Correio de Carajás

Maternar: verbo intransitivo para Vanessa Zuchetto

Mulher de 40 anos de idade busca na tecnologia a fertilização de um sonho dela e do marido para terem o primeiro filho

Vanessa fez de sua experiência pessoal, uma inspiração para ajudar profissionalmente outras “tentantes” para engravidar

O “maternar” foge dos limites de uma definição, pode ser compreendido de diferentes formas. Muitas das vezes, engloba trajetos sinuosos, repleto de altos e baixos que fogem do controle de quem deseja aumentar a família. Aos 40 anos, Vanessa Zuchetto Soares é o exemplo de que ser mãe está para além de gerar. Muito mais complexo que isso é o processo que a psicóloga clínica especializada em psicologia pré-natal vive na pele há quatro anos.

Casada há 13, o desejo de ser mãe nasceu em seu coração em 2019, quando tinha 36. A vontade é considerada pela medicina como tardia. Ela, que nunca imaginou ser mãe tentou, por um ano, engravidar de forma natural. Quando não conseguiu efetivamente, acabou recorrendo a especialistas em reprodução humana.

Vanessa encara o desejo e o processo que vive há alguns anos já como um “maternar”. Ela acredita fielmente que será mãe, independentemente da forma como isso irá acontecer. Gerar deixou de ser uma prioridade, para se tornar apenas uma maneira de alcançar seu sonho.

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“Existem várias formas de se tornar mãe, é preciso deixar isso claro”, frisa. A psicóloga levanta que esse desejo, nutrido por várias mulheres, precisa ser livre, para ser sentido e acolhido de forma natural e saudável, já que se trata de uma escolha pessoal que diz respeito aos envolvidos que, no caso, são ela e o marido.

Antes de tomar a decisão, Vanessa nunca havia engravidado. Ela conta que sempre fez uso de métodos contraceptivos e que se surpreendeu ao descobrir que não conseguiria gerar um filho prontamente, algo que contradiz o medo que sentia anteriores de engravidar sem que houvesse, de fato, planejado.

Ela e o marido investiram em três fertilizações in vitro (FIV), que não deram certo. E, entre as tentativas, a psicóloga engravidou duas vezes de forma natural, mas, infelizmente, as gestações resultaram em abortos espontâneos. O luto fetal abalou consideravelmente o emocional de Vanessa.

 

FIV

O tratamento consiste em realizar a fecundação do óvulo com o espermatozoide em ambiente laboratorial, formando embriões que serão cultivados, selecionados e transferidos para o útero. Trata-se de uma das técnicas de reprodução assistida mais utilizadas na atualidade, indicada principalmente para mulheres que apresentam alterações ginecológicas que interferem na ovulação ou no deslocamento dos óvulos pelas trompas.

Vale ressaltar que problemas relacionados à produção do esperma também podem levar à dificuldade para engravidar.

As chances de a fertilização in vitro dar certo estão diretamente relacionadas com a idade da mulher, número de óvulos coletados, reserva ovariana e causas que levaram à infertilidade. No entanto, apesar da receptividade do endométrio da mulher e da qualidade do embrião produzido serem fatores importantes, a idade da paciente é determinante para o sucesso do processo de fertilização.

Por esse motivo, o procedimento é indicado também para os casos de idade avançada.

Todavia, cerca de 15% a 25% de todas as gestações clinicamente reconhecidas resultam na perda do feto. Alguns abortos espontâneos ocorrem antes que a mulher perceba, o que explica a grande variação na incidência.

Dentro dessas perdas, 80% ocorrem no primeiro trimestre e são geralmente causadas por cromossomos ausentes ou extras, o que é chamado de aneuploidia – erros na divisão cromossômica. Com isso, a divisão errada transforma aquele cromossomo em um “cromossomo anormal”, incompatíveis com a vida e resultam no aborto espontâneo.

Além disso, cerca de 5% das mulheres sofrerão até duas perdas gestacionais consecutivas e 1% três ou mais perdas gestacionais consecutivas. No caso da perda de gravidez recorrente, as mulheres devem discutir o assunto com seu obstetra ou ginecologista e agendar uma avaliação clínica.

A causa da perda da gravidez está além do controle da mulher. Ela pode estar relacionada à genética, anormalidades no útero, autoimunidade, infecções e distúrbios metabólicos.

DO PESSOAL AO PROFISSIONAL

Como profissional da saúde mental, Vanessa explica que o luto fetal é algo que atinge grande parte das mulheres que possui o desejo de ser mãe, considerando a porcentagem com que acontece. Mas, por se tratar de um assunto sensível e pelo estigma de que a mulher precisa sofrer sozinha com a circunstância, pouco se fala sobre.

“Elas levam isso como um fracasso, como algo que não deve ser compartilhado, se culpabilizando por um episódio que foge de qualquer controle”, afirma, advertindo que isso precisa ser evitado, uma vez que potencializa as doenças mentais e perpetua na sociedade uma visão distorcida de como as coisas devem realmente ser tratadas.

Como psicóloga, Vanessa recebe muitas pacientes que, diante da perda, se questionam sobre o que fizeram de errado. Isso gera gatilhos e desperta questões psíquicas, que surgiram também na psicóloga, levando a refletir sobre a quantidade de semelhantes que não possuem uma rede de apoio profissional e acabam engolidas pelo sentimento errôneo e persistente de fracasso.

Diante da própria experiência, ela buscou se especializar em psicologia pré-natal, para atuar diretamente com esse grupo de mulheres.

PRÓXIMA ETAPA

Longe de se dar por vencida, Vanessa, agora, tentará um novo método para gerar seu tão sonhado filho: a ovodoação. O processo acontece quando uma mulher cede seus óvulos para que outra pessoa os utilizem. Ou seja, consiste na doação do gameta feminino para que outra mulher tenha possibilidade de gestar utilizando este gameta.

Para que isto seja possível, a fertilização do óvulo da doadora acontece em laboratório, usando o espermatozoide do parceiro da receptora. Dessa maneira, forma-se o embrião que será gestado no útero da paciente receptora.

FÉ TAMBÉM VALE

“Não serei mais ou menos feliz se eu gerar uma criança, só estou tentando de todas as formas possíveis realizar um sonho”, diz, reconhecendo o quanto é abençoada e privilegiada por ter condições financeiras para custear todas essas técnicas de reprodução assistida. Ela não se sente vítima, entende que cada um tem seus processos.

Em uma perspectiva religiosa, Vanessa entende que sua resiliência já a amadureceu frente às dificuldades que passa para ter um filho e chamar de seu. A psicóloga afirma que será perfeito da forma que for. Demonstrando plenitude, ela reforça que é preciso que mulheres que se encontram na mesma situação, procurem ajuda profissional para saber trabalhar os sentimentos, evitando encarar como derrota ou castigo.

A tentante frisa: “Para tudo há uma saída”.

 

(Thays Araujo)