📅 Publicado em 10/12/2025 10h20
O Laboratório de Análises e Interpretações de Condições de Vida (LAINC) da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), apresentou os primeiros resultados da Pesquisa de Condições Socioeconômicas e Qualidade de Vida (PCSQV), levantamento inédito, realizado entre 2024 e 2025, que traça um retrato detalhado sobre a vida da população que reside na área urbana de Marabá.
Coordenado por Dyeggo Guedes, professor do curso de Economia, o estudo busca suprir a falta de dados desagregados do IBGE sobre os subnúcleos da cidade e revela indicadores preocupantes, especialmente na área de segurança alimentar e saúde pública.
Em entrevista ao Correio de Carajás, Dyeggo avalia que o resultado da pesquisa foi positivo, apesar das dificuldades logísticas, como a realização das visitas em horário comercial, momento em que muitas pessoas estavam trabalhando. O time tinha como meta inicial visitar 1.057 domicílios e tentar coletar informações de todos, mas a equipe já previa recusas e ausências. Para tentar driblar essas intercorrências, foi adotada uma metodologia que previa até três tentativas por residência.
Leia mais:Na fase de análise de dados, o que mais chamou a atenção dos pesquisadores, segundo o coordenador, foi o relacionado à segurança alimentar.
“O município não tem esse dado. Inclusive, apesar de ter lançado um plano de segurança alimentar, mas sem informação sobre a situação da cidade”, destaca. Ele detalha que a pesquisa estima que cerca de 56% dos domicílios marabaenses estão em situação de segurança alimentar, com margem de erro de cinco pontos percentuais.
Em contrapartida, a insegurança alimentar atinge aproximadamente 43% das famílias, sendo que 12% vivem em condição grave, marcada por restrição quantitativa de alimentos e fome. Dyeggo observa que esse índice é alarmante, especialmente quando comparado à média nacional, que é quase quatro vezes menor.
E essa contradição entre um índice razoável de segurança alimentar e uma posição elevada de insegurança grave, foi o que motivou a equipe a aprofundar as análises. De acordo com o professor, os dados estão sendo cruzados com informações de renda e raça para tentar explicar por que Marabá apresenta resultados tão ruins nesse aspecto. Ele afirma que, embora a amostra não permita detalhamento estatístico confiável por núcleo urbano, ela é representativa da cidade como um todo e pode subsidiar políticas públicas locais.
No total, foram coletados dados em 488 domicílios de oito subnúcleos urbanos, o que representa quase metade do previsto inicialmente. Para Dyeggo, a amostra tem qualidade estatística. Ele explica que os dados estão sendo testados e comparados com outras bases e já apresentam convergência com informações do IBGE, como a distribuição de gênero, que indica uma população levemente maior de mulheres do que homens e a composição racial, predominantemente parda.

QUALIDADE DE VIDA
Além da alimentação, a pesquisa investigou a percepção da população sobre qualidade de vida. Problemas ambientais aparecem como os mais citados dentro dos domicílios. Cerca de 70% dos entrevistados relataram a presença de mosquitos, insetos ou roedores como principal incômodo, seguidos por fumaça e barulho do trânsito. Questões estruturais também são recorrentes, como telhados com goteiras e umidade em paredes ou pisos. Na avaliação dos serviços públicos, saúde e lazer foram os itens mais mal avaliados, enquanto alimentação, vestuário e educação receberam avaliações majoritariamente positivas, indicando uma percepção geral favorável em alguns aspectos do cotidiano.
O levantamento também produziu estimativas populacionais por subnúcleo urbano. O núcleo Cidade Nova aparece como o mais populoso, com cerca de 97 mil habitantes, seguido pela Nova Marabá, com pouco mais de 80 mil moradores. Para Dyeggo, esses números ajudam a dimensionar melhor a cidade e podem orientar gestores municipais em decisões futuras. Ele ressalta que a pesquisa atual funciona como base para estudos mais aprofundados, como a futura Pesquisa de Orçamentos Familiares, que deve ser realizada ao longo de um ano e permitirá detalhamento maior das condições de vida.
Questionado sobre a divulgação dos resultados, o coordenador explica que houve atrasos causados por dificuldades administrativas, especialmente na liberação de recursos, além da decisão de não competir com grandes eventos que ocorreram em 2025, como a COP30. Ainda assim, a expectativa é iniciar a divulgação de dados específicos em breve, com foco inicial na segurança alimentar.
“A gente quer depurar bastante essas informações”, afirma e destaca que o volume de dados coletado permitirá análises temáticas ao longo do tempo, Há expectativa de colaboração direta com o poder público de Marabá, para enfrentar os problemas identificados.
Além de fazer um diagnóstico da cidade, a pesquisa também representa um processo de aprendizado para a equipe. “Como foi a primeira, a gente percebeu que estava aprendendo com isso”, afirma Dyeggo. Ele relata que a recepção nos bairros foi diversa. Em algumas casas, a equipe foi acolhida com café e longas conversas, enquanto em outras houve resistência, sobretudo em áreas com moradores de melhor condição econômica, onde a desconfiança foi maior.
Em um dos casos, uma moradora chegou a fechar o portão e pedir que os pesquisadores não retornassem. Diante dessas situações, havia um protocolo para tentar reverter recusas, envolvendo a coordenação de campo e, em último caso, os próprios professores, embora nem sempre isso fosse possível.
