Jéssica Alves dos Santos movimentou as redes sociais esta semana com uma postagem bem excêntrica oferecendo o seu serviço como mototaxista em Marabá. Na listagem dos motivos para um passageiro dar preferência ao transporte dela elencou: levar ao cabaré, motel, casa da ex, entregas de flores para a amante, seguir carro de marido e até mesmo separar briga, em casos de descoberta de traição. De outro lado, por trás do marketing em forma de meme, há uma rotina profissional repleta de histórias para lá de inusitadas, mas também de desafios, em um meio profissional ainda tão masculinizado.
E foi para falar sobre isso que a mototaxista esteve na redação do CORREIO na última quinta-feira, 15, atendendo a um convite do portal. Nascida e criada em Marabá, Jéssica exerce a profissão há cinco anos. Uma agulha no palheiro, considerando que dos 700 profissionais que rodam a cidade, apenas ela e mais três são mulheres. Tal conjuntura faz com que a maioria de seu público seja feminino: “Elas chegam até mim e falam que se sentem mais confortáveis e seguras andando comigo”, relata.
Seguindo a linha de que toda brincadeira tem um fundo de verdade, ela conta que a inspiração da publicação viral foram as próprias vivências. Desde que começou a transportar pessoas pelas ruas da cidade, sem saber, acabou se envolvendo em acontecimentos que caberiam em um podcast de eventos cômicos e surpreendentes. As narrativas vão de seguir maridos infiéis e flagrar traições a entregas de flores de amantes.
Leia mais:“Certa vez uma passageira subiu na moto, não me falou o destino e pediu para que eu seguisse outro veículo. Logo adiante ela pediu para eu parar e assim que desceu, começou uma discussão com o condutor do carro, que por acaso era seu marido, e que levava a amante no banco do passageiro”, relata, acrescentando ser algo que nunca se espera, mas pelos ossos do ofício, acaba sendo testemunha dos dramas.
E as situações não param por aí. Até mesmo entregas de flores para homens comprometidos fazem parte do arsenal de Jéssica. A mototaxista relembra da ocasião em que recebeu a incumbência de entregar um buquê em determinado local, para uma pessoa específica. No entanto, o destinatário era nada mais nada menos que um homem casado que, para completar a novela, estava acompanhado da esposa.
“Foi uma confusão. A mulher veio tirar satisfação comigo como se eu fosse culpada. Expliquei que apenas entregava as encomendas e que, por mais que ela quisesse saber quem havia enviado, não poderia dizer por respeito a remetente e à minha própria profissão”, conta, brincando que, vendo por este lado, é possível considerar um emprego de alto risco.
Quando criança, Jéssica não imaginava que um ofício que escolheu exercer por admiração ao pai, Audivan de Souza, ex-mototaxista, fosse lhe proporcionar tantas circunstâncias hilárias. Mas, mais do que isso, a oportunidade de levar a profissão de forma tão divertida. Dentre os pontos positivos, ela cita a possibilidade de conhecer cada canto da cidade, poder escolher os horários de serviço, de férias e das folgas e, também, os bons amigos que fez dentro da comunidade de mototáxis.
Contudo, nem sempre são só flores. A mototaxista declara que já passou por várias situações de assédio por parte de passageiros: “Já precisei parar a moto e pedir para que a pessoa descesse”, diz, relatando que a inconveniência ocorreu por parte não só de homens, mas de outras mulheres também.
Além disso, Jéssica enfrenta constantemente o preconceito de estar em um meio dominado pelo sexo masculino. Segundo ela, no geral, as pessoas possuem uma preferência maior em serem transportadas por homens. E não se trata de uma impressão. Por vezes, esse sexismo foi verbalizado e até justificado com “ela vai me derrubar”. Algo que só pode ser explicado pela discriminação.
“Todos os motoristas passam pelo mesmo treinamento para estar ali. Temos a capacitação igual de transportar um passageiro. Há todo um processo até estar apto a dirigir como mototaxista e ter a responsabilidade de carregar outra vida em cima da moto”, rebate Jéssica, se garantindo como uma profissional competente.
A marabaense ainda aproveitou para bater na tecla do enorme risco de se andar com mototáxis clandestinos. Sem direito de respaldo em qualquer circunstância, devido à falta de coletes, capacete e moto com numeração e registrados pelo Departamento Municipal de Trânsito e Transporte Urbano (DMTU), esse tipo de serviço irregular confecciona um crime perante a lei. Ao encerrar, Jéssica desfrutou do assunto e da conjuntura para fazer mais um marketing: “Ande correto, ande comigo”. (Thays Araujo)