Correio de Carajás

Parauapebas: DECA leva 40 sem-terra para depor na delegacia

Devido à grande quantidade de sem-terra, foram necessários três micro-ônibus para levar todo mundo / Foto: Ronaldo Modesto

No final da tarde desta quarta-feira (22), uma equipe de policiais da Delegacia Especializada de Conflitos Agrários (DECA) foi até a fazenda Santa Clara, que fica a 56 km da sede Parauapebas, mas já está dentro do município de Marabá, com a missão de desmobilizar uma reocupação da área. Utilizando três micro-ônibus, a polícia levou 40 sem-terra para depor e assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por esbulho possessório e desobediência. Mas os sem-terra afirmam que, após realizarem o procedimento, vão voltar para o mesmíssimo local, simplesmente porque não têm para onde ir.

Os policiais cederam máscaras, luvas e também álcool em gel para os camponeses / Foto: Ronaldo Modesto

À frente da operação, o delegado Ivan Pinto da Silva, titular da DECA de Marabá, explicou que o proprietário da fazenda já procurou a especializada diversas vezes, dizendo-se vítima de esbulho possessório. Além disso, o fazendeiro tem em mãos uma decisão judicial de reintegração de posse da área, onde está dito que os sem-terra deveriam ficar a pelo menos 1.500 metros distantes da fazenda, mas o grupo desobedeceu a ordem.

Ele confirmou que iria levar todo o pessoal para lavrar o procedimento e posteriormente encaminhar ao Poder Judiciário que vai decidir a sorte de cada um deles.

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Acampamento foi desmontado nesta quarta, mas os sem-terra prometem voltar / Foto: Ronaldo Modesto

O delegado alertou ainda que não é aconselhável uma nova ocupação da área, porque isso pode ensejar um possível pedido de prisão preventiva dos sem-terra. “Não é possível no estado de democrático de direito desobedecer uma ordem judicial, transgredir a lei, sem nenhuma consequência”, observa o policial.

Ainda de acordo com o delegado Ivan Silva, o objetivo da DECA é evitar a ocorrência de conflito, pois esse tipo de disputa agrária, via de regra, acaba resultando em mortes. “A gente quer que o Estado do Pará permaneça de forma pacífica”, resume.

Amilson (ao centro) explica aos policias o motivo da desobediência judicial / Foto: Ronaldo Modesto

O que diz o fazendeiro

Ouvido pelo CORREIO, o fazendeiro Hamilton Ribeiro disse que esta já foi a quarta vez que os sem-terra entram em sua área e, por isso, ele se vê obrigado a acionar a DECA para retira-los de lá. Ainda segundo ele, as ocupações são sempre marcadas por depredação, saques e até mesmo tiros. “Já arrancaram a cerca várias vezes, matam gado, roubam mobílias da casa; tem umas 40 ocorrências (policiais); atiram na gente, já atiraram no vaqueiro”, denuncia.

Ainda segundo o fazendeiro, a última vez que os sem-terra haviam entrado lá foi em julho do ano passado e agora decidiram voltar e disseram que não vão deixar a fazenda dele. Hamilton lembra que antes os camponeses ficavam no acampamento Boa Esperança, mas saíram de lá e foram para a fazenda desobedecendo ordem judicial.

Hamilton Ribeiro, dono da fazenda: “Atiram na gente, já atiraram no vaqueiro” / Foto: Ronaldo Modesto

O lado dos sem-terra

Também procurador pela reportagem, Amilson Abreu Cardoso, presidente da Associação de Moradores do Acampamento Boa Esperança, admitiu que eles desobedeceram uma ordem judicial, mas alegou que estão desprovidos financeiramente, não têm onde plantar e, no máximo, 10 camponeses conseguiram auxílio emergencial do governo federal. “Diante disso, a gente se viu obrigado a entrar na área”, reafirma.

Ainda segundo ele, em audiência realizada no decorrer do processo o Instituto de Terras do Pará (Iterpa) reconheceu parte da fazenda como área pública, mas devido à pandemia do coronavírus o processo ficou parado.

Ele ratificou o motivo do retorno à área: “Nós estávamos sem ter onde plantar, sem ter o que comer, em estado de calamidade. Por isso decidimos vir pra cá pra plantar”, acrescentando que na área ocupada já plantaram feijão, mandioca e cinco alqueires de bananas.

Ainda segundo Amilson, no acampamento existem hoje 60 famílias. Este número chegou a ser o dobro, mas muita gente não aguentou a fome debaixo da lona preta e foi embora pra cidade em busca de trabalho. (Chagas Filho e Ronaldo Modesto)

Delegado Ivan Pinto da Silva, da DECA, comandou toda a operação policial / Foto: Ronaldo Modesto

SAIBA MAIS

A equipe responsável pela operação foi composta pelo delegado Ivan, investigadores Silas e Santos e escrivão Marcos. Eles levaram apenas os homens para depor na delegacia (em Parauapebas) e deixaram as mulheres e as crianças no acampamento, justamente para cuidar das crianças que não poderiam ficar sozinhas. Além disso, foram providenciadas luvas, máscaras e álcool em gel, além de alimentação para os sem-terra.