Não é apenas você, leitor, que está notando, mas de fato tudo está mais caro. Todos estão sentindo no bolso como a nossa remuneração mensal compra cada vez menos produtos e serviços. A consultoria financeira Tullet Prebon Brasil estimou que a perda real foi do poder de compra do salário mínimo de 1,7% em 4 anos. Mesmo o salário mínimo aumentando nominalmente, ele compra menos mercadorias do que comprava em 2018. É a primeira vez, desde o início do plano Real, que um presidente terminará seu mandato entregando um salário mínimo com um poder de compra menor do que quando entrou. Mas quais as razões que explicam esse aumento generalizado nos preços?
Por mais que seja possível listar motivos externos ao Brasil, como as paralizações nas cadeias globais de valor causadas pela pandemia, ou mesmo o conflito na Ucrânia, que pressionou os preços dos derivados de petróleo, trigo e os produtos agrícolas em geral, os principais motivos são internos. É possível apontar 3 deles.
Primeiro, a relevância de produtos e serviços com preços administrados (cujos reajustes são regulados pelo setor público) no consumo intermediário das atividades econômicas no Brasil. Segundo dados agregados pelo Laboratório de Contas Regionais da Amazônia (Lacam) da Unifesspa, mais de 1/5 de todo consumo intermediário é de mercadorias com preços administrados. Isto significa dizer que, em média, para cada 100 reais que uma empresa gasta em máquinas, insumos e matéria-prima, mais de 21 reais são gastos com produtos e serviços cujos preços são regulados pelo governo (combustíveis, energia, etc.).
Leia mais:Toda vez que o governo ou empresas controladas pelo governo (como a Petrobrás), autorizam um aumento de preços, gera um efeito em cascata até chegar no consumidor final. Um aumento no diesel, por exemplo, não impacta apenas quem anda com carro a diesel, mas a todos que consomem produtos e serviços que chegam ao consumidor por caminhão, trem ou navio.
Segundo, o nível de dolarização da economia brasileira. Quase metade do valor total da produção brasileira é de produtos cuja precificação ocorre em dólar. Trigo, soja, minério de ferro, produtos da construção civil, adubos químicos e demais insumos agrícolas, são alguns exemplos. Isto significa dizer que se o dólar subir, aumenta, direta ou indiretamente, o preço da maioria dos produtos. Aí mora um problema. Nos últimos anos, o dólar se valorizou mais no Brasil do que no resto do mundo. Uma das explicações se deve ao fato de que o Banco Central, que exerce um papel importante no controle do câmbio (relação real por dólar), tem flexibilizado bastante sua atuação. O resultado disso é um aumento do dólar no Brasil em níveis muito superiores a outros países. Para uma economia dolarizada, o aumento do dólar eleva o preço de quase tudo.
E, terceiro, o desmonte das políticas de controle e regulação de preços. Dentre elas, a mais relevante é a política de preços das refinarias da Petrobrás. Desde a sua criação, em 1953, até 2016 os preços da Petrobrás eram formulados como ocorre na maioria das empresas: preço de custo mais margem competitiva de lucro. Ou seja, os preços dos combustíveis subiam, fundamentalmente, se subissem seus custos. O principal custo das refinarias é o barril de petróleo.
No entanto, mesmo o Brasil sendo autossuficiente em petróleo, não refina o que aqui é produzido, já que ele é muito pesado. Como era (e ainda é) necessário importar petróleo para produzir combustível, este custo era precificado em dólar. Mas era o único. A partir de 2016, a Petrobrás mudou sua política de preços e passou a usar o Preço de Paridade de Importação (PPI). Basicamente, esta política passou a assumir que todos os produtos produzidos nas refinarias da empresa são importados, como se fosse produzido no México ou nos Estados Unidos e não no Brasil. Entra, agora, no cálculo do preço os custos de importação e frete (estabelecido em dólar).
Ademais, todos os custos passaram a ser estimados em dólar. O resultado foi o maior aumento dos derivados de petróleo, desde o início do plano Real. Conforme dados agregados pelo Lacam/Unifesspa, ao logo de 2021, o aumento da gasolina foi de 49,02%. Outro resultado que salta aos olhos foi a distribuição de dividendos aos acionistas da Petrobrás. Em 2021 foi a maior de todos os tempos, sendo mais de 72 bilhões de reais distribuídos, o que representa 68% do lucro líquido da empresa.
Então, por que tudo está tão caro, quem é o responsável? Se articularmos esses 3 motivos elencados acima, é possível afirmar que o principal responsável é o governo federal e suas políticas econômicas. Toda vez que um produto ou serviço cujo preço é administrado fica mais caro, gera um efeito em cascata, impactando o preço da maioria dos produtos.
E se o preço do principal insumo da economia (petróleo e seus derivados) aumenta apenas porque aumentou o dólar ou outros custos virtuais (custos de importação, fretes, etc.), não tem outro culpado a não ser o governo e sua equipe econômica. Por isto, urge a necessidade de mudança na política de preços da Petrobrás, mais parcimônia no aumento dos demais preços administrados e a reconstrução das demais políticas de regulação e controle de preços.
Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.