Na data em que se comemora o Dia do Geólogo, 30 de maio, o CORREIO DE CARAJÁS conversou com Valfredo Gomes da Silva, 70 anos, o primeiro geólogo a descobrir indícios de ouro na região de Serra Pelada.
Com 44 anos de formação, pela Universidade Federal do Pará (UFPA), natural de Taguatins (atualmente estado do Tocantins), ele chegou à Marabá com apenas dois meses de idade. Seus pais vieram aventurar-se no garimpo de diamante e cristais e, sem seguida, nos castanhais. Ele cursou os anos iniciais na Escola José Mendonça Virgulino e depois no Santa Terezinha, o segundo grau, entretanto, foi feito fora da cidade, em Belém, pois aqui não havia escolas para esse nível de ensino.
Ainda em Belém, ele passou no vestibular de geologia. Naquela época, as empresas de mineração iam até a universidade em busca de acadêmicos, que já saíam de lá empregados. Entretanto, quando sua vez chegou, houve uma mudança de governo e devido a uma redução orçamentária, os cortes de profissionais da área foram inevitáveis.
Leia mais:Por conta disso (e já iniciando uma família), Valfredo resolveu retornar à Marabá, onde se credencia no Grupo de Terras do Araguaia e Tocantins (Getat), e passou a trabalhar com topografia. Em um de seus primeiros trabalhos, visitou algumas fazendas da região, entre Eldorado do Carajás e Curionópolis.
Nesse momento ele detecta a presença de ouro na região. “Eu mostrei lama de ouro no prato para eles, eu tinha saído da faculdade e feito estágio na Serra dos Carajás, então estava fresquinha toda a formação geológica daquela região”, relembra.
A partir dessa passagem, em outubro de 1979, os garimpos explodem naquele perímetro. E entre o final de 1979 e o início de 1980, estoura o famigerado Garimpo de Serra Pelada, que atraiu mais de 120 mil pessoas.
A princípio, ele voltou até Marabá para formar uma equipe e retornar para aquela região. Mas em conversa com o saudoso Osório Pinheiro, proprietário de uma das fazendas estudadas (A Macaxeira), o fazendeiro disse que no garimpo de diamantes também se pegava ouro, mas que o metal não tinha valor, e que eles o jogavam fora.
“Eu corri com um, corri com outro. Falava com pessoas mais pobres do que eu, de modo que eu não voltei lá. Estourou o garimpo e foi assim que foi descoberto”, relembra.
Somente no início de abril de 1980, Valfredo tem a oportunidade de retornar à Serra Pelada. Naquela época, todo o ouro da Grota Rica, pertinho da Serra Pelada, já havia sido exaurido. “Quando eu cheguei lá, eu já sabia que o ouro da Grota vinha da Serra (Pelada), e pensei ‘vou me organizar para isso”.
Porém, mais uma vez o geólogo precisou retornar a Marabá. O motivo? Uma esposa gestante e uma das maiores enchentes que a cidade já vivenciou. Quando enfim consegue retornar à região do ouro, lá já estava sob os cuidados do governo federal e ele não pôde mais entrar.
Então, um amigo de faculdade, João Bosco (integrante da Rio Doce Geologia e Mineração S.A. – Docegeo) o encontrou em Marabá e o mandou ir até Serra Pelada, pois lá queriam saber toda a história do descobrimento do lugar. Prontamente ele pegou um avião e partiu. Quando chegou, não deixou a oportunidade passar e desceu até uma das primeiras cavas do garimpo, onde foi interceptado por policiais federais, que o mantiveram em local isolado, até que seu amigo fosse ao seu encontro. Valfredo foi obrigado a deixar a Serra em menos de 24 horas.
Em mais uma tentativa, ele retornou ao garimpo e se escondeu em barracos, de onde pouco saiu. Mas nem assim passou despercebido. Mais uma vez os federais o encontraram. Essa não é a última vez que ele pisou ali. Em 1983 retornou legalmente ao garimpo, foi dono de barrancos, pegou relativa quantidade de ouro e trabalhou na Coomigasp.
“Como geólogo eles não me permitiam entrar lá, me tiraram duas vezes”. Só depois, já trabalhando na cooperativa de garimpeiros, ele descobriu o motivo. Através da sua formação na geologia, ele poderia descobrir novas ocorrências de ouro. Em 1989, deixou de vez o garimpo, visto que os recursos tanto minerais quanto financeiros que o sustentavam já estavam em processo de extinção.
Na vida pós-corrida do ouro, ele começou a trabalhar como profissional liberal, fez duas pós-graduações e abriu uma empresa de consultoria, que é seu trabalho e fonte de renda até hoje. Em 1987, foi reconhecido como Cidadão Paraense pela Assembleia Legislativa do Pará e, depois, como Cidadão Marabaense.
Otimista, Valfredo enxerga na região de Marabá potencial para novas descobertas e explorações minerais para os próximos anos. “O Pará tem vocação mineral, ele guarda no subsolo diversos tipos de minerais”, e aponta que no município ainda não foram feitas pesquisas capazes de detectar esse tesouro ainda escondido.
A história de Valfredo com o garimpo foi documentada no livro “O ouro da Amazônia oriental – o mito e a realidade” escrito por Alain Daniel Lestra e José Inácio Stoll Nardi, publicado em 1982. Um trecho da obra rara diz o seguinte: “A segunda “corrida” (do outro), maior que a primeira, ocorreu em dezembro de 1979, e janeiro de 1980, tendo por palco a mundialmente famosa Serra Pelada. Localizada entre a Serra Leste e a Serra do Sereno, dista 85 km na direção 80° da Serra Norte e 90 km na direção 220° da cidade de Marabá. O primeiro indício de ouro foi constatado na área (km 30) pelo geólogo Walfredo Gomes, quando desenvolvia trabalhos topográficos para demarcação de terras”. (Ulisses Pompeu e Luciana Araújo)