Correio de Carajás

Ponte rodoferroviária sobre o Rio Tocantins completa 40 anos hoje

Enquanto uma segunda ponte está em construção, pela Vale, é hora de relembrar fatos da maior obra da história de Marabá

A velha ponte sobre o Rio Tocantins está completando hoje 40 anos de inaugurada pelo governo federal

Embora plataformas da internet, como a Wikipedia, datem a inauguração da ponte rodoferroviária sobre o Rio Tocantins, em Marabá, no dia 28 de fevereiro de 1985, arquivos do jornal Correio do Tocantins, com registros detalhados e testemunhos da época, indicam que a ponte ferroviária foi inaugurada em 31 de outubro de 1984, enquanto a obra rodoviária só foi finalizada em setembro de 1985.

Essa primeira ponte rodoferroviária da região amazônica foi uma conquista essencial para o desenvolvimento logístico do Brasil, facilitando o escoamento de minérios do Projeto Carajás e impulsionando a integração entre o Norte e outras regiões do País. Com o marco dos 40 anos da inauguração ferroviária, o Correio de Carajás faz uma retrospectiva dessa trajetória em uma reportagem que examina o impacto, as memórias que o projeto ainda suscita e as principais diferenças para as duas novas pontes em construção, também sobre o Rio Tocantins e a 300 metros acima da antiga.

A comparação entre as datas registradas pelo Correio do Tocantins e aquelas mencionadas em fontes online como a Wikipedia evidencia discrepâncias que obscurecem aspectos importantes da cronologia histórica da ponte. A informação incorreta sobre a data de inauguração ignora que as obras foram realizadas em fases distintas: a inauguração da ferrovia em outubro de 1984, com presença de autoridades como o presidente João Figueiredo e o ministro César Cals, e a conclusão da ponte rodoviária somente em 1985.

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Pátio de obras da construtora Better, localizado próximo as obras, na Folha 10

À EPOCA

Imagine uma obra tão grandiosa que cada etapa foi um evento em si, atraindo até o presidente da República e ministros para celebrá-la. Assim foi a construção da ponte rodoferroviária sobre o Rio Tocantins, em Marabá. A primeira menção no jornal Correio do Tocantins veio em 1984, com a previsão da inauguração da parte ferroviária para 31 de outubro. A ferrovia, com trilhos avançando rapidamente rumo aos 890 km planejados, foi construída com precisão para transportar minérios de Carajás ao porto de Itaqui, em São Luís, no Maranhão.

O grande dia chegou em 31 de outubro de 1984, quando autoridades como o Ministro César Cals atravessaram a nova ponte ferroviária e marcaram o feito com um almoço oferecido pela Odebrecht, a construtora da época. Após essa conquista, o foco se voltou para a parte rodoviária, com previsão de conclusão para setembro de 1985.

Em fevereiro daquele ano, a Estrada de Ferro Carajás foi oficialmente inaugurada, criando uma ligação estratégica entre a Amazônia e o mercado internacional. Esse projeto consolidou a CVRD como um pilar da infraestrutura brasileira e transformou Marabá em um ponto-chave para o desenvolvimento nacional.

Em dezembro de 1982, obra avançava na parte fluvial com tecnologia diferente da atual

Nova ponte já é a maior obra da história de Marabá

Com 45% da obra concluída e previsão de término no segundo semestre de 2027, as novas pontes rodoviária e ferroviária sobre o Rio Tocantins trazem inovações que garantem mais segurança e eficiência em comparação com a antiga estrutura que está em utilização há 40 anos.

Para entender as principais diferenças entre as duas obras, Allisson Bertuol, gerente de planejamento de projetos das novas pontes, conversou com a reportagem do Correio de Carajás e trouxe uma analogia útil que compara a construção bilionária a um jogo de LEGO, onde cada peça é cuidadosamente planejada e montada para garantir a funcionalidade e a estabilidade da construção.

“Atualmente, a ponte existente é uma estrutura rodoferroviária, acomodando simultaneamente o transporte de trens e veículos. Nela, o trem passa pelo centro, enquanto os veículos utilizam as laterais. Em contraste, a nova ponte consistirá em duas estruturas independentes: uma exclusivamente para o transporte ferroviário e outra para o rodoviário, separadas por uma distância de até 90 centímetros”, narra Allisson.

A nova ponte está sendo montada dentro do rio com tecnologia que lembra brinquedos LEGO

AVANÇOS

Segundo ele, essa separação não apenas proporciona maior segurança, mas também facilita a manutenção, evitando que um modal interfira no funcionamento do outro. Tal característica é semelhante a ter um grande jogo de LEGO, onde peças diferentes podem ser manipuladas e ajustadas sem que uma impacte a outra.

Outro aspecto crucial da nova construção é o acostamento mais largo, que permitirá que veículos possam se deslocar em caso de panes, evitando a interrupção do fluxo de tráfego: “Essa funcionalidade, ausente na ponte antiga, é um exemplo claro de como a nova estrutura foi projetada com foco na segurança dos usuários”, explica.

TECNOLOGIA SUSTENTÁVEL

O engenheiro conta que a técnica de construção também evoluiu: “Enquanto a antiga ponte foi erguida com grandes blocos, a nova estrutura emprega peças pré-moldadas, que são fabricadas em um pátio antes de serem instaladas sobre os pilares”, diz, acrescentando que essa abordagem modular, comparável à montagem de peças de LEGO, permite um controle de qualidade superior, uma vez que os trabalhadores realizam a maior parte do processo em um ambiente seguro e no nível do solo.

Além disso, o uso de formas metálicas em vez de madeira reduz o desperdício de materiais, tornando a obra mais econômica e sustentável.

EMPURRE

O processo de montagem das peças também é mais eficiente: “Em vez de empurrar grandes blocos de até 400 metros, como feito na antiga ponte, a nova metodologia utiliza trechos de empurre de cerca de 50 metros, proporcionando um impacto ambiental menor e permitindo um trabalho mais ágil”, esclarece.

Engenheiro Allisson Bertuol explica às repórteres do CORREIO diferenças entre as duas pontes

Allisson também diz que a equipe atual, composta por cerca de 2.600 trabalhadores, prioriza a mão de obra local, valorizando profissionais da região, algo que não aconteceu na construção da ponte rodoferroviária. Outra preocupação louvável é a inclusão da presença significativa de mulheres em cargos técnicos.

Morte de encurralados pela PM manchou a velha ponte

Era uma terça-feira, 29 de dezembro de 1987, por volta das 18h30, quando 300 pessoas que protestavam pedindo por melhores condições de trabalho e pela manutenção da extração manual de ouro no garimpo de Serra Pelada, distrito de Curionópolis, foram encurraladas por policiais militares na ponte sobre o Rio Tocantins, em Marabá. Com fuzis e metralhadoras, os militares alvejaram a multidão. Alguns morreram no local, outros saltaram no rio, de uma altura de mais de 70 metros.

Garimpeiros fecharam acesso à ponte rodoferroviária, mas foram combatidos pela PM

Até hoje ainda não se sabe o número correto de mortos. Na época, o governo falou em dois óbitos, número que depois subiu para nove. No entanto, os trabalhadores apontam que havia mais de 90 desaparecidos.

De acordo com Paulo Roberto Ferreira, que escreveu o livro “Encurralados na Ponte”, há denúncias de que os corpos de muitos desses trabalhadores que desapareceram teriam sido colocados em alguns ônibus de uma empresa que prestava serviço para a Polícia Militar. Até hoje as famílias procuram por seus entes queridos, e ninguém foi investigado ou condenado pelos crimes.

(Thays Araujo e Ulisses Pompeu)