2) O “chefe dos chefes” foi o primeiro a contrabandear cocaína aos EUA?
A ascensão de Miguel Ángel Félix Gallado marcou um “antes e depois” na história do narcotráfico no México.
Como mostra a série do Netflix, o chamado “chefe dos chefes” foi quem impulsionou a primeira organização de produção e tráfico em larga escala de maconha do México para os Estados Unidos.
Mas ele não foi o primeiro mafioso a levar cocaína aos Estados Unidos, como aparece na série. Quem fez isso foi o mentor de Gallado e ex-líder do cartel de Sinaloa, Pedro Avilés, conforme o livro de Anabel Hernández.
O chamado “Leão da Serra”, assassinado em 1978, foi o pioneiro do tráfico de cocaína, garantindo o transporte da droga da América do Sul aos Estados Unidos.
Uma vez criado o “sindicato” de quadrilhas de maconha de Guadalajara, Félix Gallardo quis expandi-lo para incluir cocaína. Fez isso contatando Pablo Escobar, o líder do cartal de Medelín, na Colômbia.
No final da década de 1980, a aliança de Gallardo com Escobar controlava 60% da cocaína consumida nos Estados Unidos via México, segundo a Agência Antidrogas dos Estados Unidos.
Ainda que não tenha sido o primeiro a levar cocaína aos americanos, o “chefe dos chefes” foi o grande propulsor desse segmento do narcotráfico.
Um homem importante nesse processo foi Amado Carrillo Fuentes, apelidado de “senhor dos céus” pela frota de aeronaves Saberliner, Learjet e Cessna que possuía.
Carillo Fuentes seria, depois da morte de Escobar, o seu “sucessor” no controle do mercado, juntamente com “El Chapo” Guzmán, Beltrán Leyva e Héctor Palma, explica Hernández.
3. Caro Quintero mudou tudo
Narcos México retrata o narcotraficante Rafael Caro Quintero como uma pessoa cordial, sendo que ele era um dos integrantes mais violentos do cartel de Guadalajara.
A personalidade explosiva de Quintero o levou a cometer um dos maiores erros da organização criminosa: o sequestro do agente norte-americano Enrique “Kiki” Camarena, da Drug Enforcement Administration, a agência dos EUA de combate ao tráfico de drogas.
Nascido no mesmo município que El Chapo Guzmán, Caio Quintero se encarregava da parte de plantio e colheita de maconha até galgar de pouco em pouco, posições dentro da organização. Na década de 1980, ele se havia se tornado um dos mais poderosos narcotraficantes do mundo.
“Caro Quintero pertence à geração que fundou as bases do tráfico de cocaína”, diz o jornalista José Reveles.
Como chefe do cartel de Guadalajara, ele era conhecido por sua vida extravagante e seus casos amorosos.
Apaixonou-se, por exemplo, por Sara Cosío, sobrinha de Guillermo Cosío, então governador do estado mexicano de Jalisco. Com ela, Quintero foi preso na Costa Rica, após executar o plano de assassinar o agente Kiki Camarena.
“O traficante Don Neto confessou que ele e Caro Quintero tinham tomado a decisão de sequestrar Camarena”, explica Hernández.
O episódio levou os Estados Unidos a lançar sua maior intervenção no combate ao narcotráfico mexicano, o que levaria à desintegração do cartel de Guadalajara.
Após passar três décadas na prisão, Quintero foi solto em 2013, beneficiado por uma controversa decisão judicial. O habeas corpus foi revogado em seguida, mas o narcotraficante já havia sido liberado.
Atualmente ele é um dos criminosos mais procurados do México. Tanto o governo mexicano quanto o americano oferecem recompensas milionárias em troca de pistas sobre a localização dele.
“Estamos comprometidos a levar esse criminoso perigoso à Justiça. Ele é o líder do cartel responsável pelo brutal assassinato de um agente da DEA”, disse neste ano o diretor adjunto do FBI, David L. Bowdich.
4. A história do rancho El Búfalo
Um dos maiores golpes sofridos pelo cartel de Guadalajara foi o histórico desmonte do rancho El Búfalo, que abrigava mais de 13 mil toneladas de maconha.
A plantação não estava no estado de Zacatecas, como diz a série do Netflix, mas sim no estado de Chihuahua, no norte do México, uma região árida que exige recursos volumosos para viabilizar produções rurais.
“Caro Quintero idealizou uma maneira de industrializar o cultivo de maconha”, explica Anabel Hernandez.
Mais de 10 mil empregados trabalhavam na plantação de maconha. “Era uma autêntica fábrica de drogas”, aponta Hernández.
Mas a Procuradoria da Justiça Federal, em colaboração com a agência antidrogas dos EUA, lançaram uma operação que levou ao desmantelamento da produção, o que teria provocado um prejuízo de US$ 8 milhões ao cartel.
Em resposta, Caro Quintero determinou o sequestro de Kiki Camarena, por ter feito parte da operação de inteligência que derrubou o rancho El Búfalo.
5. Meio milhão de mortos em 30 anos
Na abertura da série, são apresentados dados sobre a violência do tráfico de drogas: “Nos últimos 30 anos no México, foram assassinadas, em média, meio milhão de pessoas”.
O México sofre com altas taxas de violência como resultado das atividades do crime organizado, uma situação que se agravou desde que o governo federal iniciou a chamada “guerra contra o narcotráfico”, em 2007.
De janeiro de 1997 a outubro de 2008, morreram 358.077 pessoas vítimas de homicídio doloso- uma média de 13 mil assassinatos por ano.
Essas estatísticas podem incluir tanto homicídios relacionados às atividades do narcotráfico como assassinatos por outras razões. Mas existe uma “caixa preta” de assassinatos sobre os quais ninguem têm informações e que acabam não sendo computados.
Um cálculo dos nove anos anteriores a essa série histórica, para incluir as três décadas que abarca a série Narcos México, de 1988 a 2018, somaria 117 mil homicídios à cifra de 358.077.
Ou seja, de 1988 a 2018, cerca de 475 mil pessoas morreram assassinadas no México- número que se aproxima do que aparece na abertura da série do Netflix. (Fonte:BBC)