Correio de Carajás

Pioneiros lembram tempos prósperos e temem pelo futuro de Parauapebas

Uma terra próspera, que atraía gente de todos os rincões do Brasil em busca de dias melhores. Essas são as lembranças que estão na memória dos pioneiros de Parauapebas, mas que agora temem pelo futuro da Capital do Minério, que já enfrenta problemas sociais e soma mais 50 mil desempregados, numa população de 200 mil habitantes na véspera de a cidade completar 31 anos, o que acontece nesta sexta-feira, 10 de maio.

Os desbravadores da Terra de Chão Avermelhado, aos pés da Serra do Carajás, maior província mineral do mundo, lembram o começo do povoamento, na década de 1980, com a implantação do Projeto Carajás. Muitos pioneiros vieram para cá após terminar o trabalho na Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT), construída para atender o projeto de mineração.

Com mais um grande projeto começando na região sudeste do Pará, muitos decidiram ariscar e vieram se juntar ao acampamento que se formava, dando início ao embrião urbano de uma das cidades mais ricas do Estado. Um desses desbravadores é Raimundo Amorim, popularmente conhecido como Macarrão, que hoje preside o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria do Ferro e Metais Básicos de Carajás (Metabasa-Carajás).

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Macarrão lembra cada detalhe da criação da cidade há mais de três décadas

“Eu cheguei aqui no dia 25 de julho de 1982. Ficamos em uma fazenda que a Vale tinha acabado de adquirir, onde foi construído o núcleo urbano do Projeto Carajás, que hoje é o Bairro Cidade Nova. Eu acompanhei tudo. Da limpeza do terreno ao começo das construções das primeiras casas e abertura de ruas, que eram em ordem numérica e alfabética, como é até hoje”, recorda.

A distribuição do lotes para os trabalhadores que comprovavam ter família foi feito pela Prefeitura de Marabá, a quem pertencia o então distrito de Parauapebas. “O núcleo urbano teve como primeiro administrador o companheiro Chico Brito, que foi, podemos dizer, o primeiro prefeito de Parauapebas. Foi ele quem ficou incumbido de fazer a distribuição dos lotes. Bastava o trabalhador comprovar que tinha família e estava com a carteira assinada no projeto para receber o lote”, recorda.

De acordo com Macarrão, após receber o lote, o trabalhador tinha o prazo de 90 dias para construir seu barraco e colocar a família lá. “O objetivo era formar uma cidade com mão de obra que atendesse ao Projeto Carajás. Tanto que logo depois foi montado um núcleo móvel do Senai, para formar profissionais em cursos que eram demanda no local e eu fiz parte da primeira turma do curso de elétrica e mecânica”, lembra.

Ele tem na memória cada detalhe das etapas de implantação do projeto, conclusão e inauguração da Estrada de Ferro Carajás (EFC) e a primeira carga de minério que saiu de Carajás. Segundo Raimundo Amorim, já com a mina em funcionamento, os trabalhadores começaram a se organizar, para a criação de um sindicato que os representasse e defendesse seus direitos trabalhistas.

“Na época, os trabalhadores de extração mineral eram representados por um sindicato interestadual, com sede em Macapá, no Amapá. A distância fez os trabalhadores se organizarem para criar um sindicato local. Com isso, em novembro de 1984 criamos uma associação para representar os trabalhadores e, em 17 de setembro de 1987, recebemos finalmente a carta sindical, do então ministro do Trabalho, Almir Pazianotto. Desde aquela época estamos nessa luta pela classe. Conseguimos muitos avanços, mas hoje tememos diante do que vem acontecendo no País, após a reforma trabalhista”, lamenta.

Macarrão diz que ele, assim como muitos pioneiros, tem orgulho de fazer parte da história de implantação e crescimento de Parauapebas. “Eu formei família aqui. Minha família nasceu em 1989 e tem praticamente a idade de Parauapebas. Eu sou maranhense, mas meus filhos são todos parauapebenses”, frisa, dizendo que sente muito orgulho de viver na cidade que viu nascer e ter filhos e netos naturais da Capital Minério.

Ele recorda que a área do núcleo urbano começou a se expandir através de invasões. Como chegava muita gente em busca de trabalho, a área que foi legalizada e organizada para abrigar os funcionários do Projeto Carajás não comportava esse pessoal todo e muitos começaram a ocupar outros espaços, dando origem ao Bairro Rio Verde, depois Bairro da Paz, Liberdade e, assim, por diante.

“Nessas novas ocupações foram onde se instalaram os prostíbulos e bares. Aí começou a violência. Tanto, que o primeiro nome dado a Parauapebas era “Inferninho”, devido à violência nessas áreas. Só depois que foi o local recebeu o nome de Parauapebas”, frisa.

Emancipação, crescimento e crise econômica

om o crescimento da cidade e o volume de recurso que produzia e o pouco investimento feito pelo município matriz, que era Marabá, veio o desejo de se emancipar. Começaram os movimentos nesse sentido e, finalmente, em 1988, Parauapebas conseguiu a sua emancipação no pacote com outros municípios.

A cidade passou por uma verdadeira explosão de crescimento demográfico, ficando bem acima da média nacional. No entanto, a partir de 2015 começou a ser registrado um declínio econômico, afetado pela crise econômica que iniciou no País e também pela baixa do preço do ferro no mercado internacional.

O baque econômico, que fechou muitas empresas, praticamente parou o ramo da construção civil e levou a reboque outros setores que alimentavam e faziam girar o dinheiro na cidade, acendeu o alerta para a necessidade de a cidade pensar em outras matrizes econômicas, para não ser dependente apenas da mineração. Essa é uma preocupação latente naqueles que viram a cidade nascer e se transformar na Capital do Minério, com um orçamento maior que algumas capitais brasileira.

Francisco Nogueira Torres, o Bigode, sabe bem o que a retração econômica representou para o município. Pioneiro da cidade, ele também foi um dos primeiros a se aventurar no ramo de farmácia e lembra dos dias prósperos. Ele agora, no entanto, vive preocupado com futuro da cidade que escolheu para viver e criar seus filhos.

Francisco Nogueira, o Bigode, está preocupado com o futuro da Capital do Minério

“Eu cheguei aqui em 1983. Eu trabalhava em Tucuruí e minha esposa veio primeiro e abriu nossa farmácia na Avenida Tocantins, que na época não era nem rua. Fomos nós, ao ir ocupando a área, que abrimos as ruas. Eu mesmo abri mais de 300 metros de rua na picareta”, recorda.

Depois de um tempo, conseguiu comprar um lote na Rua do Comércio, onde está até hoje com sua farmácia. Ele diz que graças ao dinheiro que ganhou, nos tempos áureos, construiu imóveis, que hoje aluga e ajuda na renda familiar, mas não está nada tranquilo com a atual situação da cidade.

“Espero que os governantes façam alguma coisa. É uma vergonha que nós ainda não tenhamos uma saúde de qualidade e nem um curso de medicina aqui. Perdemos esse curso para a cidade de Redenção. Era para estar instalado em Parauapebas e nosso filhos, que escolhem essa área, não teriam que sair daqui, como minha filha, que está estudando em Redenção”, lamenta, dizendo que isso é reflexo da falta de políticos que lutem verdadeiramente pelo município.

Como pai, que se preocupa com o futuro do filho, Bigode espera que a cidade da promessa volte ao eixo do desenvolvimento e seja a cidade promissora e acolhedora de antes. Ele observa que Parauapebas está precisando de investimento em setores básicos, como saúde, e também em geração de emprego.

“Tem muita gente indo embora do município devido à falta de emprego. É preciso investir em outras matrizes econômicas, fomentar a indústria e estimular novos empreendimentos. Parauapebas não pode ficar só na dependência da mineração. Hoje, o comércio está praticamente parado e a situação fica cada dia mais difícil”, lamenta Bigode, que parabeniza a cidade pedindo por socorro.

“Parabéns Parauapebas, que seus governantes a tratem com o cuidado e carinho que você merece e está precisando”, clama o pioneiro. (Tina Santos – com a colaboração de Ronaldo Modesto)