta cidade pode chama-lo pelo apelido de infância: “Cupu”. (Chagas Filho)