Correio de Carajás

MPF defende suspensão das licenças de Salobo, da Vale

O Ministério Público Federal expediu parecer favorável na terça-feira (28) para que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região determine a realização de Estudo de Componente Indígena (ECI), com a consulta prévia, livre e informada, e suspenda as licenças concedidas para o funcionamento do Projeto Salobo, da Vale S. A.

O empreendimento está localizado em Marabá, inserido na Floresta Nacional Tapirapé-Aquiri, à margem direita do Igarapé Salobo, afluente do Rio Itacaiunas, e envolve a operação integrada de lavra a céu aberto, beneficiamento, transportando e embarcando cobre, ouro, prata e molibdênio. A Salobo Metais é uma joint venture formada pela Vale e pela Mineração Morro Velho, com participação do BNDES.

A manifestação se deu em Agravo de Instrumento que tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, interposto por quatro associações indígenas Xikrin, representadas pelo advogado José Diogo De Oliveira Lima, em face de decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Marabá que indeferiu parcialmente pedidos de tutela provisória de urgência.

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Os Xikrin vivem cercados por mais de 10 projetos minerários da Vale e, além de Salobo (Marabá), travam batalhas judiciais contra Onça Puma (Ourilândia do Norte) e S11D (Canaã dos Carajás). Neste mês, moveram nova ação cobrando responsabilidade por danos socioambientais ocasionadas pelo empreendimento Igarapé Bahia, de onde a Vale extraiu ouro entre os anos de 1990 e 2002. No mesmo local a mineradora pretende, agora, extrair cobre por meio do Projeto Alemão.

Já a demanda na qual o MPF se manifestou nesta semana foi originariamente ajuizada em face da Salobo Metais S/A, da Vale S/A, da União Federal, Funai, Ibama, ICMBio, Iphan, Agência Nacional de Mineração (ANM) e do BNDES, requerendo o reconhecimento de responsabilidade civil por danos socioambientais, em razão da não realização de consulta prévia, livre e informada à comunidade Xikrin a respeito dos efeitos do empreendimento de mineração, além do estudo de componente indígena.

A ação apontou também o não cumprimento de condicionantes ambientais exigidas pelo Ibama desde a licença prévia até a de operação. Os indígenas alegam, ainda, que o empreendimento Salobo causou a poluição dos recursos hídricos da região – Rio Itacaiúnas, Igarapé Salobo, Igarapé Mirim e Rio Cinzento -, além de ter sido instalado sobre antigas aldeias indígenas e cemitérios Xikrin. Afirma, por fim, que foi promovido o corte de centenas de castanheiras utilizadas pelos indígenas como forma de subsistência física e cultural.

Ao apreciar o pedido de antecipação da tutela recursal, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região o acolheu parcialmente, determinando que a Vale e a Salobo custeiem despesas necessárias à atuação de equipe multidisciplinar que deverá realizar o Estudo de Componente Indígena. A empresa, entretanto, interpôs gravo interno e o processo foi encaminhado para posicionamento da Procuradoria Regional da República.

O procurador Ronaldo Pinheiro de Queiroz destacou que a Licença Prévia e as renovações concedidas pelo Ibama tinham como condicionante a apresentação de planos e propostas para a preservação da integridade física e cultural da comunidade Xikrin do Cateté. A Licença de Instalação, de 2006, também apresentava essa obrigatoriedade.

Na renovação, foi determinado que deveriam seguir as tratativas entre Ibama, Funai, Smsa e Vale S.A no sentido de garantir a preservação da integridade física e cultural das comunidade Xikrin. “Como é possível observar, as repetidas inclusões de condicionantes relativas às comunidades Xikrin revelam que o empreendimento em questão tem potencial de ocasionar impacto socioambiental sobre os indígenas. Nesse sentido, merece acolhimento a pretensão de elaboração de Estudo de Componente Indígena, para conhecer e mitigar eventuais danos que possam ser causados à comunidade indígena afetada”, destaca o desembargador.

Em relação ao pedido de suspensão das licenças concedidas à empresa, o desembargador defende que não houve elaboração de Estudo de Componente Indígena para apurar os impactos à vida e costumes da comunidade afetada, assim como não houve consulta prévia, livre e informada dos Xikrin acerca do empreendimento, em descompasso com a legislação vigente. Acrescenta que, como amplamente noticiado, as condicionantes impostas pelo Ibama não foram cumpridas na íntegra.

“Conquanto tenha constado em diversas ocasiões a necessidade de assegurar a integridade física e cultural das comunidades Xikrin, não houve, por parte dos agravados, da adoção de medidas suficientes nesse sentido. Os programas adotados pela Vale/Salobo como forma de atender as condicionantes são insuficientes para tutelar os valores indígenas em risco, porquanto não asseguram a efetiva recomposição pelos danos que estão sendo causados. Desse modo, resta evidente a necessidade de imediata suspensão do licenciamento ambiental e das obras que vem sendo executadas no empreendimento em questão até que realizado estudo sobre as comunidades afetadas e todos os espaços territorialmente protegidos”, defende.

POSICIONAMENTO


O Correio de Carajás procurou, nesta quinta-feira (30), a mineradora Vale. Em nota, a empresa e a subsidiária, a Salobo Metais, informam que cumprem a legislação e que o empreendimento está devidamente licenciado, sendo periodicamente fiscalizado pelos órgãos competentes, cuja licença de operação foi renovada em 2018. A empresa informa também que vem cumprido todas as condicionantes relacionadas ao Povo Xikrin do Cateté e reportando anualmente ao órgão ambiental.

Ainda no posicionamento, a empresa ressalta que, considerando a localização e a distância para a Terra Indígena Xikrin do Cateté, que é de mais de 22 quilômetros, o componente indígena não foi necessário em nenhuma fase do licenciamento da unidade industrial por decisão do órgão ambiental competente e pela legislação de regência.

Por fim, a Vale ressalta que mantém diálogo aberto e contínuo com essa população e reforça seu respeito ao Povo Xikrin do Cateté. (Luciana Marschall)

Confira o parecer na íntegra