📅 Publicado em 10/10/2025 11h09✏️ Atualizado em 10/10/2025 11h15
É Círio outra vez, e Marabá se prepara para viver, de novo, todos os momentos de fé que embalam o coração dos devotos. Aguardado por muitos, o Círio Fluvial transforma as águas do Tocantins em um verdadeiro mar de devoção.
Entre dezenas de embarcações coloridas, enfeitadas com flores, bandeiras e fitas, um barco em especial carregará a emoção de uma família inteira.
Pela primeira vez, Félix Duarte Saraiva, pai, e Félix Spartacus de Souza Saraiva, filho, terão a honra de conduzir a imagem de Nossa Senhora de Nazaré durante o Círio Fluvial, realizado no sábado, dia 18. O gesto une tradição e fé, na transladação que parte do Porto das Mangueiras, por volta das 15h, na Nova Marabá, e segue sob o majestoso Rio Tocantins, abençoando os devotos até a rampa da Colônia Z-30, na Marabá Pioneira.
Leia mais:
UM LEGADO SOBRE AS ÁGUAS
Em entrevista emocionante, o ferroviário aposentado de 67 anos e o filho de 37 celebram juntos a felicidade de participar de um momento especial para toda a família.
O genitor compartilha sua longa ligação com os rios da região e com as embarcações, uma paixão que atravessa gerações e chega agora a este momento único, em que fé e a história se cruzam no balanço das ondas. “A paixão veio do meu bisavô, ele era piloto. Meu pai também, assim como meus tios e parentes da minha mãe”, conta Félix.
Pensativo, ele relembra o tempo em que, antes mesmo das rodovias, o pai e os tios faziam longas viagens pelas embarcações, de Belém a Conceição do Araguaia e ao Porto Nacional. “Os rios Tocantins e o Araguaia sempre foram o nosso habitat”, recorda.
Félix destaca que a paixão por barcos não nasceu por acaso, ela está enraizada na memória de seus ancestrais, especialmente do bisavô, que era piloto de batelona (embarcação usada para transportar castanha-do-Pará até Belém).

O BARCO COMO CASA
Em 1992, o barqueiro realizou o sonho de ter sua própria embarcação para lazer, já que não havia mais demanda como piloto. Desde então, o barco passou a ser a “casa” da família nos momentos de celebração.
Este ano, o sonho ganha novo significado: conduzir a Imagem Peregrina sob essa conquista. “O sentimento é de gratidão. Todo ano participamos, e agora conduziremos a Santa. Para mim, é um legado de vida”, comemora.
Animado, Félix não esconde a alegria, um presente recebido não só por ele, mas por toda a família. O sentimento é de gratidão e amor por “Nazinha”, que, em meio a travessias desafiadoras, sempre esteve presente. “Nunca tivemos uma situação de risco, graças a Deus e à Nossa Senhora. Em uma última viagem, tivemos um pequeno problema, mas foi resolvido. Entendemos que foi ela”, garante.
Para o pai de seis filhos e avô de três netos, a experiência vai além da religiosidade, representa a união entre fé e família. “É um legado que vai ficar. Já estamos projetando que, depois dessa, teremos um ciclo, e novos barcos da família também terão a chance de conduzir a imagem. É algo que vai atravessar as gerações”, afirma o aposentado.
A FÉ QUE ATRAVESSA GERAÇÕES
Como o pai, Félix Spartacus expressa sua fé e admiração por Nossa Senhora de Nazaré, presente na vida da família ano após ano. Ele conta que cresceu rodeado pelo cheiro da graxa dos motores, ajudando o pai a empurrar o barco para a água e compartilhando com ele as aventuras pelos rios. “Essa paixão é antiga e passada de pai para filho. Desde quando meu pai teve barco, nós estávamos envolvidos”, revela sorridente.
A paixão, de fato, atravessou gerações. Spartacus conta que o filho e os sobrinhos são igualmente apaixonados pela embarcação. “É uma satisfação muito grande. Esse é um sonho nosso há muito tempo. Assim que tivemos oportunidade, colocamos nosso nome na Associação dos Barqueiros e fomos sorteados”, conta.
Como o amor por embarcações, a devoção mariana também é uma herança familiar. “Nossa Senhora é tudo para nós. Ela é a deusa das águas, quem nos guarda e protege. Fazemos muitas viagens e já passamos alguns sufocos nos rios, mas sempre sentimos a presença dela”, completa.
O filho confidencia ainda que toda viagem começa com oração, pedindo a proteção da Rainha da Amazônia. “O barco não sai do lugar sem a bênção dela. A cada viagem, é ela quem nos guarda”, garante.
A TRAVESSIA DA EMOÇÃO
Em meio a tanta euforia, há algo maior a ser levado neste Círio: fé e gratidão. O Círio Fluvial é apenas uma das muitas manifestações religiosas das quais a família faz questão de participar.
E o senso de continuidade também move o filho. “Assim como meu pai passou para mim, eu vou passar para o meu filho e meus sobrinhos. O amor por Nossa Senhora vai seguir entre as gerações. E quem sabe, um dia, eles também terão a honra de conduzir a imagem sagrada”, projeta.
No Círio Fluvial, milhares de devotos se reúnem às margens do Tocantins para acompanhar a passagem da Mãe de Nazaré. A cada ano, a fé se renova, mas, para a família de Félix, a emoção terá um brilho único.
Quando a imagem de Nossa Senhora de Nazaré subir a bordo do barco D’Paula, de Félix, não será apenas uma tradição religiosa sendo cumprida. Será a realização de um sonho, o cumprimento de uma promessa silenciosa que atravessou gerações e agora se concretiza.
Pai e filho estarão lado a lado, conduzindo não apenas a imagem da padroeira, mas também um legado de devoção e amor pelas águas. Um ciclo que começou com o bisavô, passou pelo pai, ganhou força no filho e agora encontra eco nos netos e sobrinhos que, desde cedo, pedem: “Quero ir para o barco do vovô!”
Entre o reflexo do majestoso Tocantins e os cânticos entoados para Nossa Senhora de Nazaré, a embarcação será altar e herança, mas, acima de tudo, testemunho de que a fé, quando plantada no coração de uma família, atravessa gerações, assim como as águas do Tocantins seguem eternas em seu curso.