Correio de Carajás

O chef paraense que leva os sabores amazônicos para o mundo

Conheça os segredos de Thiago Castanho, entrevistado pelo CORREIO sobre seus pratos autorais que estão fazendo maior sucesso dentro e fora do Pará

Thiago Castanho: “O cozinheiro é um atravessador de histórias quando valoriza os pequenos produtores”/ Fotos: Lufe Gomes

Thiago Castanho é um chef de cozinha apaixonado pelos ingredientes que representam a identidade da culinária paraense, a exemplo do tucupi e jambu. Sentimento esse que o faz incansável por criar pratos autorais que agradam os mais diversos paladares ao redor do mundo.

O portal Correio de Carajás entrevistou com exclusividade o chef paraense. E, ao mesmo tempo que ele concedia a entrevista, também atendia clientes em seu mais novo empreendimento: Puba, um bar que faz da mandioca a grande estrela do cardápio.

Reconhecido nacionalmente e celebrado em Belém, Thiago conta que no início não foi assim, precisou provar para o público da Capital que os ingredientes locais podem e devem ganhar o mundo e ser preparado em novas versões, além das já conhecidas receitas locais.          

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Thiago formou-se em gastronomia na cidade de Campos do Jordão (SP), estagiou em Portugal, mas foi no retorno a Belém que decidiu que faria o que mais amava: cozinhar com os sabores amazônicos em casa e ao lado da família. Com isso, fundou o Remanso do Peixe há 25 anos.     

Atualmente, Thiago está no ar como o Sabores da Floresta, programa transmitido pelo Canal Futura e GloboPlay, Fome de Medalha e Fome de Luta no Sportv.

 

CORREIO DE CARAJÁS – A gastronomia de um lugar está diretamente ligada à cultura. Como você vê o papel da culinária que pratica na preservação e divulgação da cultura do Pará e da Amazônia?

THIAGO CASTANHO – A gente tem 25 anos de restaurante em Belém. O Remanso do Peixe é uma homenagem à comida de família paraense, o Remanso do Bosque (com atividade encerrada), foi nosso segundo restaurante, que abrimos em 2011. Ele traz uma nova roupagem, mas também, bebe muito a fonte da tradição.

O Remanso do Peixe é caldeirada, moqueca, pratos para compartilhar, o Remanso do Bosque eram pratos assados. Como o meu pai veio de Santarém, lá, o costume é mais de comer o peixe assado, e a gente come mais o peixe frito. Trouxemos essa modalidade para cá.

Isso mostrou o que a gente podia fazer com a comida regional, que não é só permanecer fazendo a mesma comida do nosso dia a dia.

Quando a gente se aventura, mostra o potencial, como no projeto Puba, nosso ingrediente pode estar inserido fora do contexto regional também.

CORREIO – Quem são as principais influências na sua formação como chef?

THIAGO CASTANHO – A minha primeira influência sem dúvida foi o meu pai (Francisco), porque a gente abriu o Remanso do Peixe em família, dentro de uma casa no final da vila. Meu pai era o cozinheiro, mas antes disso ele cozinhava pra gente aos finais de semana.

Então, em algum momento aquilo que era um hobby virou um negócio. A minha infância foi também muito sortida no interior do Pará. Em Bragança, onde tive a convivência com os meus avós, em um sítio que eles produziam muitas coisas, e eu via a cozinha presente no dia a dia e nas reuniões de família todo mundo cozinhava.

Meu avô fazia uma paçoca com castanha de caju com farinha d’água, eu ajudava, então, aquilo foi me impregnando como um cozinheiro também. Mas só saquei isso quando meu pai fundou o restaurante, pensei que podia ser um negócio, que poderia ser a minha carreira.

Quando a gente viaja começa a ter conexões com outras pessoas, ao longo da jornada, e você vai mudando quem você admira.

Admiro bastante o trabalho do Rodrigo Oliveira em São Paulo. Ele colocou a cozinha nordestina de uma forma diferente, dando valor, mas também mostrando o potencial da região do Nordeste em São Paulo.

Admiro o Frederick Desseno, do Uruguai. Ele faz uma cozinha muito bruta de peixes assados a lenha, constrói o próprio forno a lenha e viaja muito com a família, pelo que eu acompanho, ele sempre tenta deixar o trabalho e a família no mesmo patamar. É uma batalha muito grande isso, você ter tempo de dedicação para os dois.

Filhote na brasa, o peixe mais preparado por Thiago Castanho em seus restaurantes/ Fotos: Lufe Gomes

 

CORREIO – Como você seleciona os ingredientes que utiliza? Trabalha diretamente com produtores locais?

THIAGO CASTANHO – Quando a gente abriu o Remando do Bosque, eu já tinha um exemplo dentro de casa, que era meu pai, onde ele comprava de micro produtores na Feira da 25, de produtores orgânicos que vendem entre sexta-feira e sábado. Cheguei a ir várias vezes para lá.

Eu aprendi que isso é uma base da cozinha, a gente não vai fazer o melhor comprando coisas só no supermercado, tem de ter uma conexão e entender que gente consegue ter uma simbiose entre o produtor e o cozinheiro, para fazer um produto que pode ser melhor, inclusive.

Eu não sou o melhor cozinheiro do mundo, então o que eu tinha que fazer era desbravar o meu território, entender onde estou pisando, e foi daí que conheci várias pessoas. Uma delas a dona Nena e, também, o Jairo da ostra. A gente vai conhecendo histórias muito bacanas que dão vontade de colocar os ingredientes dessas pessoas dentro do nosso cardápio.

E quando vê, cria uma gama de produtores. Essa é a beleza do negócio, cozinheiro é um atravessador de histórias.

CORREIO – Com a valorização da culinária amazônica, você acha que o mercado está mais receptivo a pratos com ingredientes típicos, como o tucupi e o jambu?

THIAGO CASTANHO – Isso foi mudando muito ao longo dos anos. Quando a gente começou, em 2010, ou era regional, ou era coisa internacional. Inclusive, eu recebi algumas críticas no passado que hoje não existem mais: ‘Ah se for pra comer tapioca eu vou no Ver-o-Peso. Por que eu vou sair para jantar e comer tapioca?’, cheguei a ouvir isso.

As coisas mudaram e foi mostrando para o próprio paraense que os nossos ingredientes têm o potencial de estar inserido em qualquer lugar do mundo. É resultado de um trabalho de chef, mídia e palestras para mostrar essa história.

Hoje, a comida e a música paraense estão na moda, está muito mais fácil tem um desejo maior pela nossa cultura. Há vários restaurantes em São Paulo com comida amazônica.

CORREIO – Com a realização da COP 30 no Pará, o estado será palco de um grande evento internacional. Como você avalia a importância da Conferência para a região e para a gastronomia?

THIAGO CASTANHO – A COP 30, assim como em qualquer outro grande evento para a região, é importante para fortalecer nossa identidade regional, seja bom, ou, seja ruim, falem da Amazônia para mostrar a realidade do território.

Essa é uma cidade que é uma metrópole, uma das maiores e mais pulsantes que eu conheço. Se fosse comparar com outra cidade eu citaria Salvador, por ter o mesmo potencial turístico. Aqui, a gente não tem o turismo muito expressivo, então, um evento como esse pode trazer um causar espanto: ‘caraca, que lugar massa de comer, de viver, de pegar um barquinho e ir pra outra cidade. A 200 quilômetros tem praia de mar”. Essa é uma Amazônia que quebra estereótipos.

CORREIO – Qual prato você mais gosta de preparar e por quê?

THIAGO CASTANHO – O prato que eu geralmente preparo em eventos é o filhote na brasa, que já está no meu couro. É o prato que mais vendeu no Remanso do Bosque, e hoje no Sororoca (restaurante dele em São Paulo), é um dos que mais vendem. É um peixe que não precisa de muita interferência, é só comprar bem e colocar na brasa com sal, azeite e manteiga. É um prato que eu faço em evento e todo mundo pira.

Agora em casa mesmo, eu gosto de fazer sushi, por incrível que pareça, a gente tem uma comunidade japonesa muito forte em Belém, eu passei a minha infância comendo. A comida japonesa está muito presente no meu dia a dia.

(Theíza Cristhine)