Correio de Carajás

Pais entrincheiram quartel em Marabá, fecham rodovia e cobram notícias dos filhos recrutas

Deu treta na caserna. Pela primeira vez na história, um quartel do Exército em Marabá ficou entrincheirado. Os “inimigos”? Os pais dos próprios recrutas, que passaram uma semana na mata, sem comunicação, e deveriam retornar para casa hoje.

No início da noite deste sábado, 22 de agosto, cerca de 50 pais de recrutas que participaram do Estágio Básico do Combatente de Selva (EBCS) 2020 – conhecido popularmente como “Operação Boina” – fecharam a rodovia BR-230, nos dois sentidos, para tentar pressionar o comando do 52º BIS (Batalhão de Infantaria de Selva) a prestar esclarecimentos precisos sobre as condições físicas e de saúde dos jovens que deveriam ter participado na manhã deste sábado de uma formatura e retorno para casa.

Os pais alegam que foram convidados pela direção do próprio 52º BIS a participarem da cerimônia de entrega da boina, dos filhos, solenidade para novos soldados que foram recrutados. No entanto, afirmam que o evento foi cancelado e não ficaram sem notícias dos filhos.

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A tensão na porta do quartel foi grande, principalmente à noite, após o fechamento da rodovia BR-230.

A reportagem do Portal Correio de Carajás esteve no local pela manhã e à noite conversando com os pais. Todos que foram ouvidos enfatizaram que as informações estão desencontradas, mas que teriam dito a eles, que havia sumido um material durante o curso, provavelmente uma arma, e que apenas retornariam quando o objeto aparecesse. 

José Gomes da Costa é pai de José Ilton e disse que não foram avisados do cancelamento do evento e estava muito preocupado e sem informações sobre o filho.    

Já João Alves e Selma Teixeira se deslocaram de Parauapebas, onde residem, para entrega da boina ao filho Tainan da Silva, que ingressou no Exército em fevereiro deste ano. Eles estavam desde às 10 horas em busca de notícias do rapaz. “Ninguém sabe qual a notícia verdadeira, estávamos querendo ver nosso filho”, disse a mãe.  

Jaqueline Lima é irmã de Jurandir Lisboa. Ela contou à Reportagem do CORREIO que está muito preocupada sem saber notícias do irmão, mas, que seguiria no local em busca de informações.  

No início da tarde, a reportagem procurou, na caserna, alguém que se posicionasse sobre o assunto, mas foi informada que não havia nenhum oficial, no momento, para falar sobre o caso.   

A fila de veículos era enorme em frente, irritando condutores, que estavam sem entender o motivo do bloqueio.

No início da noite de hoje, retornamos ao quartel, com a informação de que os pais resolveram radicalizar para pressionar o Exército e fecharam a rodovia. Chegamos ao local por volta de 19h30 e já havia uma fila de mais de dois quilômetros nos dois sentidos da BR-230, com ponto central em frente o quartel. A PRF já estava no local para acompanhar a questão e um grupo de militares do EB tentava acalmar os ânimos dos pais dos recrutas.

Por fim, decidiram que dois representantes entrariam para conversar com o comando. Enquanto isso, liberariam o trânsito na rodovia, retirando seus veículos, mas alertaram que voltariam a fechar se as informações não os convencessem.

Dilma Santos de Sena, mãe de um dos recrutas, residente no Bairro Jardim União, disse agora à noite à Reportagem do CORREIO que recebeu uma ligação do quartel na tarde desta sexta-feira, informando para vir à cerimônia da boina às 10 horas deste sábado. Chegou ao local às 9h30 e a informação inicial foi que chegariam por volta de 14 horas e às 17 seriam liberados. “Mas até agora nada. Eu fiquei aqui em frente ao quartel, com fome, junto com outras mães e pais. Por isso resolvemos radicalizar”, disse ela.

Durante o dia, a espera por informações foi angustiante para os pais. Medo era que algo tivesse acontecido com os filhos.

Por volta de 19h40, uma negociação acalmou um pouco os ânimos dos pais. Dois pais foram escolhidos para entrar no quartel, ver as condições em que estavam os jovens e repassar as informações para os demais. E assim aconteceu. Mas nem todos ficaram satisfeitos. Foram para casa, mas com a desconfiança de que as coisas não estão tão esclarecidas assim.

BOATOS

Muitas informações chegaram aos pais ao longo do dia. Houve a do castigo pelo sumiço da arma de um dos oficiais; a de que um grupo de 5 recrutas teria ingerido querosene e teria passado mal, sendo levado para o Hospital da Guarnição, em Marabá; entre outras tantas, que até mesmo uma mãe chegou a ser internada no Hospital Municipal da Marabá Pioneira porque passou mal, segundo o blogueiro “Ximozão Digital” informou à Reportagem do CORREIO.

DUAS NOTAS, UMA CONFISSÃO

O comando do 52º enviou à Reportagem do CORREIO DE CARAJÁS na noite de hoje duas notas, com conteúdo um pouco parecido. A diferença é que, só na segunda, confessa que houve o sumiço de uma pistola de um militar (possivelmente oficial) e que todos os recrutas estariam envolvidos numa varredura na busca desse armamento.

Confira, abaixo, a última nota, assinada pelo comandante do 52º BIS e considerada a oficial:

“O 52º Batalhão de Infantaria de Selva (52º BIS) está conduzindo o Estágio Básico do Combatente de Selva (EBCS) 2020 para os militares do efetivo variável. O término das atividades do Estágio, inicialmente previsto para esta data, quando seria realizada solenidade de encerramento do EBCS e a

entrega da boina aos militares com a presença de seus familiares, fui suspenso tendo em vista que nem todos os objetivos da instrução dos recrutas foram atingidos.

Aliado a isto está o fato de que as Organizações Militares da 23ª Brigada de Infantaria de Selva estão envolvidas em diversas atividades, como prevenção ao COVID-19, Operação Verde Brasil 2 e a Operação Amazônia, sendo necessário dar prosseguimento às atividades de instrução durante o final de semana.

Foi verificado, ainda, durante a conferência dos materiais de emprego militar, que se encontra extraviada uma pistola pertencente ao Exército Brasileiro que estava sob tutela de militar do 52º BIS. Tão logo verificou-se a falta do armamento foram desencadeadas todas as medidas visando sua imediata recuperação.

Todos os militares participantes das atividades encontram-se apoiando no vasculhamento da área do exercício a fim de localizar o armamento, estão em bom estado de saúde e as famílias foram devidamente avisadas sobre a suspensão da formatura de encerramento do EBCS. Tão logo as buscas sejam encerradas, a tropa retornará para o aquartelamento e será liberada.

Fabrício Moreira de Bastos – tenente-coronel

Comandante do 52º Batalhão de Infantaria de Selva”

(Theíza Cristhine, Ulisses Pompeu e Josseli Carvalho)