Correio de Carajás

Natureza e ócio sem celular aliviam o estresse e aumentam a produtividade

Estudos mostram que momentos de 'tédio' em ambientes verdes, longe do smartphone, reduzem a atividade de áreas do cérebro associadas ao estresse, recuperam a atenção e impulsionam a produtividade, conforme a Teoria da Restauração da Atenção

Notícias, redes sociais e e-mails disputam nossa atenção diariamente. E, em meio a tantas telas, damos pouca chance ao cérebro para desacelerar, mas a fatura disso chega – em forma de estresse e fadiga mental.

Em artigo escrito para o The Conversation, Anna Kenyon, professora sênior em Saúde Populacional da Universidade de Lancashire, do Reino Unido, afirmou que os nossos cérebros precisam de um tempo de descanso, muito necessário, da concentração.

“Ao não se concentrar conscientemente em nada e permitir que a mente divague, isso pode reduzir o estresse e melhorar a acuidade cognitiva”, ela relatou. “Muitas vezes, isso é mais fácil de dizer do que de fazer. Mas a teoria da restauração da atenção (ART) pode ajudar você a aprender a dar espaço ao seu cérebro para divagar. E, embora possa parecer um nome sofisticado para não fazer nada, ela é respaldada pela neurociência.”

Leia mais:

Essa teoria, como explicou Kenyon, foi proposta pela primeira vez pelos psicólogos Rachel e Stephen Kaplan em 1989. Eles propuseram a existência de dois tipos distintos de atenção: atenção direcionada e atenção não direcionada.

A primeira refere-se à concentração deliberada – por exemplo, estudar ou postar nas redes sociais. “Basicamente, é qualquer atividade em que a atenção do nosso cérebro esteja direcionada para uma tarefa específica”, salientou a autora.

Já a atenção não direcionada ocorre quando permitimos que os estímulos nos alcancem de forma suave e sem esforço, como ouvir pássaros cantando ou observar as folhas balançando ao vento.

Mas, quando não temos tempo para ela, acredita-se que sofremos de “fadiga de atenção”, e isso, de acordo com Kenyon, pode tornar cada vez mais difícil o foco e a concentração, enquanto as distrações tendem a chamar nossa atenção.

“No passado, nos deparamos com muitas situações em nosso cotidiano que poderíamos classificar como ‘chatas’. Momentos como esperar o ônibus ou ficar na fila do supermercado. Mas esses momentos de tédio também deram às nossas mentes uma chance de desligar”, enfatizou. “Hoje em dia, nossos smartphones nos dão a oportunidade de entretenimento constante. A possibilidade de nos expormos constantemente a estímulos intensos e envolventes oferece pouco espaço mental para que nossos cérebros sobrecarregados se recuperem.”

Restaurando a atenção

 

A teoria dos Kaplans dialoga com ideias do século XIX, quando o psicólogo William James descreveu a “atenção voluntária” (atenção que exige esforço). Suas ideias foram publicadas no contexto do movimento cultural mais amplo do Romantismo, que louvava a natureza .

“Ideias românticas sobre o poder restaurador da natureza têm sido apoiadas por pesquisas – com vários estudos mostrando ligações entre tempo na natureza e níveis mais baixos de estresse, melhor atenção, melhorias na saúde mental, humor e melhor função cognitiva”, elencou a professora da Universidade de Lancashire.

E ela acrescentou que os benefícios restauradores da natureza também são respaldados pela neurociência, com neuroimagens mostrando que a atividade na amígdala – a parte do cérebro associada ao estresse e à ansiedade – foi reduzida quando as pessoas foram expostas a ambientes naturais.

Em seu artigo, Kenyon citou que uma revisão sistemática de 42 estudos encontrou uma associação entre a exposição a ambientes naturais e melhorias em diversos aspectos do desempenho cognitivo, incluindo a atenção, e que um ensaio clínico randomizado e controlado utilizando neuroimagem cerebral encontrou sinais de níveis mais baixos de estresse em adultos que caminharam 40 minutos em um ambiente natural, em comparação com participantes que caminharam em um ambiente urbano. Os autores concluíram que a caminhada na natureza facilitou a restauração da atenção.

“Pesquisas demonstraram até que apenas dez minutos de atenção não direcionada podem resultar em um aumento mensurável no desempenho em testes cognitivos, bem como na redução da fadiga atencional. Até mesmo caminhar na esteira enquanto observa uma paisagem natural pode produzir esse efeito cognitivo”, relatou Kenyon.

Para aplicar isso na prática, a especialista ainda deu algumas recomendações:

  • Encontre qualquer tipo de espaço verde onde você possa sentar ou uma trilha na floresta para caminhar,
  • Guarde o telefone e quaisquer outras distrações, e
  • Quando passar por momentos chatos durante o dia, em vez de pegar o telefone, tente ver a pausa como uma oportunidade de deixar a mente vagar um pouco

 

“Cada um de nós pode achar que certos ambientes são naturalmente mais favoráveis ao nos permitir desligar. Então, se ao tentar colocar a teoria da restauração da atenção em prática você perceber que seu cérebro está puxando você de volta para tarefas estruturadas (como planejar mentalmente sua semana), isso pode ser um sinal de que você deve ir para algum lugar onde seja mais fácil para sua mente divagar”, sinalizou a autora. “Quer você esteja observando uma joaninha rastejando sobre sua mesa ou visitando uma vasta extensão de natureza, permita que sua atenção fique livre. Não é preguiça, é manutenção neurológica.”

(Fonte:G1)